capítulo 1

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Verônica Sandler
Hoje faz uma semana que Adrian e eu nos separamos.
Desde que saiu do meu apartamento, não voltou a me procurar. Acho que ele realmente
desistiu de mim.
Fiquei trancada em casa todos esses dias, procurando uma forma de resolver minha vida.
Eu precisava de cinquenta mil reais – o valor que Charles depositou na conta da clínica – até
o final do mês. Só não fazia ideia de como fazer para conseguir essa grana sem ter que voltar a
fazer o que eu mais detestava: vender meu corpo.
Charles vinha me ligando insistentemente. A cada dia, se tornava mais agressivo em suas
palavras. Eu já estava começando a ficar realmente com medo dele.
No desespero, cheguei até a pedir dinheiro emprestado para a Sônia, mas ela entrava num
poço sem fim. Estava perdida para as drogas. Eu estava literalmente sozinha. Sem contar a
mensalidade da clínica, para quem não tinha nem dez reais para comprar o almoço, era
realmente desesperador.
Tinha apenas duas escolhas: voltar para a minha vida medíocre de antes e tudo voltar ao
normal ou procurar um trabalho digno e me sujeitar a ganhar uma miséria. A segunda opção
não seria tão ruim, se não tivesse uma mãe acamada num hospital. E, a primeira opção, no meu
caso, era a mais correta para poder continuar o tratamento dela. Porém, não sei se conseguiria
depois de tudo. Depois de Adrian. Não sei se suportaria as mãos de outro homem em mim. Se
já era difícil antes, certamente seria impossível agora.
Estava entre a cruz e a espada. Voltar a me prostituir para salvar a vida da minha mãe ou
viver uma vida normal, como uma garota normal. Mas se escolhesse viver uma vida normal,
teria que tirar minha mãe do hospital, vê-la piorar a cada dia e viver com o remorso de que eu
poderia ter feito algo para salvá-la.
Estava certa de que se voltasse a minha antiga vida, minhas chances com Adrian acabariam
no mesmo momento. Ele iria me odiar e não sei como eu lidaria com isso. Eu o amo. Eu
sempre irei amá-lo.
Estou aqui, sentada em meu sofá em meio à escuridão, pensando o porquê de ter que passar
por tudo isso. Eu nunca me senti tão sozinha quanto agora. Eu só quero ficar aqui, chorar e
tentar achar uma luz, um caminho para sair desse poço de autopiedade. Para falar a verdade,
só queria que ele estivesse aqui. Que ele tivesse acreditado em mim.
O telefone toca.
Levanto-me do sofá contra a vontade. Descalça, apenas de pijama, pego meu celular e vejo
o número no visor. É da clínica.
Meu coração gela.
— Alô – digo rapidamente.
— Srta. Sandler? Aqui é o Dr. Carlos, tudo bem?
— Aconteceu alguma coisa? – pergunto sentindo uma sensação estranha.
— Pode vir até a clínica? Precisamos conversar sobre sua mãe – ele diz com cautela.
— Aconteceu alguma coisa? Por favor, não me esconda nada –preencho o ambiente com os
sons de meus soluços desesperados.
— Srta. Sandler, ela está com pneumonia, precisamos conversar sobre alguns
procedimentos necessários – ele diz e respiro fundo tentando me acalmar.
— Já estou a caminho – digo e desligo.
Coloco um Jeans, uma blusa e sapatilhas. Solto o cabelo e nem me dou o trabalho de passar
uma maquiagem para esconder minhas olheiras. Estou horrível. Dias sem dormir e sem comer
direito.
Pego minha bolsa e as chaves do carro. Meu carro. Só de imaginar que daqui a alguns dias
não o terei mais, fico angustiada. Mas eu precisava me livrar dele para levantar uma boa
quantia. Era um mal necessário.
Dirigi aflita até a clínica.
Quando cheguei, encaminhei-me direto para sala do Dr. Carlos.
— Dr. Carlos?
O homem que estava de costas para mim, virou-se rapidamente.
— Srta. Sandler? Chegou rápido – ele sorriu.
— É – relaxei. — Acho que devo ter sido multada em alguns faróis pelo caminho – falei.
— Sente-se, por favor – disse apontando para a cadeira em frente sua mesa enorme de
madeira.
— Me conte tudo doutor. Não me esconda nada, por favor.
Ele me olhou de um jeito sério e compreendi que o assunto era muito delicado.
— Sua mãe piorou. Ela está com pneumonia e ocorreu derrame pleural em ambos os
pulmões, precisamos drenar com urgência.
— E isso é muito sério? Ela vai sobreviver, não vai? Por favor, doutor. Só me diz que sim.
Ela é tudo que eu tenho – minha voz saiu como um sussurro numa súplica dolorosa. Meus
olhos encheram-se de lágrimas.
— O estado dela é grave. Está na Unidade de Terapia Intensiva, mas tem chances de
recuperação. Vamos ver como ela reage à cirurgia – ele diz.
— Isso vai encarecer o tratamento dela? – pergunto com desespero.
— Sim. O tratamento habitual de sua mãe é para Alzheimer. Não está incluso as despesas
extras, como UTI e o tratamento da pneumonia. Isso gera despesas extras.
— Sim. Entendo.
— Vou pedir para você passar no administrativo para rever os custos, acrescentando a
cirurgia e a internação na UTI.
— Certo.
— O tratamento dela irá encarecer. Não sei se tem recursos para mantê-la em nossa clínica.
