Arquivo 29

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Ali parada, sobre o céu estrelado, sentindo a grama úmida sobre seus joelhos, R havia fechado os olhos. Nada mais lá fora acontecia para ela, só sentia as lufadas de ar gélidas que lhe acariciavam o rosto, e o aperto de mão quente de F sobre a sua.

Ela começou a relembrar sua infância. De sua família unida, das brincadeiras de Natal e então... Da morte misteriosa...

Toda sua família um dia havia sido morta. E dias antes era como se R soubesse que havia algo errado, ela sentia que tinha algo errado, se sentia desconfortável. Um dia foi sobressaltada enquanto dormia ao ouvir sons que pareciam distantes, andando pelos longos corredores da casa o som das vozes se tornaram mais nítidos. Seus pais discutiam algo e sua mãe parecia completamente assustada.

- Eu não sei o que fazer! - dizia sua mãe com gestos excessivos. - Não quero envolver as crianças nisso. Mas se essa mensagem for real todos nós iremos morrer amanhã a noite nessa casa! Vamos viajar, vamos para algum outro lugar que não seja aqui.

- Amor isso é criança pregando peça, mandando trotes. Nossa casa é segura. Temos seguranças e babás para as crianças. Nossa casa tem sistema de alarme e as portas tem tranças resistentes, fique tranquila.

R havia escutada e visto tudo pela fresta aberta da porta e agora se retirava de lá. Ela não conseguia entender o medo que a mãe sentia, ela estava agindo diferente nos últimos dias, mas pelo que parecia ela dizia que morreriam no próximo dia... À noite.

O dia se passou rápido, e R jurou que naquele dia correndo pelos corredores ouviu os empregados cochichando.

- É hoje a noite...

Todos os funcionários da residência pareciam a observar com um sorriso malicioso... Um olhar falso de amor que escondia um profundo ódio. Mas na época R não conseguia entender o que se passava. Durante o dia, ao ir procurar sua irmã se deparou com os soluços dela enquanto chorava. Seu pai estava diante de sua irmã, com as mãos em seus ombros tentando acalmá-la.

- Tem alguma coisa acontecendo, isso não é normal! - Ela dizia apontando para as manchas de pegada no teto, R arregalou os olhos assustada.

Pegadas? Todos percebiam algo estranho na casa... Até R. Mas ela era a única que não contava nada a ninguém. Ela percebia que seu pai era constantemente bombardeado de preocupações e se sentia pressionado demais. Ela não queria preocupá-lo mais. Porém a noite R não conseguia dormir...

... Todas as noites quando ia dormir o empregado da casa adentrava seu quarto e a violentava. Ela chorava... Mas chorava em silêncio. Em seu pensamento dizia.

Isso dói.

Eu não quero ter que passar por isso...

...papai eu não quero preocupar você, mas tenho medo...

Depois que o rapaz saía finalmente de seu quarto e voltava para seus aposentos R se agarrava ao travesseiro e chorava. Ela não ligava para pegadas no teto, não ligava para os chiliques de sua mãe. Elas reclamavam mas ninguém sabia o que ela era obrigada a passar em silêncio. A única coisa que a acalmava era olhar para o olho negro que via por uma pequena rachadura na parede. Ela agora conseguia o ver... Ele estava ali todas as noites para acalmá-la. Ela não sabia quem estava do outro lado. Mas naquele tempo ela não tinha a percepção do realmente estava acontecendo...

... Todas as noites ela era observada.

No dia seguinte sua família havia saído para um passeio a deixando para trás... Como sempre faziam. Mas não o pai dela! O pai dela nunca a deixava para trás. R entendia que ele deveria fazer as vontades da esposa e acalmar sua filha mais velha. R se escondeu no sótão e colocou uma caixa pesada na entrada. Ela não queria que o empregado da casa a achasse, ela estava sozinha... Com muito medo, no escuro do sótão. Ficou lá por horas e apesar de escutar gritos lá embaixo ela não desceu, sabia que podia ser os funcionários a sua procura. Após mais um tempo R havia adormecido, despertando horas mais tarde com os gritos de seu pai, já devia ser noite, deveriam já ter chegado do passeio. R desceu empolgada para se lançar contra seus braços num salto o dizendo que o amava, como sempre fazia. Ela começou a descer os degraus até o hall da casa e viu...

... Sua família toda morta no carpete vermelho do hall... E seu pai caído sangrando em um degrau próximo a ela. Ele a olhou, e apesar da dor que parecia sentir, sorriu para ela.

Seu pai havia se esforçado em subir se arrastando pela escadaria só para ver se ela estava bem... Só queria isso para poder...

...morrer...

Ela via o sangue deslizando pelo hall inteiro, R olhou atentamente e viu a figura de pé no centro do salão, apenas os olhos negros eram visíveis por debaixo de tanto sangue, os olhos negros que a observavam toda a noite. Ela não se lembrava o que aconteceu depois. Mais tarde policiais haviam aparecido e retirado de lá. Detetives tiraram conclusões falsas para não ter de investigar mais a fundo o caso. Diziam que R tinha sinais de estupro e provavelmente o pai, a quem ela amava tanto, fazia isso com ela. E que após voltar de um passeio de família um ladrão invadiu a casa e matou todos.

Mas isso não era verdade, R sabia que
não, sabia que todos os funcionários da casa haviam armado para matar sua família e que algo fora do normal observava a família e os ameaçava. E certamente quem a estuprava não era o pai...

- Não era meu pai... - dizia R chorando em soluços que entrecortavam sua fala. Os especialistas achavam que ela protegia muito o pai e inventava que não era ele, diziam que estava muito abalada e aos poucos, após depoimentos incomuns da garota ela foi levada a uma clínica psiquiátrica.

Segundo eles, R, não dizia coisas que fizessem sentido. Repetia sempre as mesmas palavras seguidas uma atrás da outra, parecia ter um distúrbio da realidade. Falava que não era culpa de seu pai, que o monstro havia matado todos, o monstro das pegadas no teto, o monstro de olhos negros...

Nenhuma evidência de pegadas no teto foram encontradas na casa.

Após um tempo nenhuma clínica soube mais o que fazer com ela. A garota na juventude já não aceitava nenhum diagnóstico e nenhuma medicação, havia se tornado agressiva e já não interagia com ninguém. Aos quinze anos foi mandada para um lugar onde haviam outros adolescentes com distúrbios mentais. Aquele não era o lugar de R... Por que ninguém entendia ela? Ela só estava abalada... Ela só precisava que alguém escutasse ela.

Um dia ela iria provar tudo a todos. E assim adquiriu um desejo, queria ser detetive. Ela queria fazer o que não conseguiram fazer por ela...

... justiça.

O que na verdade era a morte?

O que depois daquela vida finita confiada a eles?

Uma vida trágica.

R apertou a mão de F, agora ela sabia responder a pergunta que havia feito a si própria.

- A morte é a liberdade! Vou com você papai...

E então tudo aconteceu... O som forte que veio em seguida já não era perturbador... A morte não era mais temida... Eles estavam juntos... E não passariam por mais nada daquilo.

Nunca mais.











































Gente e essas memórias da R hein 😣😭? Espero que estejam curtindo muitoooooooo, o que será que vem agora galera? Eu sei que estou megaaaaa ansioso para que vocês leiam tudo logo. Estamos quaaaase na reta final hein. Beijoooooes e não esqueçam de curtir e comentar bastante 🥰🥰🥰🥰

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