Epílogo

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Estava em pé ao lado do heliporto enquanto via o helicóptero pousar. Dele desceu minha esposa. Sim, mesmo depois de cinco anos casado com ela, eu ainda me sentia orgulhoso ao dizer "minha esposa".

Ela estava elegante, cabelo preso para o alto, óculos escuros, seguida de vários assessores que agora faziam parte da sua rotina de grande Engenheira. Ela aproveitou os dias que passaríamos na Ilha da Madeira para discutir trabalho, como sempre. Mas não a condenava, eu admirava o fato de ser viciada em trabalho. Ela caminhou até minha direção, seguida de sua equipe, com aquela mistura de elegância aprendida ao longo do tempo e passos decididos.

Por fora estava muito diferente da mulher que conheci, com botas, jeans surrados, parecendo um trabalhador da Construção. Mas a fama e as novas obrigações a obrigaram a tornar-se uma executiva, e aos poucos ela foi se enquadrando no perfil. Tínhamos combinado no Pestana, pois a equipe dela ficaria lá, em uma logística para otimizar seu tempo.

- Saudade de você, Campeão!

Ela me beijou intensamente, e naquele momento, como em todos os outros que ela me beija, tenho certeza das escolhas que eu fiz. Ela mudou muito por fora, ficou mais refinada, mas por dentro, quando estava em casa, entre a família, ainda era a Maria por quem me apaixonei, aquela que trouxe a simplicidade para a minha vida, e eu ainda me impressionava em como ela conseguia balancear aquilo. Mas ela conseguia, de uma forma maravilhosa.

***

Eu e Cristian chegamos de mãos dadas a casa da matriarca da família Aveiro na Ilha da Madeira, hoje íamos fazer um jantar para comemorar os 10 anos de casamento em família, com todo o clã ao redor da mesa. No caminho soltei meu cabelo e deixei de lado o visual executiva, para me tornar a mãe do meu clã Aveiro.

Que ao descer do carro correram em minha direção. Sendo seguidos de perto pelo mais velho, que já era um pré-adolescente, com todas as mudanças hormonais do mundo e inseguranças. Mas estávamos lidando bem.

- Mama. – Ele beijou a lateral do meu rosto.

- Parabéns, seu pai já me contou. Parabéns pela nova categoria, filho. Mas lembre-se do que me prometeu.

- Sim, mama. Não deixarei os estudos de lado. – Falou ele com aquele enfado da idade.

- Isso mesmo.

Beijei o rosto dele e em seguida deu atenção para as minhas três crianças, conferidos todos eles. Os gêmeos e Valentina, que viviam grudados para cima e para baixo devido a pouca diferença de idade. Na verdade a mais nova, seguiu o que esperávamos, ela podia ser presa por formação de quadrilha, ela era quase a líder dos outros dois, dominava a casa e nos deixava loucos. Como falava o Cabeça: "Doutora, essa menina não é a pele do cão, ela é o bicho ruim inteiro. Onde tira a pilha dessa criatura!".

- Amor, vou levá-los para lavar as mãos. A comida já deve estar à mesa, quando sai, já estavam a arruma-la.

Dei um selinho no meu marido, e subi a escada que dava acesso ao jardim. Lembrando a primeira vez que subi aquelas escadarias, cheia de inseguranças e medos. Hoje eu tinha apenas certezas de que cada escolha foi a correta. No topo da escada surgiu a figura maternal da Dona Dolores, com os braços abertos para me receber e eu afundei neles.

- Minha filha, deves estar cansada. Estais tão magrinha! Não podes trabalhar tanto assim! Ainda bem que agora Ronaldo tem tempo de cuidar dos miúdos, pois não ias aguentar deste jeito!

- Mama, não se preocupe, prometo que deixarei as coisas mais leves.

- Precisas mesmo, a Tininha precisa da mãe, a cada dia que passa aquela miúda está mais impossível. – Enquanto conversávamos, caminhamos até o banco onde sempre nos sentávamos para ver o mar e trocar conselhos. - Já disse ao pai para colocar ela em alguma atividade para queimar energia.

- Ela quer fazer futebol como irmão. Eu não disse para a Senhora que ela ia acabar seguindo os passos do Pai e do Junior. Eu sou voto vencido. Enquanto Eva e Mateo amam a natação, ela gosta de brincar com o Junior de bola.

- Pode ser uma boa escolha.

