ANTÔNIO
Mais um dia nasce, mais uma semana se inicia e mais uma vez não consegui dormir na noite passada porque meus pensamentos me torturavam, me faziam lembrar do imenso monte de lixo que sou.
Às vezes me sinto um ingrato, afinal, eu tenho uma família que me ama, o emprego dos sonhos, o namorado perfeito, amigos incríveis e, bem, nada disso me alegra.
Eu olho para tudo que já conquistei e... Sou só mais um comedor de feijão como qualquer outro habitante da Terra.
Talvez, caralho, é muito difícil assumir isso, mas, talvez eu tenha que voltar a me tratar porque estou começando a notar há algumas semanas que estou com o mesmo desanimo apático do fim do ensino médio e dos primeiros anos da graduação.
Saúde mental é algo sério, merda, sério até demais.
Não consigo acreditar que os dias azuis estão voltando.
— Antônio? — Ouvi a voz doce da governanta me chamar.
— Bom dia, meu amor — bradei em meio de um bocejo.
— Seu suco de melancia está pronto, você vem tomar o café da manhã na mesa?
— Sim, não se preocupe em trazer aqui — respondi.
É, acho que não há mais tempo para chorar.
Tomei aquele suco gelado e extremamente saboroso com calma, hoje é meu dia de folga e eu não havia nada, absolutamente nada pra fazer pela manhã além de ficar na cama assistindo série e coçando o saco.
Estava prestes a jogar a bunda gorda na cama quando olhei pela janela e vi as serras no horizonte. Com eu queria largar tudo e ir viver uma vida mais tranquila. Mas, depois de tudo que já passei, não seria loucura? Eu poderia vender a empresa e dar menos aulas, mas... O medo de tentar, me impede de dar o primeiro passo.
Ignorando, pelo menos tentando, meus pensamentos, voltei para cama e sintonizei a TV em um canal que fala de casa e saúde. Não demorou muito e fui esmagado novamente por uma vontade de desaparecer. Eu consigo sentir o peso do mundo sobre as minhas costas.
Quando mais novo, meus amigos e eu tínhamos o costume de ir até um bosque da cidade e praticar bruxaria, sim, bruxaria. Nós acendíamos velas, queimávamos ervas, nos "conectávamos" a cristais, rogávamos a Deuses ancestrais por dinheiro, cura e amores... No final, aquilo sempre dava certo. Se era apenas coincidência, se era o destino, ou os Deuses nos respondendo, eu jamais saberei... Mas eu estou cansado de me sentir uma caçamba de lixo.
Peguei o celular e digitei uma mensagem pra Marcos. Desde que ele começou no estágio temos nos visto menos vezes e tentamos compensar isso almoçando juntos nos dias de folga.
Enquanto me arrumava, notei que ele havia respondido um "tudo bem, espero que esteja tudo bem. De noite te ligo, te amo". Ao ler o "te amo" esbocei um sorriso ao imaginar a sua voz sussurrando aquelas palavras em meu ouvido.
Depois de revirar a despensa atrás de uma vela verde, finalmente a encontrei e a joguei dentro de uma ecobag que eu havia separado.
Prestes a sair de casa, olhei para a cesta de frutas e peguei a laranja com melhor aparência e a descasquei. Em uma panela funda, coloquei o suco dessa laranja para aquecer junto de sua casca, canela, cravo e bastante mel. Depois que ferveu, despejei aquele líquido em uma garrafa e segui em direção ao carro.
Perguntei a assistente pessoal do celular sobre as cachoeiras no raio de 150 Km, mas antes que ela me respondesse lembrei de uma que se localizava na beira de uma rodovia que passava pela cidade. Seria ali.
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Teus Olhos Meus
RomanceDizem que a Universidade é uma das fases onde todos querem aproveitar o máximo do mundo, independentemente da vida que você levara antes dela. Antônio, um renomado professor terá um ano letivo conturbado após conhecer Marcos, seu novo aluno. Como se...