XVII - Em Cima do Muro.

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                                                                                       ALEXANDRA

Amizade.

Muitos definem amizade como companheirismo.

Mas no caso, como sou extremamente trouxa, amizade se define a: acordar às 07 da madrugada pra limpar a piscina e ir ao supermercado para comprar coisas para uma "pool party".

Ok.

Perdoa-me pelo mau humor matinal, mas quer saber? Não sou obrigada.

Só estou me prestando a este papel porque sou um amor de pessoa e estou carente o suficiente pra querer dar uma festa.

Assim que cheguei à fila do caixa, que por sinal estava cheia demais praquela hora da manhã me deparei com dois amigos que tinham o corpo malhado cochichando e rindo a todo instante.

Como eu não fazia a menor ideia do que estava acontecendo, fiquei ali apenas incomodada por temer que estivessem rindo de mim.

Sou mulher, negra, dona de mim. Não vai ser esses brancos racistas que irão me impedir de sorrir.

Minha mente voltou para terra quando a luz verde do caixa se ascendeu avisando que o próximo cliente poderia se dirigir até a atendente.

Com passos lentos uma idosa que estava a nossa frente se dirigia até a atendente que a esperava com um sorriso enorme aberto. Para meu desgosto, tive a infelicidade de escutar os dois jovens menosprezar da senhora.

— Sua anta! Você mal consegue andar e está aqui a atrapalhar a fila! — O mais alto dos dois debochou.

— Agiliza sua velha idiota, tem gente que tem mais o que fazer a que sentar a bunda gorda no sofá e ficar tricotando. — O outro completou.

Ao ouvir aquilo, a minha primeira reação foi morder os lábios pra ter a confirmação que aquilo não era um pesadelo. Mas, infelizmente, era real. Ninguém presente ali foi capaz de mexer um palmo para ajudar à senhora que tremia o corpo inteiro.

Os rapazes estavam prestes a começar a debochar novamente quando intervi.

— Vocês nem ousam fazer uma coisa dessa! — Cerrei os olhos. — Seguranças! Por favor, Segurança? — Firmei a voz e disse o mais alto que pude.

— Você está ficando louca? — Me questionaram. — O que estamos fazendo demais sua tonta? Só estamos com pressa.

— Não venham fazer de tontos para o meu lado. Violência contra o idoso é crime sim e não vou permitir que vocês dois continuem aqui a debochar de uma moça que visivelmente tem problemas de locomoção.

Fui interrompida.

— O que está acontecendo aqui? — Um segurança alto, trajando anil e com feições sérias apareceu atrás de nós.

— É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. — Fiz uma pausa recuperando o folego enquanto rogava que tivesse citado certo o Art. 3º do Estatuto do Idoso. — E esses dois babacas estão aqui balbuciando em alto tom para todos presentes escutarem uma tamanha ofensa para aquela moça ali na frente.

— A senhora confirma esses fatos? — O segurança indagou a pobre senhora.

Ela estava tão nervosa que deixara a bolsa de moedas cair sobre o chão de tanto que tremia. O estado de nervos era tanto que nem a boca conseguira abrir, confirmara apenas com o balançar da cabeça e com lágrimas escorrendo por toda a face.

Teus Olhos MeusOnde histórias criam vida. Descubra agora