Capítulo 22

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  Fiquei dividida entre tomar um banho quente para aliviar a dor no pescoço e nas costas depois de dormir no sofá, ou um banho frio e afastar o calor que sentia mesmo dentro de casa. Deus, de certo, tinha esquecido o mundo dentro da fornalha.
  Arregalei os olhos e comecei a me arrumar, após sair do banheiro e me informar da data. Em quatro dias seria a festa de aniversário da imperatriz. Com o celular em mãos, mandei uma mensagem para o príncipe.
  Ansioso para presentear sua mãe?
  A resposta veio segundos depois e admirei o fato de ele estar acordado de manhã cedo.
  Pensei que tivesse tocado fogo.
  Reviro os olhos ao ler sua mensagem.
  Se você realmente acreditasse nisso já teria entrado em desespero.
  3 meses e você me conhece mais que meu padrasto.
  Você permite.
  Claro. Sei que diferente do Rubens, nunca usaria minhas informações contra mim.
  E ainda assim, Enzo passou no estúdio na véspera da festa para checar se estava tudo sob controle com o álbum e o equipamento.
  Abri a porta com o melhor humor que poderia demonstrar. Esticando braços e pernas como uma estrela, ele se assustou e riu da surpresa.
  — Parece que alguém acordou muito feliz hoje.
  Dou um aceno e subo na mesa de Sabrina, minhas pernas ficam soltas pela altitude da mesa ou por meu ligeiro déficit em altura.
  — Preparado para entregar o álbum mais bonito da vida de Melissa?!
  — Com frio na barriga. E se ela não gostar?
  — Não tem como ela não gostar. Esse presente foi totalmente de coração e é duradouro se bem cuidado.
  — Amanhã quando for pra minha casa, você leva. Não vou me demorar muito aqui, tenho um compromisso hoje.
  — Organizando a festa dela? — eu quis saber.
  — Adoraria... — suspira exasperado. — Vou me encontrar com a Isabel.
  Reconheço o nome imediatamente, pertencia à espanhola. Algo em meu coração se aperta, mas obrigo o rosto a não transparecer.
  — Ela sabe falar português direitinho?
  — Melhor que a maioria dos estrangeiros — confirma com um aceno.
  — Já tiveram alguma conversa? Gostou mais dela ou da Patrícia?
  — A conversa fluiu melhor com ela.
  — Isso é bom, não? Quer dizer, parece mais disposto a ir nesse compromisso do que o anterior.
  — Pareço? — Não. — Acho que a disposição é pra me livrar desse encontro logo.
  Solto um ruído que deveria ser uma risada e balanço a cabeça negando.
  — Até amanhã?
  — Sim, amanhã. — Mas ele não parecia querer ir. — Isabel tomou boa parte da minha agenda nesse período de tempo.
  Pisco. Isso significava que ele sumiria por alguns dias? Eu não quis admitir que aquilo me incomodava.
  — Ela vai pra festa?
  — Provavelmente pro começo. Ela precisa retornar à Espanha. — Enzo remexe como se estivesse se preparando para partir e diz: — É sério, preciso ir. Vejo você amanhã.
  — Tchau — o tom saiu meio triste.
  Dou um aceno que ele devolve enquanto fecha a porta. Suspiro e uso as mãos espalmadas na mesa para impulsionar minha descida. Despenco no sofá e começo a enrolar, fazendo tudo e nada ao mesmo tempo no celular.
  Segundos depois minha assistente abre a porta lançando a bolsa sobre mim. A colisão é forte e solto um resmungo ao passo que ela cobre a boca com as mãos.
  — Desculpa, não te vi — murmura e trata de recuperar o objeto. — Enzo saiu daqui apressado, o que rolou?
  — Tem um compromisso.
  Tento não parecer decepcionada, mas Sabrina é mais rápida.
  — Que tipo de compromisso?
  — Um encontro com a filha da rainha espanhola.
  — Hum...
  — Como assim "hum"? — pergunto, mesmo sabendo a que ela se referia.
  — Não gostou da ideia do príncipe num encontro, tá escondendo algo de mim.
  — É só que... — paro, precisando conter as frustrações. — Enzo nem queria ser forçado a casar com alguém. Fico mal por ele.
  — Entendo. Mas não há nada que possa fazer quanto a isso, a não ser que invada o palácio e ameace matar todos caso não deixem ele escolher a esposa.
  — Até que não é uma má ideia.
  Ela arregala os olhos e abre um sorriso largo de divertimento. Encaramos uma a outra e rimos juntas.
  O desânimo tomou conta do meu corpo pelo resto do dia. Sabrina prometera bater no meu apartamento na manhã seguinte para me ajudar e eu desacreditei, argumentando que como funcionária, uma pequena arrumação no visual era suficiente. Desacreditei e quebrei a cara.
