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Na mesma manhã, Janete preparou um almoço delicioso. Uma macarronada e uma estupenda carne assada que adornava a mesa preparada com tanto amor à família. A sobremesa estava mais deliciosa ainda. Creme de bacuri com biscoito champagne. George e Bianca só faltaram lamber o prato.

— Estava mesmo delicioso. — disse a sra Jamila, com um sorriso condescendente na face. Parecia não se lembrar de nada da noite passada. Janete também não quis tocar no assunto.

— Estava mesmo. – disse Bianca, pela primeira vez sendo simpática com Janete.

— Obrigada. — disse Janete, vermelha.

— Quero mais creme. – disse Joaninha com a boca cheia de biscoito.

À tarde, Janete foi até quarto de Joaninha, assim que terminou seus afazeres. A garotinha estava olhando seu caderninho de desenhos e sorrindo sozinha.

— Posso daber do que esta princesinha linda está rindo? – perguntou Janete atravessando a porta.

— Nada. Apenas dos meus desenhos.

— Posso vê-los?

— Pode sim.

Janete abriu o caderno de desenhos da pequena Joana e observou diversos desenhos sem coordenação alguma. Perguntou à menina o que significava cada um, mas a pequena apenas dobrava o beiço dizendo que realmente não sabia.

Virando às páginas, mais a frente, viu outros desenhos feitos por mãos de crianças de mais idade, como de dez ou talvez doze anos de idade.

— Quem desenhou estes aqui? — perguntou Janete, interessada.

— Foi a Fátima.

— Fátima?

— Sim. Ela sempre desenha pra mim.

— Hum. Quando ainda morava aqui?

— Ela ainda continua morando aqui, Janete, sua boba.

A pobre criança acreditava mesmo que a menina Fátima ainda estivesse viva. Por diabos! Estava morta, morreu ali mesmo no quarto dos fundos, enferma, seca como uma garrafa pet jogada numa lata de lixo. Janete sentia o cheiro da morte na cama todas as noites.

— Não, Joaninha. A Fátima não mora mais aqui. Você não ouviu a sua mãe dizer?

— Ela está aqui sim, Janete. Mas está escondida. Ela tem medo que a mamãe brigue com ela. Fátima sempre vem brincar comigo aqui no meu quarto, principalmente à noite.

— Então é por isso que você fica acordada até tarde? – perguntou Janete.

— Sim.

Janete amava crianças por causa daquilo. Elas nunca esqueciam as pessoas que amavam. Eram ingênuas e verdadeiras.

— Veja. — disse Joaninha dando-lhe uma folha de papel separada do seu caderno de desenhos. Janete pegou-o e se arrepiou com o desenho. – Fátima desenhou ontem à noite, quando você entrou no quarto.

A menina desenhara nitidamente Janete com suas vestes de doméstica. Até mesmo suas feiçõesforam descritas quase que perfeitos no caderno. Joaninha jamais desenharia aquilo. Atrás de Janete, ainda no desenho, havia uma garota com os cabelos batendo ao chão de tão longos.

— E quem é essa menina atrás de mim? — perguntou Janete, extasiada.

— É a Fátima. Ela estava aqui com você ontem à noite. Não lembra?

Janete soltou o desenho das mãos e empalideceu.

— Não! Não havia, Joaninha. Só estávamos nós duas.

— Ela pegou no seu ombro. Esqueceu, bobinha?

Janete lembrou-se do arrepio que tivera. Começou a temer. Joaninha dizia aquilo com as mais puras palavras.

— Sim. Eu me lembro. – disse Janete gelada.  — Eu me lembro.

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