14 - Perigo a Solta

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As horas passaram voando e Lara só percebeu isso quando viu o céu escurecendo aos poucos, anunciando que daria lugar a uma noite estrelada e com a lua gigante e bela de se admirar.
--- Nossa! - Lara olhou o relógio em seu pulso. Morando em João Pessoa, nunca saia com celular - já são 17hrs!
Leonardo olhou para o céu sem esboçar reação de susto.
--- Aqui escurece cedo, ein? - disse ele.
Ela olhou para o céu e sorriu encantada.
Ele admirou-a nesse momento. Havia um brilho nela. A tornava especial, mesmo que ele não saiba mais o porquê.
--- Então - olhou de volta para ele, sentindo-se tímida por ele já estar olhando para ela - vamos? - ele continuou a olhá-la - huum você vai ficar por aqui?
--- Não... - ele respondeu.
Eles se levantaram e seguiram para casa. Foram pela avenida, pelas ruas sempre é mais perigoso.
--- Você gosta da sua igreja? - essa foi a primeira pergunta pessoal que ele fez.
Enquanto conversam na praça apenas perguntou sobre a cidade, clima, criminalidade, pontos turísticos... essas coisas.
Mas sua pergunta atual lhe pareceu um tanto arriscada. Sua resposta implicaria em várias coisas e poderia ser usada contra ela.
--- Sim. Muito. Me deixa muito a vontade e confortável. Por quê?
--- Só pra saber - ele respondeu.
Colocou as mãos no bolso para esquentá-las e ela abraçou o próprio corpo. O vento estava muito frio. Ele percebeu a atitude dela. Estranhamente sentiu algo dentro dele que queria abracar a garota, aninha-la em seu peito e fazer passar o seu frio. Balançou a cabeça e afastou esses tipos de pensamentos idiotas.
A avenida estava muito movimentada, mas o bairro continuava esquisito e Lara sempre estava cismada com qualquer movimento estranho.
--- Você está tensa. - observou Leonardo.
--- Não tem como não ficar, andando por aqui -riu.
Um breve silêncio se fez.
--- Posso te perguntar uma coisa? - Lara disse um tanto tímida.
Sua garganta travou e incrivelmente, estava seca. Suas mãos pareceram mais frias ainda.
--- Acabou de perguntar - ela olhou para ele confusa e ele deu um leve sorriso - fala aí.
--- Nós já nos vimos antes. Há dois anos. Numa loja de calçados. - falou tudo de uma vez e deu uma pausa - huum, você lembra de mim?
Ele pensou um pouco. Não olhou para ela. Enquanto andavam, apenas olhava para o caminho a sua frente.
--- Sinto muito. Mas nunca vi você na vida antes.
Aquelas palavras tiveram um grande peso sobre ela.
--- Mas, como pode se lembrar disso? Ao que parece, tem muito tempo já.
--- Ficou marcado na minha mente... - disse cabisbaixa.
--- Foi especial pra você? - olhou para ela para ver sua reação.
Eles pararam um pouco. Estavam numa esquina. Um cara numa moto deu alerta para entrar na rua que eles estavam prestes a passar reto.
O cara da moto estava se aproximando muito deles. Reduziu a velocidade e parou na frente. Sacou uma arma e com o capacete abafando sua voz, disse:
--- Passa. Passa. Passa.
Um pânico tomou conta de Lara. Ela paralisou. Não soube o que fazer.
Leonardo olhou pra ela. Sua única vontade era protegê-la.
Ele levantou as mãos e disse com calma:
--- Não temos celulares.
O cara ficou nervoso. A mão com a arma parecia trêmula. Em outra situação, Leonardo reagiria ao assalto. Mas sua preocupação era a garota nervosa ao seu lado.
--- Passa o relógio, boysinha! - gritou para Lara.
Ela olhou para o relógio em seu pulso. Gostava tanto dele. Não tinha valor em dinheiro, apenas valor sentimental.