E, se não tiver, sugiro que a transfira para um hospital público. Precisamos de sua decisão
imediatamente. – ele disse como se fosse à coisa mais simples do mundo me deixando
extremamente irritada.
— Ela irá morrer se for parar em um hospital público – disse com as lágrimas rolando pelo
rosto. — Sabe como funciona. Eles não dão à mínima.
— Infelizmente, não posso manter a paciente se não tiver recursos, Srta. Sandler.
Meu Deus! O que eu faço agora?
— Quanto passaria a ser o tratamento?
— Estes dados só o setor administrativo poderá informar ao certo. Mas sairá em torno de
uns cinco mil, o procedimento cirúrgico e mais mil reais para cada dia na UTI.
Puta que pariu. É uma fortuna.
— Eu a manterei aqui – disse com firmeza.
— Você tem certeza? – ele pergunta me olhando de forma indecifrável.
— Prefiro pagar o preço a vê-la morrer como um cão sarnento num corredor de um hospital
público – disse ríspida.
— Então, estamos conversados. Faremos de tudo para que ela melhore. Passe na
administração para assinar o novo contrato. Entraremos em contato após a cirurgia – disse.
Apenas assenti com a cabeça quando ele passou por mim e saiu da sala deixando-me sozinha.
Caí num choro intenso. Eu não tinha outra escapatória. Não a deixaria morrer sabendo que
poderia salvá-la. Eu entrei nessa por ela e, continuaria por ela. Por mais que me doesse, que
arruinasse minha vida, eu precisava mantê-la viva. Ela era minha única família. Não tinha
mais ninguém.
Fui até a UTI para vê-la. Não podia entrar. Apenas a vi através do enorme vidro. Tão
frágil. Tubos de oxigênio e aparelhos em sua volta. A dor que sentia era imensa. Eu só queria
ter uma vida normal com minha mãe. Não acho que estou pedindo demais.
— Eu farei tudo por você, mãe. Eu te amo – sussurrei fracamente com a mão espalmada no
vidro. Minha visão embaçada pelas lágrimas e um nó na garganta por saber que o que eu faria
daqui para frente, acabaria com minhas chances com o único homem que amei e ainda amo. Eu
perderia Adrian para sempre.
Para sempre.
***
Já se passam das cinco da tarde. Ainda de pijama, sentada no mesmo lugar desde quando
acordei – no sofá. Recebi a ligação da clínica, minha mãe já havia sido operada e estava
estável.
Olho para a caderneta em minhas mãos. Vejo a lista de clientes e seus números de
telefones. Já passei por todos os nomes, desde A até Z. Nenhum deles me fez sentir vontade de
seguir em frente. Olhava, olhava, só olhava. Ainda não sabia para quem ligar primeiro. O
nome de Adrian como o primeiro da lista, não estava me ajudando muito. Toda vez que olhava
para seu nome ali, lembrava-me dos momentos que passamos juntos. Eu o conhecia à apenas
vinte dias e sentia como se fosse uma eternidade.
Peguei meu celular, coloquei no modo restrito e respirei. Tinha que fazer isso. Eu precisa
apenas ouvir sua voz. Nem que fosse por alguns instantes. A falta dele estava me
enlouquecendo.
Disquei para Adrian. Dois toques e ele atende com sua voz rouca e imponente.
— Adrian... – ele disse.
Houve alguns segundos de silêncio. Conseguia ouvir sua respiração do outro lado. Fechei
os olhos e uma lágrima solitária caiu teimosamente.
— Alô? – disse novamente.
Outro suspiro dele. Queria apenas dizer que o amava. Que me perdoasse por ter sido tão
fraca e não ter enfrentado Alana e sua mãe. De tê-lo deixado. De ter mentido.
— Verônica? – ele sussurrou. — É você?
O meu nome saindo de sua boca como um sussurro, me quebrou inteira. Desliguei no
mesmo momento.
Eu apenas chorava silenciosamente. A dor que sentia no peito era tão intensa que achava que poderia morrer se ela não passasse. Só queria entender por que eu não poderia ter uma
vida feliz como todas as outras pessoas. Estou sozinha. Sempre estive. E agora que conheci o
amor, não posso estar com ele.
Reuni toda a minha coragem e sequei minhas lágrimas.
Não estava ajudando eu me sentir para baixo. Precisava esquecê-lo. Precisava colocar
minha mãe acima de qualquer coisa em minha vida, até mesmo da minha felicidade.
Levantei-me, entrei no quarto e arrumei minhas roupas. Tinha que conseguir dinheiro.
Dinheiro rápido. E a única forma era voltar a ser quem eu era antes de conhecê-lo. Fazia isso
muito bem. E voltaria a fazer.
Entrei no banho. Quando terminei, me vesti. Meia calça preta, cinta-liga... Precisava voltar
ao trabalho. Um vestido preto extremamente justo que valorizava minhas curvas, algumas joias
e uma maquiagem bem feita. Meu scarpin preto e... Pronto.
Suspirei enquanto pegava minha bolsa. No relógio, sete da noite. Era a hora perfeita.
Peguei meu carro e me dirigi até o hotel Hertman.
Era lá que tudo acontecia...
O ponto de encontro de vários milionários. E eu, essa noite, seria uma isca para atraí-los.
Deles, só precisava de uma coisa: dinheiro.
Muito dinheiro.
Só espero conseguir fazer o que deve ser feito, na hora em que chegar o momento ou estarei
perdida.
Totalmente perdida.

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