Capítulo um

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Hipnose

Porto, 2008

O vento estava gritando, cantando uma melodia esfolada que repelia a plateia. A neve caía como lágrimas de um monstro abominável. De longe, era possível ver uma construção não tão rígida em forma de casa apanhando da ventania.

— Eu ainda te amo — ela disse, com vento frio saindo de sua boca.

— Não é verdade, eu era apenas uma paixão de verão e você sabe disso — vociferei em contrapartida.

Caminhávamos lentamente pelo chão enterrado em branco. Ela calou-se por um momento, mas eu sabia que ainda havia algo entalado em sua garganta.

Luna parou de repente, e se manteve ereta enquanto o frio arranhava seu rosto.

— É mais complicado do que você pensa — ela soprou aos ventos.

Me aproximei dela, não poderia deixá-la ali sozinha, então segurei a sua mão enluvada e a chamei.

— Vamos, não podemos ficar neste frio.

— Você sabe que eu realmente gosto de você.

Seus olhos me encaravam, aqueles lindos olhos verdes cor de mel com as bordas azuladas, e Luna segurou minha outra mão, fazendo assim, eu ficar de frente para ela.

— Não era só um sentimento de verão, não quero que pense isso. Jamais, ok?

Seus olhos denunciavam sua intenção. Ela não havia percorrido todo aquele caminho só para termos uma conversa entre amigas, não, ela queria me reconquistar, e eu sabia disso.

Mas eu não queria cair no mesmo papo de sempre, apesar de que era difícil recusar algo daquela garota. Mesmo com o casaco longo tampando praticamente todo o seu corpo, eu sabia a escultura que se escondia ali, seu tom de pele castanha-de-caju torrada e seu corpo definido complementavam a beleza de seu rosto delicado.

Ainda assim, o que mais me chamava a atenção nela eram seus olhos, aquela explosão de cores era como um imã, e como ferro, obedeci ao chamado para proximidade. Eu estava prestes a dizer que não, que ela não gostava de mim porra nenhuma e que o que tivemos não passava de um sentimento passageiro, mas nem eu acreditava nisso. E antes que eu pudesse abrir a boca para falar qualquer coisa, meus lábios encostaram nos dela.

Por conta própria, devo acrescentar.

Por um momento, esqueci do frio que nos incomodava, um calor intenso invadiu meu corpo no primeiro toque de nossos lábios gelados. A sensação era de estar fazendo algo certo e errado ao mesmo tempo. No fundo, eu sabia que havia cometido um erro terrível ao beijá-la.

Mas era muito difícil conter o desejo e muito fácil ignorar a razão. Com Luna tudo era sempre muito complicado, muito intenso, muito...

Dessa vez não pude sentir seu cheiro, pois o mesmo estava sendo repelido pelos ares, mas sua língua. Ah, sua língua...

Seria clichê demais dizer que era doce como mel, não é mesmo? Pois bem, era doce como brigadeiro numa tarde de natal, então.

O seu calor combinava com o meu, e talvez por isso tenhamos ficado tempo demais expostas na ventania gélida. Só interrompemos o beijo quando flocos de neve cortaram levemente nossa pele.

— Acho melhor a gente entrar... — sussurrei enquanto encarava seu rosto de perto, ela ainda segurava minhas mãos.

— Também acho — ela sussurrou com um sorriso no rosto, havia vencido, cedi mais uma vez.

Assim que entramos na minha casa, uma residência simples com paredes de pedras antigas e decoração brega, tiramos nossas jaquetas de frio e ficamos só de casaco. Acendi a pequena lareira que tinha no canto da sala e ela se sentou pacientemente em uma das cadeiras que haviam ao redor da mesa redonda de madeira, enquanto eu preparava um café na cozinha ao lado. Os móveis eram bem antigos, mas confortáveis, tinham um ar de geração anterior, e eram.

A Maldição de LunaOnde histórias criam vida. Descubra agora