--- Bora, bora!
Ela desabotoou a pulseira do relógio, e sentindo uma tristeza, estirou o braço, dando ao assaltante.
--- Passa o cordão, boy! - ele gritou e quando Leonardo insinuou que não daria, ele ameaçou sair da moto. Mas Leonardo viu o perigo que seria e arrancou o cordão do pescoço e jogou pra ele.
O cara colocou a arma na cintura, baixou a viseira do capacete e seguiu em alta velocidade rua a baixo.
--- Ai meu Deus! - Lara enterrou o rosto nas mãos.
Deus - Leonardo pensou - Ele não impediu que isso nos acontecesse. Valeu aí, Cara. - pensou em sarcasmo.
--- Obrigada pelo livramento, meu Deus! - disse com o rosto ainda entre as mãos - algo pior poderia ter nos acontecido, mas o Senhor não deixou!
Leonardo ficou rígido.
Eles passaram pela mesma situação, mas o ponto de vista em relação a Deus foi totalmente diferente. Quase sentiu vontade de pedir perdão a Ele, mas não o fez. Ao invés disso, o seu instinto fez com que ele abraçasse a garota.
Mesmo não tendo impedido que o assaltante a roubasse, quis ao menos acalmá-la.
Suas alturas permitiam que a cabeça dela repousasse no peito dele, enquanto ele passava a mão nos fios de cabelo dela. Aos poucos, os soluços nervosos passaram.
--- Você tá bem? - tentou olhar para ela, fazendo seu queixo quase entrar no peito.
Ela o ohou nos olhos. Ah, aqueles olhos azuis estavam com uma expressão tão diferente. Que ela jamais vira.
Percebeu que o abraço estava íntimo demais e se soltou dele com delicadeza.
--- Eu estou sim. Muito obrigada. - sorriu docemente.
--- O seu relógio era caro? - quis saber com certa preocupação.
--- Não... mas foi minha avó que me deu, antes de morrer. Tinha muito valor sentimental.
Leonardo sentiu como uma facada no peito. Botou a mão no peito e sua expressão de dor foi involuntária.
--- Tá tudo bem? - ela deu um passo a frente com as mãos prontas para tocá-lo.
Ele deu um passo para trás, ficando em cima do meio fio. As mãos dela pararam no ar e ela baixou lentamente.
--- Tô bem sim - ele respondeu - vamos? - deu meia volta, para atravessar a rua.
Ouviu um grito de "cuidado!" E sentiu seu corpo sendo puxado para trás.
Lara foi para a sua frente, e por trás dela, na rua e bem junto ao meio fio, viu um caminhão passando.
--- Você quase foi atropelado!
O coração dele estava acelarado e ela estava visivelmente nervosa.
Ele fechou os olhos, e num sussurro disse:
--- Obrigado...
Ela sorriu, mesmo que ele não pudesse ver seu sorriso.
--- Agora vamos. - puxou ele pelo braço.
Enfim atravessaram aquela rua.
Não conseguiram conversar. Ainda estavam processando aquilo tudo.
Chegaram em frente a casa de Megan, mas ele insistiu em deixá-la em casa.
Ela insistiu que ele entrasse, tomasse um copo d'água ou suco, para se acalmar.
Ele resistiu, mas, sabendo quem encontraria na casa de Megan, aceitou o convite.
--- Pai, mãe? - ela disse nervosa, entrando na sala.
Os pais estavam de costas, sentados no sofá. Olharam para ela assim que ouviram sua voz.
--- Lara! - sua mãe foi até ela e a analisou, segurando em suas mãos - você está pálida! - colocou as costas da mão sobre a face dela.
A atenção do pai estava sobre o rapaz, ali. Parado. Esperando alguma coisa.
--- Fomos assaltados! - ela anunciou.
--- Como? - seu pai se assustou e em segundos já estava a frente deles.
Só então dona Flor percebeu a presença de Leonardo.

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