  Resmungo com o toque persistente do interfone. Me enrolo no edredom e calço as pantufas para liberar a entrada. Como eu imaginava, era Sabrina quem perturbava a paz e o sossego logo cedo.
  — Nunca te ensinaram que não se deve atrapalhar o sono de beleza das pessoas?
  — Sempre fui uma aluna rebelde — retruca e dá de ombros. — Posso entrar?
  Assinto e abro um pouco mais a porta para que entre.
  — Pronta pra passar a noite fazendo o que mais gosta?
  — Sim, mas acho que deveria dormir um pouco mais.
  — De jeito nenhum. Quanto mais cedo acordar, mais tempo pra se organizar.
  — Só preciso ir depois do almoço e como disse, vou passar a noite acordada. O equipamento já está guardado. Tudo pronto, menos minha energia.
  — Se entupa de energético ou café, mas pra cama você não volta. — Reviro os olhos e ela aponta para o corredor. — Banho frio. Agora.
  Solto um ruído de irritação e volto ao quarto pisando duro. Depois de bater os dentes sob a água gelada, vesti o mesmo uniforme que usei na primeira festa e saí do quarto.
  — Posso fazer o seu café?
  — Por favor.
  Deito no sofá e devo ter dormido porque Sabrina me cutucou quando trouxe o prato com um sanduíche. Sento e pego o prato de sua mão comendo aos poucos, ela pede licença e liga a televisão.
  Todos os canais falavam sobre a preparação do Palácio para o aniversário da imperatriz ou sobre sua biografia e personalidade. Sabrina aumentou o volume para ouvirmos o que diziam os jornalistas.
  — ...o Palácio sempre divulga fotos oficiais em datas comemorativas e não esperamos o contrário este ano. — Dizia o jovem repórter que estava na área externa do Palácio do Planalto. — A curiosidade maior cerca a decoração da casa, os convidados e trajes. Quem virá e como? Um grande momento para novas tendências serem exibidas. A única informação que temos até o momento é que o conjunto da imperatriz para a noite foi desenhado pela estilista Suzane Alves...
  Sabrina emite um estalo com a língua.
  — Sua madrasta sempre inova nas roupas da imperatriz. Você teve a chance de ver a roupa desse ano?
  — Não. Nem sabia que era Suzane quem ia fazer. Isso me lembrou que meu pai vai aparecer lá.
  Amém.
  — Isso é algo bom ou ruim?
  — Bom, tendo em vista que não terei sua companhia... É ótimo ter um rosto conhecido que não seja o de Enzo ou da família dele.
  Entrego-lhe o prato e vou ao banheiro para escovar os dentes. Ela já tinha aberto sua maleta de maquiagem na mesa de centro quando retornei.
  — Você é rápida.
  — Hoje o tempo é ouro.
  — Sabrina, não precisa disso. — Caminho e fecho a maleta. — Ainda vou almoçar, são quase nove da manhã e eu devia estar aproveitando o sono ao máximo.
  Ela fica em silêncio, pensativa com o dedo indicador no queixo e senta no sofá.
  — Tudo bem, vai dormir. Vou ficar e esperar dar a hora do almoço. Você não vai me fazer perder a viagem.
  Suspiro, dou um aceno começando a tirar as sapatilhas e desabotoar a camisa.
  — Se importa se eu fizer seu almoço?
  — Só não incendeie o apartamento, por favor.
  Ela abre um sorriso esperto que me deu medo.
  — Não vou e a comida ficará tão boa que nem vai parecer que fui eu que fiz.
  Caminho até meu quarto e me jogo na cama apagando novamente.
  Pareceu que eu tinha apenas piscado quando Sabrina me cutucou de novo.
  — Hora de levantar, princesinha.
  — Obrigada.
  Ela sai do quarto e visto o uniforme novamente. Surpreendentemente, o meu prato já estava pronto quando cheguei na sala. Olho desconfiada para as costas da jovem e entro na cozinha disfarçadamente, caminhando até a lixeira.
  Minha teoria foi comprovada quando vi a embalagem da quentinha amassada. Solto uma risada alta para que ouvisse e volto à mesa.
  — Bom easter egg... "nem vai parecer que fui eu que fiz".
  — Pensei que não ia lembrar! Nunca me arriscaria na sua cozinha novinha em folha, sinto muito se te decepcionei.
  — Decepcionou sim. Fiquei esperançosa depois que disse ter feito um bom jantar no Dia das Mães.
  — Isso vai ficar pra outro dia.
  Sento e começo a comer. Sabrina me ajudou na maquiagem depois eu lhe dei carona até o estúdio e lá esperei o carro para me levar ao Palácio.

Princesa da AlvoradaOnde histórias criam vida. Descubra agora