Diverso

Capítulo Quatro - Que seja eterno enquanto durar

      Andamos pelos corredores da escola nos sentindo os novos populares da escola. Quer dizer, eu sou só a sombra, a verdadeira estrela é Antony. Depois de sua vitória sobre McGuire, o antigo capitão do time dos Hell's Bulls, Tony provou ser um um novo talento promissor descoberto na escola e agora todos os olhares e fofocas do lugar parecem girar em torno dele. Surpreendentemente, as garotas começaram a olhar meu amigo Tony de outra forma, não mais como um patinho feio e desengonçado, mas como um pretendente e o mais novo capitão do time de basquete que irá para a final do campeonato municipal.

Paramos no corredor em frente ao armário de Tony quando uma garota de cabelos longos e escuros passa por nós e lança um sorrisinho sedutor em sua direção.

— Você viu aquilo? Mais que gata. Acho que tô sonhando e não quero acordar nunca mais.

— Argh. — reviro os olhos

— Não fique com ciúmes Smurffete, ainda sou todo seu. — ele diz e abre a porta do armário. Uma enxurrada de Cartas coloridas caem de lá de dentro e se esparramam pelo chão. Boquiaberta observo ele se abaixar e catar cada uma delas .

— caramba, elas não perdem tempo. Parece que você conseguiu muitas fãs depois do jogo contra os Scottsons. — ele pega um papel vermelho em formato de coração — fãs muito carinhosas — acrescento, franzindo a testa e cruzando os braços.

— nunca pensei que pudesse conseguir chegar até aqui. Devo a você por aquele dia no ginásio. Apesar de achar você uma traíra na hora.

— ah, o que seria de você sem mim?

— boa tentativa, sua pseudo-trairagem foi importante, mas o mérito ainda é todo meu. Aliás preciso te contar uma coisa.

— O que? — pergunto receosa

— Vou sair com uma garota. — ele conta, animado.

As palavras se prendem na minha boca. E sinto que fico sem ar pelo choque.  Tento disfarçar, no entanto, ele percebe.

— Calma. Não precisa ficar assim, ainda sou seu amigo.

— Mas é claro que é! Quer dizer... parabéns — me forço a falar — é que as coisas mudaram tanto ultimamente, tenho medo que você se esqueça de mim.

— Não vou esquecer você! Você é minha melhor amiga. Tudo é novo pra mim também, mas tento acompanhar e seguir em frente. Olha posso organizar um encontro pra você também com algum dos caras do time se você quiser.

— Você gosta dela?

— Não nos conhecemos muito, mas ela é legal. E gostosa.

Inspiro com rispidez e prendo a respiração. O bichinho do ciúme sussurra em meus ouvidos a palavra  'vadia'. O sinal toca e me apresso em dizer:

— tô indo pra aula. Até mais.

Caminho frustrada e não olho para trás.

     ****

Os dias se passam com rapidez e nesse intervalo, Tony passa a se ausentar cada vez mais, desde quando saiu com a garota gostosa. Lindsey é o seu nome. Um ano mais velha que nós, ela tem cabelo loiro caramelo e seios grandes e um bumbum avantajado. Encontro Tony algumas vezes na semana pelos corredores da escola  ou quando estamos nas mesmas aulas. Mas ele não fala muito comigo, porque anda muito distraído no celular ou conversando com alguém do seu time. O chamei para sair algumas vezes e tomar sorvete ou comer pizza, mas ele sempre se diz estar ocupado por causa dos treinos da partida final ou já ter algum compromisso marcado com Lindsey. Aliás, nem sempre é Lindsey que vejo andando com ele ou o abraçando na escola.

Pedalando na velha bicicleta vermelha volto voando para casa antes da chuva cair.

— Oi minha, querida. — saúda minha mãe quando chego em casa — está com fome? A mãe do Tony trouxe seus biscoitos preferidos.— pego a lata em cima da mesa e abro, porem vejo apenas dois biscoitos com gotinhas de chocolate e estranho o fato de que tia Rose costumava ser mais generosa e mandar muito mais.— seus irmãos comeram alguns antes de você chegar.

— Alguns?— pergunto irônica.

— Não seja tão gulosa. Você está mesmo precisando emagrecer.

Uma triste lembrança me acomete quando lembro das tardes em que ia brincar na casa de Antony e tia Rose fazia uma fornalha dos deliciosos biscoitos caseiros dela. Comíamos sempre todos, por isso acabei ganhado alguns quilinhos nos últimos tempos.

— Ela perguntou por você quando veio aqui. Disse que nunca mais você apareceu por lá.

— É porque o Tony sumiu de vista.— respondo, amarga.

— como assim? Vocês viviam grudados um no outro, o que aconteceu?

— ele agora é popular na escola, mãe. Foi isso que aconteceu. Ele não tem mais tempo pra ficar com a impopular e antissocial da Elize. Tá ocupado demais com a Lindsey. — cuspo o nome.

Lá fora um trovão estrondoso ressoa liberando toda a sua fúria e imponência. Sinto um calafrio percorrer a espinha e reprimo o mau pressentimento.

— sinto muito. Nós achamos que conhecemos as pessoas quando convivemos com elas há anos, mas na verdade nunca as conheceremos de verdade.— ela pega o último biscoito da lata e se senta.— mas é só uma fase. Vai passar. Ele só tá vivendo o sonho dele, aproveitando a novidade. Quando ele sentir a sua falta, ele vai voltar.

— Mas e se ele nunca sentir a minha falta? — questiono melancólica—   Eu não tenho mais ninguém.

— Alguém vai aparecer, mais cedo ou mais tarde.— ela acrescenta com uma dentada no biscoito.

Ando em direção a geladeira para pegar o suco e me pego sentindo falta de algo. Há um espaço vazio do lado da geladeira outrora ocupado por um freezer.

— Cadê o freezer?

— eu vendi. Não precisávamos mais dele. — minha mãe comenta meio constrangida, meio desgostosa.

— claro que precisávamos dele. Semana passada você vendeu a máquina de lavar e o jarro que ganhou de presente da tia Vivian que veio do Marrocos. Vai fazer um bazar com todas as nossas coisas?

Irritada ela passa uma das mãos sobre o rosto. Percebo novas rugas ganhando vida em seu rosto cansado.

— estamos precisamos de dinheiro, Liz. O negócio do seu pai não anda bem. Você sabe, ele investiu toda nossa poupança no restaurante libanês. E agora estamos tendo alguns prejuízos com ele.

Atônita, encaro-a.

— Ouvi o papai comentar outro dia que precisava pagar algumas dívidas. Não achei que fosse sério. — concluo — não estamos quebrados, estamos?

— Não — ela balança a cabeça e então desvia o olhar — ainda não.