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— Então foi você? Você quem os tirou de mim? — Dei um passo a frente já sentindo as ondas reconfortantes de meus dons, borbulharem em meu corpo, dançando entre minhas veias.

O Oráculo apenas continuou a analisar suas mãos, sem nem ao menos levantar seu olhar. Sua calma exuberante era como combustível para o fogo crepitante dentro de mim.

— Nem. Mais. Um. Passo! — comandou ela, sem elevar o tom de sua voz. — Eu ainda posso parti-la em dois em meio segundo, não ouse me subestimar. Muitos já foram levados a ruína por conta de sua raiva — um sorriso preguiçoso brincou em seus lábios. — E, esses — completou com uma calma predatória — são os mais saborosos.

Eu não sabia se o que ela dizia era de todo verdade mas, não estava disposta a arriscar. Ainda não.

— Boa menina! — Murmurou ela. — Onde estávamos? Ah certo, seus dons — disse tamborizando seus lábios com as pontas dos dedos. Por fim, seus olhos encontraram os meus e senti uma necessidade absurda de recuar, mas não o fiz. — Seu corpo continha Maestriya demais, é um milagre você sequer respirar  — fez uma pausa —, alguém lá em cima gosta muito mesmo de você... Mas o fato é que eu apenas não deixei que você sentisse a presença de seus dons, para que não pudesse usá-los. — Ela deu de ombros levemente. — Mas eles sempre estiveram ai.

Seu tom indiferente me fazia querer gritar.

— E quanto aos meus ferimentos? — Exigi saber.

— Maestriya — disse como se fosse o óbvio. — Ela retardar seus poderes de cura. Me surpreenda muito que você não saiba disso.

— Pensei que soubesse de tudo. Que não pudesse ser surpreendida. — falei com desdém.

A garotinha sorriu divertida.

— E você está certa. Não posso.

Eu não podia entender todo o seu jeito misterioso e sombrio, mas não questionei, já estava eufórica demais para ver novamente à luz do dia e, ficar á questionando só retardaria todo o processo.

Lendo minha mente, como de costume, o Oráculo deu passos em minha direção e precisei de todas as minhas forças para não me encolher ou recuar. Uma de suas mãos se projetou em uma garra com pontas afiadas como laminas e temi o pior, mas ela estendeu seu outro braço, ainda humano, usando sua garra cortou seu pulso. Imediatamente sangue de uma mistura entre vermelho e preto jorrou do ferimento. — Eu estava abismada, mas não fiz nada, nem sequer me movi.

Sua garra agarrou meu pulso direito e abruptamente tentei me soltar, mas ela não afrouxou nem um pouco seu aperto. O Oráculo posicionou seu pulso cortado acima do meu e o sangue frio como gelo escorreu sobre minha pele. Assim que se afastou, pude perceber que o sangue se firmava conforme serpenteava em mim até cobrir todo o meu antebraço. Sacudi meu membro como se fosse capaz de jogar para longe aquela gosma, mas ela não se moveu, pelo contrário, se firmou ainda mais e tomou uma forta. — Um bracelete de serpente, preto e brilhoso, ônix até, se enrolava por toda a extensão de meu antebraço, sua cabeça parava no limite da linha de meu cotovelo. Seus pequenos olhos eram vermelhos como duas minúsculas joias. Como rubis cintilantes.

Eu estava boquiaberta. Sem saber o que dizer. Era frustrante saber que a magia ainda continha muito a me ensinar.

— Isso minha cara, sela o nosso acordo — disse ela ao me ler novamente. — Esse bracelete lhe mostrará o caminho até aquilo que eu quero e, assim que suas mãos o tocarem, ele trará você de volta para mim. Depois disso, estará livre para ir. — Fez uma pausa. — Mas, não tente me enganar, eu saberei se você ousar me trair.

Assenti, mesmo tendo vontade de negar tudo aquilo. Tão pouco entre mim e minha liberdade... um estremecimento prazeroso desceu por toda a minha espinha, tive que conter meu rosto para não curva-lo em um sorriso grandioso; mesmo que o preço de minha liberdade fizesse minha cabeça latejar em preocupação.

Em um piscar de olhos, meu vestido surrado dera lugar a um uniforme inteiramente feito de couro e panos leves; um boldrié em volta de meu peito repleto de adagas reluzentes, uma espada presa em minha cintura e uma aljava sobre meu ombro. O arco estava em minha mão. — Amarmada até os dentes. Pronta para o que quer que vinhesse pela frente. — Um arquejo em surpresa deixou os meus lábios.

— Bem melhor — A menininha sombria soltou um estalo com a língua. — Agora, ouça-me bem. Você tem exatos sete dias, nada mais, nada menos. — Disse ela com um sorriso de corvo dançando nos pequenos lábios rosados. — Ao pôr do sol do sétimo dia, se você não retornar com aquilo que desejo, sua carcaça me servirá de consolo — ela inclinou a cabeça lentamente e nem sequer piscou enquanto me analisava, avaliando sua proxima refeição. Me segurei, mesmo sentindo calafrios em todas parte de meu corpo por onde seu olhar passava. — Sua proteção e alimentação será critério seu então, tente ficar viva até achar o que estará procurando — cada palavras era um comando, não um pedido.

Pensei em qual seria minha punição por não fazer aquilo, por abandonar aquela caverna e nunca mais voltar. Mas me arrependi amargamente somente por pensar. — A serpente em meu braço se enroscou tão forte em volta do mesmo que mais um pouco de seu aperto partiria meu osso em dois. Trinquei meus dentes tão forte que meu rosto inteiro reclamou em desconforto. Sangue já pingava quando a serpente afrouxou e voltou a posição preguiçosa de antes.

O Oráculo sorria para mim. — Um aviso silencioso.

Ignorei o ocorrido — mesmo com o latejar constante da ferida recém aberta que se curava em meu braço —, e ergui meu rosto ao falar:

— Mais alguma coisa que eu deva saber? — Minha petulância supreendia até a mim mesma.

A menininha sombria se reencostou em seu trono imponente, posicionou suas pequenas mãos aos lados do mesmo e me avaliou mais uma vez. Sem pressa, sem pudor.

— Seus instintos humanos irão a trair. Veremos se será mais esperta do que eles.

Sem me dar a chance de retrucar, ela ergueu seus dedos até o lado de seu rosto e os estalou. Em um piscar de olhos, eu estava do lado de fora, sentindo a brisa fria contra meu rosto. Mas assim que meus olhos focaram-se ao ambiente, tive vontade de recuar. — Eu já vira este lugar uma vez e, todo o meu conhecimento sobre ele fez um arrependimento amargo preencher todo o meu ser. — Bile subiu em minha garganta.

Eu estava na floresta negra.

Sétima Filha - Traída Onde histórias criam vida. Descubra agora