Capítulo Três - Virando o jogo

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       Era só mais uma aula chata e cansativa de educação física na qual o professor começava com os aquecimentos e logo depois dava a bola para os meninos jogarem, enquanto as garotas ficavam sentadas nas arquibancadas observando o jogo e esperando o tempo passar.

     Tony e eu estávamos sentados em um dos degraus analisando a partida de basquete que se desenrolava na outra quadra do ginásio, ocupada pelos jogadores do time que treinavam intensamente. Ao meu lado Tony se contorcia a cada erro dos atletas e comentava o que cada um deles devia melhorar em suas performances.

    — caramba, esse McGuire é bom mesmo. Olha como ele se mexe com velocidade e equilíbrio quando recebe a bola dos outros. Só não gosto quando ele pula na hora de fazer a cesta. Ele deveria se aproximar mais do painel antes de lançar a bola. Por isso ele nem sempre acerta. Quando fica longe, fica mais difícil ter precisão.

    — Quem será que se sairia melhor em um jogo entre vocês dois?

    — Com certeza eu. Acerto 80%  das cestas enquanto ele só faz metade.— Tony afirma convencido e eufórico quando a bola é arremessada por McGuire e cai fora da cesta.

    — Você é realmente um menino muito ousado e convencido. Ele é o capitão do time, não está ali a toa.

    — Que foi? — ele olha pra mim, divertido — nunca disse que ele era bom, só disse que sou melhor.

    O apito do técnico soa e a partida acaba. O time de McGuire ganhou por 5 pontos a mais. Mas o técnico não parece feliz e dá uma bronca nos rapazes dizendo que eles precisam melhorar se quiserem vencer o campeonato municipal.

    De repente uma ideia geniosa e diabólica me ocorre. Destemida, aproveito a distração de Tony no celular e, criando coragem, digo alto ao capitão dos Hell's Bulls:

    — Bom jogo, McGuire.— o grandalhão suado abre um sorriso convencido — Mas meu amigo aqui disse que sabe fazer melhor.

     Na mesma hora seu sorriso desfalece e seu rosto toma um ar de desdém. Os colegas do time soltam um provocante 'Iiiihhhh' e Tony me lança um olhar surpreso e acusatório.

    — duvido muito, docinho. Ninguém é melhor que eu.— desdenha o atleta.

    — Se eu fosse você não deixava, Josh. — comenta um

    — Mostra pra ele, cara, quem sabe jogar de verdade— incita outro

    — N-não! Ela tá inventando. Eu não diss...

    — é, McGuire, quem será que joga melhor?— questiono, por fim.

    Do outro lado da quadra, o técnico Rey observa o desafio que intencionalmente implantei nos atletas. Curiosamente, ele parece estar interessado quando diz ao meu amigo:

    — mostre do que você é feito, garoto. Se for tão bom quanto fala, talvez eu te coloque no time.

    Com isso, Tony se empertiga. Ele parece inseguro e assustado ao se levantar. Mas a menção de entrar no time o fez ganhar uma certa confiança e coragem.

    — Vai lá, Tony. Mostra pra ele como se faz. Eu acredito em você.— sussurro e pisco o olho pra ele conforme vai descendo pela arquibancada. Ele engole em seco e não responde.

    — Vou acabar com você, magricela.— McGuire provoca.

    — É o que vamos ver.— devolve  Tony.

    E o jogo começa.   

                        ****

      Minhas mãos estão trêmulas. Sôo frio. Mal consigo respirar. Não ouso sequer piscar. Tenho a forte sensação de que meu traiçoeiro coração agitado sairá a qualquer momento pela boca.

      De pé na arquibancada, vejo Antony e Joshua McGuire se moverem ferozmente pela quadra. O jogo está empatado e eles estão a cerca de 10 minutos dando o melhor de si naquela partida a qual todo o time dos Hell's Bulls  e o técnico assistem atentamente, e até mesmo os alunos da nossa enfadonha aula de educação física pararam suas atividades e vieram marcar presença.

    Apenas um ponto, um mísero ponto, irá determinar quem será o vencedor dessa partida e decidirá se Antony ficará ou não com a sua tão sonhada vaga no time de basquete da escola.

    — VAI ANTONY! PEGA ESSA BOLA! — Grito com toda a força dos meus pulmões quando vejo meu amigo perder a posse do objeto  para McGuire e ficar em desvantagem.

     De início, a torcida era voltada apenas para o capitão do time. Seus colegas atletas gritavam alto seu nome e incentivos à cada vez que ele se sobressaia no  jogo. Entretanto, Antony não se deixou intimidar e logo provou seu devido valor e talento perante o público. Por conseguinte, tanto vozes conhecidas de meus colegas assim como a de outros integrantes do time dos Hell's Bulls passaram a torcer para Tony, fazendo com que ele cada vez mais brilhasse em sua performance e acertasse  a bola  na cesta continuamente.

      McGuire também não ia mal, mas seu desempenho foi sendo ofuscado aos poucos na medida em que percebeu que seu oponente estava altura e fora subestimado por ele. Seus esforços em tentar recuperar a bola e tentar avançar na frente de Tony eram visíveis e até de certo modo cômico. Afinal, quem diria que a sorte daquela partida estaria a favor de um principiante magricela e desconhecido?

    Aflita, observo que Antony está, dessa vez, com a bola e McGuire está inclinado em sua frente tentando impedir que ele avance. Mas Antony, mais esperto e perspicaz, finge avançar pela direita e o capitão cai nesse velho truque bloqueando seu avanço. Em seguida, velozmente, Tony avança pelo outro lado enquanto McGuire, tarde demais, enfim percebe o estilo da manobra e antes que ele numa tentativa desesperada consiga arrancar a esfera alaranjada da mão do oponente, gira e cai no chão. Antony não perde a chance e eu não contenho meus gritos de excitação. É agora ou nunca, o caminho está livre para a vitória.

       Sem demora meu melhor amigo corre em direção ao placar salta incrivelmente e alto e faz a cesta.

    O apito do técnico soa estridente e o jogo finalmente acaba. Antony estira as mãos para o alto num gesto de vitória enquanto eu corro das arquibancadas em sua direção. A nossa volta as pessoas que torciam a seu favor comemoram, e os que não torciam batem palmas discretas e reconhecem que foi uma boa partida. O rosto de McGuire exibe fúria e inveja, os amigos tentam consola-lo mas ele se desenvincilhada deles e sai caminhando a passos pesados para fora do ginásio.

    — Consegui, Elize, eu consegui! — Tony exclama.

    Pulo em seus braços, tomada pela emoção e alegria, e lhe dou um abraço apertado, ignorando seu corpo cheio de suor.

    — Eu sabia que você conseguiria, Tony. Nunca duvidei de você. — sussurro em seu ouvido em meio à multidão que se amontoa a nossa volta.

    — Valeu mesmo, Elize. Eu não conseguiria sem você. Eu não poderia ter uma melhor amiga melhor.

     Dito isso ele me dá um beijo rápido na bochecha e se desfaz do meu aperto para ser parabenizado pelo técnico da equipe.

     Sinto minhas bochechas corarem violentamente. Um sentimento de ternura e timidez preenche até o último espaço vago dentro de mim.  Talvez ele tenha feito isso inconscientemente, levado pelo calor do momento. Talvez nem se lembre depois. Mas eu  prometo a mim mesma que não vou esquecer e guardo essa lembrança com todo cuidado num pequeno espaço dentro do meu coração .

    Acho que nunca mais vou lavar a bochecha.

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