Amélia
— Então, é assim que vai ser?
Meu pai fala de sua poltrona e eu tiro os olhos dos discos que estou olhando.
— O que?
— Você vai terminar o ano sentada nesse sofá?
— Mamãe me colocou de castigo. — digo, distraída. — E você também.
— Castigo? Nem sei o que é isso. — ele murmura e folheia o jornal. Rio e o encaro.
— Está me acobertando por que minha mãe saiu?
— Não, estou dizendo que se você sair para espairecer um pouco e retornar antes dela chegar, direi que tudo ocorreu normalmente.
Arqueio uma sobrancelha.
— Por quê?
Papai abaixa seus óculos de grau e me encara.
— Você não vai conseguir consertar nada sentada nesse sofá, Amélia.
Aceito o conselho do meu pai e visto um casaco. Coloco um relógio no pulso para saber a hora que minha mãe volta e saio de casa. Começo a caminhar sem um destino exato, mas é bom estar fora de casa depois de duas semanas. As únicas pessoas que tenho visto são meus pais e a Grace... Ela apareceu mais umas duas vezes e me trouxe até uma torta. Estamos conversando, está menos esquisito agora.
A vizinhança já ganhou cor e todas as casas estão enfeitadas para o natal, inclusive a parte do comércio. Os pisca-piscas trocam de cores freneticamente e a neve que havia sido prometida para a semana passada ainda não tinha chegado. Por sorte passo despercebida pelas pessoas e meus passos me levam até a porta do cinema. Adentro e penso em dar apenas uma olhada nos filmes que estão em cartaz – não que eu vá realmente assistir: não trouxe dinheiro e não trabalho mais aqui – mas quando entro, sou sugada para uma dimensão de memórias e meus olhos ficam marejados.
As cenas passam todas rápidas, como cenas de filmes. Eu vendendo pipoca por três anos para Drew sem ele me conhecer; Josh dançando e caindo no chão; Eu fazendo pipocas e Grace conversando sem parar comigo só porque ela sabia que eu queria companhia; Eu fazendo pipoca sozinha; Eu ouvindo músicas antigas para passar o tempo; Sofia me ensinando a desfilar...
Tudo vem de uma só vez. Tudo. E eu sinto... Sinto uma avalanche de sentimentos. Da pessoa que eu costumava ser até hoje... Um estalo e eu finalmente começo a me perguntar por que estou demorando tanto para voltar a ser quem eu era.
Sim, a Emma venceu. Mas eu não preciso continuar á ser assim.
Para ser franca, sinto falta da antiga Amélia.
Muita falta.
— O bom filho á casa retorna! — Sr. Montgomery interrompe meus pensamentos e seco uma lágrima para que ele não veja. — Oi, Mel.
— Oi, Sr. Montgomery!
— Ah, filha, pelo amor de Deus. Eu já estou tão velho, quando vocês vão me chamar pelo nome?
— Bruce! — Sra. Montgomery grita dele. — Derrubaram refrigerante nos bancos de novo!
— Viu? Ela me chama pelo nome. — Ele sussurra para mim e rio. — Já vou em um segundo, querida!
Ela acena para mim, mas gira os olhos para ele. A cena me faz rir e a sensação é libertadora... Eu não sei o que acontece, mas toda vez que estou aqui dentro, é como se meus problemas ficassem lá fora.
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Garotas Venenosas
Teen FictionAmélia Harley define sua vida em uma única palavra: tédio. Além de não fazer parte de nenhum grupo social do colégio, possui apenas dois amigos: Josh Cohen e Grace Hill - ambos considerados seus amigos para sempre. A única coisa que movimenta sua pa...