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Quando a luz da sala apagava, era sinal de que todos da casa já estavam dormindo.

Janete ainda estava abalada com aquela mão que lhe apalpou. Deve ser o cansaço, pensou. E de fato podia ser. Ligou a luz do quarto, abriu a bíblia e começou a lê-la. Depois de ler vinte e uma vezes o Salmo 91, fechou a bíblia e apagou a luz. Agora, com a luz apagada, o quarto era um verdadeiro breu. Ouvia insetos cochicharem de um lado para o outro. Parece até que conversavam um com o outro, achou aquilo até cômico, por sinal.

Quase ao pegar no sono, sentiu a perna se elevar até determinada altura, depois desabar, com furor na cama. Ai, meu Deus! Exclamou. Eram os espasmos musculares. As famosas mioclonias noturnas que a perturbavam desde nova. Pareciam que viria lhe perturbar a madrugada toda na primeira noite na casa dos Robinson. Lembrou que teria que comprar um bom relaxante muscular para poder dormir em paz.

Enquanto esperava o sono vir, pensou no quão estava feliz por trabalhar para os Peixotos. Era uma típica família, assim como muitas que já conheceu. Uma mãe protetora, um pai com pouco tempo para a família, uma adolescente rebelde, um garoto bagunceiro e uma adorável garotinha, a quem mais lhe agraciava no momento. O pensamento vinha quando ouviu um choro vir de uma parede, exatamente atrás do guarda-roupa do quarto. Janete se arrepiou. 

— Quem está aí? — imquiriu Janet com a mão no coração. A resposta veio com um soluço. Sentou-se na cama perguntando mais uma vez. — Quem está aí? — O choro deu uma leve pausa. Pensou, por um momento, que o choro viesse do quarto de Joaninha, talvez estivesse chorando por sua antiga companheira, a mesma que havia morrido de pneumonia naquele mesmo quarto, naquela mesma cama em que estava agora deitada.

O choro vinha mais uma vez, baixinho, triste, de partir o coração.

Janete pôs-se de pé, e aproximou-se do móvel, ainda com o coração na mão.

— Meu Deus! Será que estou ficando louca?

O choro começava, agora com intensidade, como se alguém a esmurrasse.

— O que você tem? Quem está aí?

Toc, toc, ouviu detrás do guarda-roupa.

Janete deu um pulinho para trás. Respirou fundo, com o Salmo 23 na ponta da língua.

Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum, pois tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me protegem.

Agora, extraída do medo, arrastou lentamente o guarda-roupa, a fim de desvendar o que era aquilo. Humilde, sabia que podia estar enlouquecendo. Carregava aquela hipótese consigo. O móvel velho pesava bastante, por isso usou de toda a sua força para arrastá-lo, e foi assim que conseguiu. Baratas e formigas saíam desesperadas do pequeno claustro. O chão, assim como a parede, estava demasiado imundo, porém não fora aquilo que a chamara atenção, e sim uma assombração. Uma menina de costas, de joelhos e choramingando. Logo em seguida sumiu. Janete pulou para trás, nervosa.

Se pôs de joelhos e começou a rezar. Quando o pânico deu lugar à calmaria, foi até o guarda-roupas de novo e achou um pequeno caderno, velho e sujo, jogado, talvez, propositalmente ali. Janete o pegou, limpou-o com as mãos, e leu, no prefácio: Diário de Fátima.

"É o diario da menina que morou aqui", balbuciou Janete. O que será que a garota escrevia nele? Ficou supercuriosa, mas pensou no mal que podia lhe trazer lendo o diário de um morto. O que faço meu Deus? Decidiu guardar embaixo do colchão para depois tomar uma decisão e, depois de muito insistir, acabou dormindo.

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