Arquivo 14

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As copas das árvores se dispunham de forma bela, agregando uma sombra confortável para ambos. A grama verde era macia e raios solares tímidos se esgueiravam pelas pequenas brechas proporcionadas por aqueles frondosos galhos. Era a hora mais confortável da tarde, segundo ele. A brisa fresca fazia soar sons na natureza que quase sempre passam imperceptíveis à audição humana; folhas farfalhando nas árvores e assobios leves de ar. Era como um espetáculo que ocorria somente para os dois. Seus braços repousavam em torno de alguém à sua frente, que deitava delicadamente as costas contra seu peito. Um som ainda mais belo se juntou aos outros entrando em harmonia com aquele cenário, uma voz.

- Eu te amo F!

Um sorriso se desenhou em seu rosto. Com a cabeça inclinada, fitava a luz intensa do sol sobre aquelas folhas que balançavam ao vento. Se existia um paraíso realmente, agora estava nele. Antes que sua voz tomasse forma para responder o mesmo, um som ensurdecedor o despertou.

F estava consciente agora. Tudo o que mais desejava era voltar para aquele sonho. Involuntariamente, seu olho esquerdo se entreabriu fitando o despertador verde na cômoda que rugia enfurecido.

Hoje é dia primeiro! Hoje será um grande dia! – Dizia o relógio digital repetidamente

- Grande merda de dia! – Disparou F ao se levantar desligando o despertador.

Antes que pudesse tomar seu curso e seguir até o banheiro, sua atenção foi despertada por um cordão prateado na cômoda ao lado do despertador. Desde quando aquilo esteve ali? Ele não queria perder muito seu tempo tentando lembrar, pois qualquer minuto perdido poderia resultar no seu atraso no trabalho e, sem titubear, o pegou e o colocou no pescoço.

No trabalho, seus afazeres seguiram conforme o cronograma: tedioso e extremamente demorado para o fim de expediente. No decorrer de suas atividades diárias, se sentia extremamente incomodado. Desde a hora de pegar o ônibus até a hora de enviar uma mensagem de texto perguntando sobre o colar prateado que agora estava em seu pescoço. Tudo parecia de certa forma afligi-lo. Ele agora fitava a mesa branca onde havia apenas um telefone, folhas em branco e algumas canetas... Parecia tão vazia e impessoal, como se não fosse sua mesa. Como que surpreendido em meio aos seus devaneios, uma moça robusta adentrou seu cubículo e o chamou.

- F, certo? – Ela perguntou ajustando a posição dos óculos de grau. F acenou de forma positiva confirmando e ela prosseguiu. – Deixaram um bilhete para você lá na portaria, um rapaz.

Confuso, F apenas sorriu e agradeceu o gesto da colega de trabalho. Pegou o bilhete se perguntando quem nos dias de hoje escrevia mensagens em papel em vez de enviar mensagens pela internet.

“Me encontre às 19 horas na Casa dos Doces Borboleta”.

F riu com a menção ao nome de uma doceria que remontava seus tempos de infância, mas que após declarar falência havia dado lugar a uma lanchonete local. Apenas duas pessoas no mundo todo chamavam aquele lugar pelo nome antigo: seus amigos V e G. Pegando o celular, F começou a procurar o número de G, o rapaz que havia entregado a carta.

...

...

- Oi F! Não está trabalhando?

- Estou! Para que tanto suspense cara?

- Que? – G ria do outro lado da ligação. Ele sempre foi muito brincalhão, não o surpreendia nem um pouco a brincadeira de cartas e códigos, mas certamente sabia que para ter feito isso era porque precisava conversar algo importante.

- Olha só, 19 horas em ponto na lanchonete hoje, não demore, vou ter que voltar ao trabalho aqui. Nos falamos de noite.

- Bem, tudo bem!

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