28

80 11 0
                                    


O fim de semana veio com um triste pesar para a família. A morte do pai fez com que as crianças ficassem pensativas e interrogativas. A sra Jamila Peixoto fez questão de responder todas as perguntas das crianças, sempre pedindo ajuda divina de Janete, apesar da convergência religiosa das duas. Dizia que a morte fazia parte da vida de todos nós. Um dia enfrentaríamos ela e que Deus nãos nos esqueceria, se fossemos bonzinhos e obedientes, claro.

Bianca questionou sua mãe sobre o pai. Perguntou se ele era digno do céu, pois cometeu suicídio. Tirou a sua própria vida. Deus desaprova tal ato maligno. Janete disse que dependeria. Realmente era aquilo era algo hediondo para Deus.

— Larga de ser tonta, Bianca. — resmungou Joaninha. — Papai está no céu pois era um homem bom.

— Ah é! Então porque nos deixou, sabendo que também passaríamos dificuldade sem ele. Papai foi um covarde.

A pesada mão da sra Jamila voou pela primeira vez na face da adolescente. Seu rosto deu um giro de 90° voltando a posição normal vermelho e cheio de lágrimas.

— Nunca mais fale isto, sua mal agradecida. Você não sabe o que passava na cabeça dele pra ter feito isto.

Na madrugada de sábado para domingo, a sra Jamila foi ao banheiro para urinar quando ouviu passos vindos do térreo. Deu uma olhada para o quarto e constatou que as crianças estavam em suas camas dormindo, bem como Janete. Os passos se intensificaram lá embaixo, parecia que havia gente pulando naquela espaçosa sala de estar. Chegando na sala, o som cessou. A televisão ligou-se então automaticamente e na tela uma visão a deixou assombrada e de joelhos. A imagem do esposo enforcado refletia na televisão como um filme de terror. Antônio Peixoto pedia socorro à esposa e dizia para que esta chamasse um padre para a casa. De repente uma risada diabólica saía da tv. A risada parecia um eco e entrava como faca nos ouvidos da mulher. A sra Robinson se corroeu toda, ficou paralisada. As pernas bambas, como um prédio trepidando.

A televisão então desligou sozinha. Um barulho de louças vinha agora da cozinha, e com ele um assobio. Um assobio irritante, parecendo o grito da Matinta Pereira. Conseguiu agora mover uma das pernas depois da paralisação. Consequentemente a outra. Agora podia caminhar, mas o medo ainda a dominava. Chegando na cozinha, um frio intenso novamente a apossuiu. Seu corpo todo estremecia e os seus ouvidos latejavam ao som daquele maldito assobio. Desvencilhando-se do medo, não totalmente, ligou a luz e, para a sua surpresa, viu a pequena Fátima, a mesma garotinha de olhos tristes com vestes de doméstica a fitava diabolicamente.

"Boa noite, sra Peixoto", disse ela, "só estou terminando esta louça já vou dormir". Jamila desmaiou. Acordou horas depois, esparramada no chão com Janete perguntando se estava tudo bem.

— Sim, sim. — disse ainda confusa.

O Quarto Dos Fundos Onde histórias criam vida. Descubra agora