O som da chuva forte e insistente que se chocava contra o chão se assemelhava ao som de aplausos. O céu antes cinza e monótono exibia o presságio de um temporal com suas nuvens negras que se fechavam como uma grossa cortina, que vez ou outra explodiam em estrondos de trovões. Se esgueirando entre as ruelas, dois jovens corriam ensopados pela chuva em meio aquele temporal, com a visão afetada pelo dilúvio. F, agora com o celular colado ao ouvido, tentava sem êxito ligar para I na esperança de que a garota o atendesse... “Por favor Deus, ela não!”. A garota loira, que tinha dificuldade de alcançar o ritmo de corrida do rapaz à sua frente, permanecia confusa sem saber para onde estavam indo, mas em seu interior sentia que algo muito ruim estava para acontecer. A expressão de F a havia assustado no momento em que leu as mensagens recebidas. Ela era extremamente detalhista e até o momento podia lembrar exatamente a forma com que os olhos amendoados de F haviam se estreitado, fazendo com que linhas de expressão se formassem em sua testa demonstrando aflição, enquanto sua boca fina e pálida se entreabriu arfando. Ele pareceu dizer algo que foi abafado pelo som da chuva que os havia surpreendido naquele momento. R esticou seu braço tentando confortá-lo de qualquer que fosse seu temor... Ela mais do que ninguém conhecia aquela expressão, a expressão de medo, mais precisamente o medo de perder alguém. Seus olhos tentavam se manter abertos, apesar dos esforços da chuva em fechá-los, para ver as costas largas do rapaz que corria desesperado tropeçando e esbarrando em tudo que estivesse em sua frente.
- Para onde estamos indo? – Ela perguntou em vão e percebeu que nada iria fazê-lo parar de seguir direto ao seu destino.
Sangue pingava da perna de I, que mancava e seguia até a sala 7 deixando um rastro vermelho que demarcaria sua localização... ela sabia. Hoje é dia 4! – pensava enquanto já na sala escrevia rapidamente algo em uma folha de papel, sentia o que estava para acontecer... Não só sentia como sabia. Ao fim da escrita, a garota correu até a bolsa de M onde colocou o papel rapidamente antes que fosse notada... Correndo até a janela, vislumbrou o pátio da escola. De lá, ela conseguia ver o garoto indígena no pátio da escola de costas enquanto olhava para seu amigo que olhava para algo atrás de M. Seguindo sua visão o mais rápido que pôde, ela alcançou o que tanto parecia afligir o amigo de M. I, que antes segurava sua perna que sangrava, agora levava a mão até a boca sufocando um grito... Atrás de si, escutou o leve som do rangido da porta de madeira se abrindo lentamente. Ela fechou os olhos por um segundo e se virando encarou a figura à sua frente...
- Isso tem que acontecer, não é mesmo? – perguntou chorando indo em direção àquela voz. Ela tinha medo, mas não havia fuga, não havia outra opção, não haveria mais balanços. Fechou os olhos lembrando dos risos trocados com o amigo ao se balançarem, da forma com que saltava rindo pela avenida ao seu lado, enquanto ele sempre parecia disperso, mas divertido. Um pequeno sorriso final se desenhou em seu rosto em meio a lágrimas e sangue. – Me desculpe F, não haverá balanços hoje...
Seu sussurro saiu como para si mesma. A tempestade lá fora iria passar em algum momento, a dor iria se calar, o medo se extinguiria e todas as dúvidas seriam respondidas. O 7 metalizado na porta continuaria ali, os balanços também. Era apenas a deriva de um momento que se esvaía depressa em grãos tão minúsculos quanto átomos. Um grito ecoou pelos corredores, o alarme de fim de intervalo tocava. Alunos e professores desesperados corriam pelas escadas, M espantado era despertado, o 7 metalizado permanecia ali fixado à porta... somente ele sabia exatamente o que ocorreu ali. Uma enorme poça de sangue banhava o chão... Sobre ele, o corpo de uma pobre menina que teve um fim terrível. Pessoas choravam, a professora ligava para a ambulância, apesar de todos verem que nada mais podia ser feito ali. Gritos de pavor de outros alunos ecoavam em meio àquela cena. F, que estava do lado de fora em frente à escola, via viaturas policiais e uma grande movimentação ali. Ele e sua amiga tentavam se aproximar, mas uma barricada impedia a passagem de ambos. Uma maca passava carregando um corpo sobre um enorme plástico preto. Por debaixo dele, só podiam ser vistos madeixas ruivas, o tom alaranjado banhado em sangue. F gritou como uma fera enjaulada, seu corpo cedeu o derrubando no chão. “Por que ela? Por quê?”. R, ao seu lado, o envolvia em um abraço ali mesmo no chão. O mundo parecia desabar sobre eles em formato de chuva... e ia continuar assim. Aquela tempestade não passaria tão cedo, só havia começado.
A chuva havia passado. Após saírem da entrada da escola, F ainda abalado a levou até a sua casa. Ele insistia que tinha algo importante para dizer para ela. R penteava as madeixas loiras que ainda permaneciam úmidas, sentada sobre o confortável sofá da sala de estar da casa do seu amigo. A mãe do rapaz havia emprestado um vestidinho azul que lhe descia até um pouco acima dos tornozelos enquanto sua roupa secava. À sua frente, ela o via com os olhos vermelhos de tanto chorar e a cabeça inclinada para o lado direto revelando duas pequenas argolas prateadas na orelha direita. Após verificar que sua mãe estava fora do campo de visão, ele se inclinou para frente olhando diretamente para R.
- Preciso que saiba de algo. – A garota o olhou preocupada. – Está correndo perigo, não sei o que é, ou quem é... Mas esse ‘algo’ parece me observar e saber de tudo que acontece. A I não sabia de nada, só era uma amiga importante e mesmo assim foi envolvida nisso. Você sabe bem mais, e não só isso, também se sente observada. Quero que saiba que somos nós dois contra o mundo agora.
R não podia negar como estava assustada, mas sacudiu a cabeça concordando com ele. Ela precisava saber o que estava acontecendo e estava disposta a enfrentar as consequências...
Será?
Finalmente esse capítulo saiu!!! De antemão peço minhas mais sinceras desculpas. Esse mês foi um pouco conturbado. Mas já asseguro que irei disponibilizar capítulos em massa para compensar. Obrigado por ainda estarem aqui comigo galera, sou muito grato 😍😍😍 Em partes demorei porque estava uma música para esse capítulo, mas infelizmente ainda não terminei de gravar, logo logo ela estará aqui disponível. Gente e essa arte maravilhosa da JayEyBee ? Estou apaixonado até agora, muito lindaaaa 😍😍😍
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Na obra original a I não existia, foi um personagem criado a partir da revisão para o wattpad e fui muito feliz em tê-la entre os personagens, ela deu um toque só dela no enredo. Durante o processo de escrita desse capítulo uma amiga muito importante para mim faleceu e dedico inteiramente esse capítulo a ela que sempre esteve me apoiando e acreditando em todos os projetos que me empenhei. Parte dela sempre estará no coração de todos que ela tocou.