Dulce
Observei Eleonor examinar meu pai, ela estava estranha, mais estranha do que quando saí da casa dela. Talvez fosse pelo fato do irmão da Morgana estar entre a vida e a morte.
_ E então? Alguma idéia do que ele tem? – Doutor Artur estava tão preocupado quando eu, embora com certeza preferisse estar ao lado de Morgana agora.
_ O que ele tem... Isso não é magia.
_ Como assim? O doutor disse que os exames dele estão ótimos; ele está curado.
_ Sim, ele está, mas não foi enfeitiçado. Tem muitas coisas que não sei explicar, que não sei concertar.
_ Senhora, o que ele realmente tem?
_ Eu não sei, mas a única forma de salvá-lo é com um exorcismo.
_ Meu pai está possuído?
_ Dulce, as coisas não são tão simples assim, tem muitas formas das trevas alcançarem uma pessoa. Meu conselho é que tragam o padre Bento aqui imediatamente.
_ Não somos católicos.
_ Isso não importa, mas se não se sente confortável com um padre, chame o Pastor Pedro.
Vinte minutos depois, descobri que o pastor, o padre e o monge estavam incomunicáveis em um lugar desconhecido conversando com a mãe da bruxa vadia má do norte brasileiro. Eu entrei em desespero; todos que podiam ajudar não estavam na cidade, então me lembrei do nerd católico. Sem nem pensar se era uma boa ideia, liguei para meu colega de sala.
Meia hora depois Leonardo chegou suado, e com uma mochila cheia de coisas estranhas.
_ Oi!
_ Oi Dulce!
_ Acha que pode ajudá-lo?
Léo aproximou-se da cama e tocou a mão direita do meu pai.
_ Sou apenas um aprendiz, mas farei o que puder para salvá-lo.
Karen
Dirigi como uma louca e consegui chegar a aldeia antes do anoitecer. Mayra tinha me ensinado o caminho, mesmo assim, quase me perdi umas cinco vezes; eu estava muito nervosa. A mãe de Ester queria ir junto, mas as coisas estavam complicadas na cidade, então ela acabou ficando. Parei o carro no fim da estreita estrada de terra que terminava no início do território da aldeia e continuei a pé. Os últimos raios de sol foram dando lugar às sombras conforme eu entrava na floresta carregando minha mochila pesada. Eu podia sentir o cheiro de algo queimado e uma camada de fumaça pairava sobre a minha cabeça; estava chegando perto. Atravessei uma ponte improvisada sobre um córrego raso, com o resto de luz pude ver meu reflexo no espelho d'água; eu não tinha trocado de roupa pra sair, na verdade nem parei pra pensar sobre isso e agora eu ia conhecer a família de Cauê, ou o que restou dela, com um vestido azul rodado, com alças finas e uma sapatilha cinza. Pelo menos meu vestido tinha um decote reto. Balancei a cabeça pra afastar esses pensamentos estranhos; claro que queria que eles gostassem de mim, mas no momento tinha preocupações maiores.
Quando a escuridão ocupou toda a floresta, eu já estava chegando a aldeia; uma fogueira imensa estava acesa no meio da clareira e só quando me aproximei, percebi que era na verdade uma pira funerária. Não pude conter as lágrimas quando vi os corpos empilhados em cima da pira, um homem estava a circulando enquanto cantava algo triste. Por alguns minutos eu fiquei observando a cena; cinco corpos queimando, muita gente chorando e eu sabia que aquilo ainda não tinha acabado. Ninguém notou minha presença por certo tempo, pelo menos foi o que pensei.
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Entrelaçadas
FantasiaHá muitos milênios a inveja dos seres humanos desencadeou uma guerra com os místicos. O desfecho desse acontecimento só não foi pior, graças ao sacrifício de uma filha de Eva. Nos dias atuais o Exército Negro está ansioso para ser libertado de sua p...