10 - você aceita?

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Bernardo

Sigo para a escola ainda pensando no beijo de ontem à noite. Não consigo esquecer aquela droga de beijo e nem tirar a Cecília da cabeça. Espero não encontrá-la pelos corredores, afinal eu nem sei como agiria. Estou me sentindo... estranho.

Assisto à aula monótona do professor César e deixo a sala em direção ao refeitório. Eu me sento em uma cadeira e desvio o olhar, encontrando algumas garotas sorrindo em outra mesa. Os olhares são furtivos na minha direção e os cochichos são altos o suficiente para que eu possa ouvir e sorrir, negando com a cabeça.

— Ele é tão gatinho, muito mais do que o Arthur que se acha – diz uma delas, fazendo as outras se inclinarem para ouvir. Finjo que não estou dando a mínima. — Você precisa me contar como foi beijá-lo. Na verdade, todas nós queremos saber.

— Bom... Bernardo faz maravilhas com a língua e beija super bem — responde Luciana, olhando diretamente para mim e fazendo as amigas darem risadinhas.

— Você tem o número dele? Nós...

Ignoro as garotas e revisto os bolsos da calça atrás de algum cigarro ou baseado, não encontrando nenhum. Droga. Esqueci em casa.

— E aí. — Um cara negro se aproxima e puxa uma cadeira para si.

— E aí, Roger. — Troco um cumprimento com ele. — Cadê o Marcos?

Pegando a Karina lá no fundo da escola. — Acho que ele tentou ser discreto, mas acabou atraindo diversos olhares para nossa mesa.

Roger sorri, sem se importar.

— Ela é gostosa?

— Demais. Eu já peguei e não é querendo exagerar não, mas ela é muito boa no que faz. Além de linda.

— Hm. Estuda com a gente?

— Não, é do primeiro ano — murmura e em seguida diz em um tom baixo. — Ela sabe dançar funk de um jeito bem quente.

— Depois você me apresenta.

— Claro! — ele sorri.

­— Sabe do Jefferson? — decido mudar de assunto.

— Acho que ele não veio. Por quê? Ainda tá comprando aquelas paradas na mão dele?

— É — murmuro. — Ele é o único que vende nesse turno. Eu não tô a fim de me arriscar por aqui à noite.

— A diretora já tá desconfiando. A megera é esperta. Toma cuidado.

— Vou tomar.

— Aquela ali não é a garota cega que a Priscila odeia? — Inquere, olhando para o outro lado.

— Quem? — Desvio o olhar e é inevitável ficar surpreso.

Cecília caminha devagar entre as mesas; a bengala em uma das mãos. Sua saia xadrez deixa as pernas meio grossas em evidência e a blusa de botões fica folgada demais no seu corpo. Noto a ausência dos óculos escuros e ela passa pela nossa mesa, seguindo em direção ao outro lado do refeitório, mais vazio e silencioso.

O único problema é que a Priscila a observa de maneira cínica ali perto. Seu olhar é suficiente para me fazer imaginar que ela está tramando alguma coisa.

E tenho uma resposta assim que ela põe o pé no caminho da Cecília, fazendo-a se atrapalhar e cair no piso do refeitório.

A maioria dos alunos não consegue conter as risadas e eu juro que vejo lágrimas nos olhos da ceguinha. Fico de pé, um bolo estranho se formando no meu peito. Acho que é raiva; inexplicável e incômoda.

Uma Luz Na EscuridãoOnde histórias criam vida. Descubra agora