- Eu andei conversando com uma treinadora a Linda Naváez, ela já treinou vários times tantos Masculinos, como Femininos, e ela disse que essa é a hora da Tininha ir para a Escolhinha, assim ela aprende disciplina também, para quando chegar aos profissionais, não dar trabalho para o técnico, como a Linda vive tendo com os jogadores dela.

- Muito bom! Agora fico mais tranquila! Ronaldo deve estar sorrindo para as paredes como um parvo!

- Conheces muito bem o teu miúdo!

- Estão a falar mal de mim?

Meu marido se aproximou sorrindo, trocando de lugar comigo, sentando no banco e me colocando no colo dele.

- Estávamos a falar do teu orgulho com a Tininha indo para a Escolhinha. – Falou a minha sogra com um sorriso maternal.

- Ela tem muito potencial, só tenho pena das outras crianças, pois a miúda é bruta como a mãe.

- Cris! – Dei um tapinha no ombro dele e todos começamos a rir.

De repente um silêncio se instalou, dona Dolores olhou para mim com um sorriso.

- A 6 anos atrás, entraste em minha casa sem saber o que fazer da tua vida. Mas eu sabia que você poderia tornar meu filho feliz. Agradeço todos os dias a iluminação que tive ao fazer-te aquele convite. Agora sei que o Ronaldo está bem. Antes eu pensava como ele ficaria quando se aposentasse, por que o trabalho era tudo para ele. Mas mostraste para ele que tinha algo mais que o trabalho.

Cristiano me deu um beijo no rosto e sussurrou no meu ouvido

- Obrigada.

- Eu que agradeço a vocês, eu entrei por aquela porta sozinha, sem família, sem ninguém por mim. E naquele dia, eu sai com uma família para me proteger. Eu ganhei não só o amor de um homem bom, mas todas as formas de amor em um único pacote.

Dolores sorriu, deu umas palmadinhas na minha perna e então disse.

- Vou chamar todos, vamos comer! Aqui é uma casa portuguesa, com certeza!

Enquanto o sol ia embora, nos longos dias de verão, pois já era quase 9 da noite, todos nós estávamos em volta da mesa, comendo e bebendo a vida, compartilhando histórias fruto do laço forjado ao longo dos anos. Jorjão fazia piadas com o Cristiano, Ricky apenas piorava a situação colocando lenha na fogueira, e todos nós riamos. Katia por sua vez contava algumas histórias que sabia que iam me deixar vermelha, assim como a Paula minha irmã da vida. Elma por sua vez tentava me defender e eu agradecia. Hugo apenas ria, e tentava intermediar com sua doçura a conversa, e Alicia fazia questão de registrar tudo para posteridade.

Nunca imaginei que a conversa naquela mesma varanda, abriria as portas de toda uma vida para mim, de toda uma família, por que eu havia deixado a minha para trás. Fui adotada por eles, no momento que cruzei aquelas portas, subi aquela escada, fui abraçada pela Dolores, minha vida começou de novo.

Até ali eu apenas tentava resistir e me adaptar ao mundo dos homens, a regra deles, a ser dura e forte para resistir sozinha a tudo. Mas depois de fazer parte daquela família, aos poucos fui aprendendo que podia compartilhar minhas fraquezas, que alguém sempre estaria lá para me ajudar e dar força, principalmente meu marido.

O Cristiano me ensinou a ver muito mais além das aparências, a tentar entender e conhecer as pessoas de verdade, que elas podem ter muito mais a contar do que os outros deixam ela mostrar, e com ele aprendi uma regra nova do mundo dos homens: Que aquela face que você demonstra nos gramados, no trabalho, na imprensa, não é a mesma da família, daqueles que você ama. Que você deve saber conviver com essas duas pessoas, aquela que você é para as outras pessoas, e aquela que você é para aqueles que ama. Não é obrigado a ser apenas uma, e com o tempo aprende a tempera-las.

Agora olho para essa mesa e me sinto acolhida, me sinto em casa. Afundo nos braços do meu marido, do meu amor, meu porto seguro, aquele para quem mostrei uma simplicidade que ele havia perdido e não sabia. Em troca ele me deu a segurança que eu havia perdido e não sabia.

Hoje tenho uma família, a minha família. E lar é onde seu coração está e eu não preciso mais fugir.

FIM

It's a man's world || CR7Onde histórias criam vida. Descubra agora