23 - ir embora?

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Bernardo

Às vezes eu me pergunto como posso ter mudado tanto. Realmente não sou o idiota apático de antes, pelo menos não na maioria das vezes. Ter conhecido a Cecília e continuar frequentando a terapia tem uma grande parcela de influência sobre isso. E a notícia recente me pegou de surpresa de uma forma considerável.

— Ela o quê? — Marcelo me encara; os olhos arregalados.

Ignoro a música sertaneja de fundo sobre algum imbecil que levou um par de chifres e está se lamentando no alto falante em uma voz ridiculamente sofrível.

— Eu já falei antes. Cecília está grávida. — Corro a mão sobre o cabelo, observando a movimentação do bar. Encaro a bebida sobre a mesa antes de negar com a cabeça. Eu poderia muito bem beber até cair, mas não farei isso. Cecília precisa de mim e eu não quero voltar a ser o babaca de antes com ela.

— Você está ferrado — murmura Marcelo se recuperando e eu assinto com a cabeça. — Você vai deixá-la?

— Claro que não! — murmuro, categórico. — Isso nem sequer se passou pela minha cabeça, cara. Apesar de tudo, eu gostei da notícia e vou assumir minha responsabilidade.

— Você está certo nessa parte, mas se eu estivesse no seu lugar estaria surtando com isso — diz ele antes de virar um copo cheio de cerveja na boca.

— Bom, acho que se fosse há alguns anos atrás eu fugiria, mas...

— Você mudou! — Completa por mim; surpreso. — Você acha que a tia dela vai fazer o quê?

— Não sei, provavelmente me xingar — murmuro.

— E se ela te proibir de ver a Cecília e...?

— Nem fala uma porra dessas, cara! — Fico completamente tenso. — E se algo assim acontecer, eu, sei lá, fujo com Cecília para bem longe. Eu não posso mais viver longe dela.

— Então, ela te pegou mesmo?

— Como assim? — Franzo o cenho.

— Você a ama?

— Amo — digo sem titubear e Marcelo dá risada antes de eu fuzilá-lo com os olhos.

— Eu ainda não fui pego por esse mal.

— É bom. Você devia experimentar — murmuro, divertido.

— Acho melhor não. Quero aproveitar a vida de solteiro. — Dá de ombros. — Quando você vai esclarecer as coisas com a família da sua garota?

— Hoje. Eu acho que já estou indo. — Dou uma olhada no relógio de pulso.

— Boa sorte — diz antes de se levantar e chamar a garçonete para pagar a conta. — Eu vou seguir para casa. Já estou cheio desse bar.



***



Estaciono a moto na vaga habitual e sigo até a casa pequena mais à frente. Bato na porta algumas vezes e Barbara atende, com um sorriso contido.

— Oi, Bernardo.

— E aí. — Noto que não há ninguém na sala e a casa está estranhamente silenciosa.

— Pode entrar. Estou indo chamá-las — murmura antes de sumir por uma porta no corredor.

Encosto a porta atrás de mim e caminho até o sofá, sentando desconfortável em seguida. Estou louco pra ver a Cecília.

— Boa noite — diz uma mulher morena e baixinha, entrando na sala.

— Boa noite — murmuro de volta e ela senta-se no outro sofá.

Uma Luz Na EscuridãoOnde histórias criam vida. Descubra agora