O Labirinto dos Deuses

A Caverna Interior

Dizem que se você olhar para um abismo por muito tempo, ele vai olhar de volta para você. Se estamos no Labirinto da Justiça para sermos julgados pelos Deuses, então suas partes mais profundas - suas entranhas - devem revelar nosso íntimo. Aquilo que guardamos e ocultamos até de nós mesmos. Talvez esse fosse o plano dos Deuses ao colocar em seu Labirinto locais tão reclusos que nos fizessem sentir perturbadoramente dentro de nós mesmos ao penetrarmos, quase como se cruzássemos uma barreira invisível que nos levássemos a nosso próprio interior. Eu quase podia dizer que os entendia.

~~

Estar dentro do Labirinto era tão perigoso quanto estar dentro de nós mesmos, ele revelava o que havia de melhor e de pior em cada um. Mas, talvez esse fosse o verdadeiro Julgamento. Conforme eu sentia que a saída se aproximava de nós - ou nós dela, eu nunca saberia - o clima mudava a nossa volta e os Vitta Cells expressavam sua vitalidade essencial de forma mais intensa formando uma tempestade com nuvens densas e escuras que nos acompanhou pelo caminho prestes a desabar. O céu em preto e branco era uma incógnita estranha e assustadora e eu sentia Treze pares de olhos a nos observar através de um véu cinza embaçado quilômetros acima de nós. A morte de Daniel ficara para trás havia um dia e já se acumulava em meio a minha coleção de fracassos e todas as outras que não pude evitar. Ao mesmo tempo eu escutava Gabriele em minha mente "De alguma forma eu ainda estarei aqui. E, de alguma forma, você sempre foi melhor que eu, Pan" e sua voz sempre me confortava fosse real ou uma memória - uma memória de algo irreal tão real quanto nosso último encontro. Mentira, eu não era melhor que ninguém, muito menos melhor que ela. Mas se era verdade que ela estaria ali para sempre, talvez isso fosse verdade para Daniel também, talvez aquela fosse sua redenção máxima diante dos Deuses e do Labirinto.

Era estranho pensar que quando entramos ali havia tantos outros de nós, havia um propósito - e um destino? - mas eu tinha visto as pessoas se perderem pelo caminho até ali, se perderem de si mesmas e do mundo. Ao mesmo tempo, vira outros que apenas perderam seu caminho nas mãos daqueles que se perderam. Era estranho e confuso. Talvez a culpa fosse dos Deuses como diziam, mas não fazia sentido - se somos cada um que escolhemos nossos atos, assim como Eles dizem...

A lança de Gabriele firme em minha mão, que eu fizera questão de carregar comigo, mantinha suas palavras vividas em minha mente; eu não tinha certeza se isso me confortava ou trazia de volta a culpa pela sua morte mas eu gostava de ter sua memória por perto. Então um relâmpago iluminou toda a floresta a nossa volta em tons de laranja, rosa e amarelo, seguido por um trovão carregado. Meu olhar buscou por Timothy ao meu lado no mesmo instante em que ele me retribuiu e nós concordamos em silêncio - havia quase um dia que não trocávamos muitas palavras. Eu o puxei por um caminho estreito em busca de abrigo enquanto o ritmo das luzes psicodélicas aumentavam acima de nós antecipando a noite. Mas a Natureza foi mais rápida - embora eu nunca soubesse se fora obra sua - e a tempestade desabou de uma só vez. Em segundos meus pés e o cabo da lança passaram a afundar na terra molhada e minhas bandagens no ombro e no braço que eu fizera na noite anterior ficaram desconfortavelmente empapadas, de uma forma ainda mais irritante que a roupa molhada.

A chuva tornou nossa visão muito difícil em meio ao caminho estreito que eu pegara entre a floresta, eu seguia em frente apoiando a lança com a mão direita e segurando Timothy com a esquerda. Até que parei mantendo-o atrás de mim quando senti algo errado no chão, a lança afundou mais do que deveria e parecia que tinha um buraco a frente. Droga, não tinha nem como acender fogo no meio da chuva - óbvio que não. Eu me aproximei para avaliar a dimensão e saber do que teríamos que desviar, mas a terra onde eu pisei cedeu e eu caí dentro do buraco aterrissando dolorosamente sobre uma superfície de terra e pedra.