capítulo 3

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Verônica Sandler

Acordo e vejo as roupas de Adrian em cima da pequena poltrona em meu quarto, mas
nenhum sinal dele por perto. Não imaginei vê-lo tão cedo. Ainda estava chateada com ele.
Ficar tão próxima a ele dificultava ainda mais a minha condição. Eu precisava me manter
afastada. Mas como? Como me afastar do único homem que eu amo e que desperta em mim,
todos os meus sentidos?
Adrian é o único homem por quem realmente tive algum sentimento. O único. Embora
tenhamos começado com o pé esquerdo, Adrian demonstrou a mim o quanto me ama e se
importa comigo. Não sei se teria forças para dispensá-lo. Para tirá-lo da minha vida, mas era
isso que eu precisava fazer. Depois do que Adrian fez ao Charles, eu duvido que ele não vá
revidar. Charles também é um homem poderoso. Eu temia por mim e por ele.
Levanto-me da cama um pouco zonza. Faz alguns dias que não me alimento direito. O
reflexo disso foi aquele súbito desmaio ontem à noite.
Caminho até o banheiro. Olho-me no espelho e vejo minha aparência pálida. Estou me
sentindo doente.
Tiro minha calcinha, meu sutiã e entro no chuveiro. Nada como um bom banho para renovar
as energias. Quando termino, seco meus cabelos e me enrolo na toalha branca. Faço minha
higiene, penteio os cabelos, hidrato minha pele e saio do banheiro.
Adrian está gloriosamente de boxer preta em minha frente.
— Bom dia, meu amor – ele diz com um lindo sorriso.
— O que ainda faz aqui? – pergunto sendo ríspida.
— Isso não vai funcionar, Verônica – diz caminhando em minha direção.
— O que não vai funcionar? – pergunto apertando a toalha em volta do meu corpo.
Ele se aproxima e toca meu rosto. Com sua mão, me puxa pela cintura de modo que nossos
corpos se unem.
— Não vou a lugar nenhum – diz sussurrando. — Não saio daqui sem você.
Afasto-me dele e sinto meu coração disparar. Como eu queria que tudo fosse mais fácil.
Que eu tivesse o conhecido antes. Que fosse meu primeiro.
— Preparei o café da manhã para nós dois. Não achei nada nos armários, tive que ir até o
mercado na rua de trás – ele me olha e franze a testa.
— Obrigada. Mas estou sem fome.
— Precisa se alimentar. Não passou bem ontem à noite. Aliás, você anda se alimentando?
— Cla-claro que sim – gaguejei. Se ele soubesse que não tinha dinheiro nem para comprar
um pão, o que diria?
— Está me escondendo alguma coisa? Por que parece tão aflita?
— Estou cansada. Só isso – minto. A única coisa que queria, era estar nos braços dele,
sendo tocada e amada. Sair desse inferno em que estava vivendo.
— Ontem, você mencionou alguma coisa sobre estar devendo um dinheiro. Acabou que
passou mal e não pude entender do que se tratava – Adrian diz sentando em minha cama. —
Posso ajudá-la.
— Adrian... – sussurro e tento juntar todas as minhas forças para contar a ele o que preciso.
Talvez ele pudesse me ajudar e me tirar desse pesadelo. — Charles e eu... – começo a dizer e meu celular toca. Adrian me olha intrigado, mas não diz uma só palavra.
Quando o quinto toque ecoa no quarto, ele se irrita e pergunta:
— Não vai atender?
— Sim, claro – digo e caminho até o criado mudo em busca do meu telefone. No visor, o
nome de Charles me faz empalidecer.
— É da clínica – minto. — Preciso atender, deve ser importante.
Adrian assente e sai do quarto dizendo que irá buscar nosso café.
Reúno toda a minha coragem e atendo ao telefone.
— Charles? - sussurro entrando no banheiro e fecho a porta.
— Verônica... Preciso te ver – ele diz com sua voz rouca.
— Eu não posso. Aliás, não poderei nunca mais, Charles. Esqueça-me – digo tentando não
sucumbir.
— Ele está com você? Aquele filho da puta está aí? Com você? – perguntou descontrolado.
— O que você quer Charles? – sussurro ao telefone.
— Você sabe o que eu quero. Não se faça de sonsa – ele rebate. Fecho os olhos tentando
conter minhas lágrimas.
— Eu vou conseguir o dinheiro – digo ainda mais baixo para que Adrian não escute.
— Não quero a porra do dinheiro – ele grita do outro lado da linha. – Quero que se livre
dele, Verônica. Se não fizer o que estou mandando, darei um jeito para que ele sofra as
consequências. Você é quem decide.
— Não Charles, por favor. Não o machuque – digo apavorada entre soluços.
— Então se livre dele. Você é minha Verônica. Não vou dividi-la com mais ninguém – fala
e desliga o telefone.
Vou agachando lentamente até o chão do banheiro deixando o pavor me dominar. Jogo o
celular no chão descarregando toda a minha fúria. Levo as mãos à cabeça e me encolho num
choro profundo.
O banheiro é preenchido pelos sons de meus soluços desesperados. Eu estava perdida sem
saber o que fazer.
Completamente perdida...
— Verônica... Você está bem? – Adrian bate na porta.
Eu estou aos prantos e com uma fúria incontrolável.
— Verônica, abra a porta – ele bate mais forte.
A dor que sinto é imensa. Não quero ter que me submeter àquele homem outra vez. Charles
sempre me causou repulsa e nojo. E agora, sinto ainda mais.
Levanto-me do chão e abro a porta. Passo por Adrian rapidamente sem dar chance nenhuma
a ele de me perguntar o que quer que fosse.
Recolho suas roupas da poltrona e sigo até a sala. Adrian me olha atordoado e pergunta:
— O que está fazendo? O que aconteceu, Verônica? Por que está descontrolada?
Abro a porta da sala e jogo sua roupa no corredor gritando:
— Saia da minha casa Adrian – ele me olha sem entender. — Agora! – grito. — Quero que
suma da minha frente, da minha vida. Quero que esqueça que um dia me conheceu.
— O que está fazendo? – diz fechando a porta da sala ignorando suas roupas no corredor.
— Quem era ao telefone?
— Vá embora, Adrian – grito.
— Meu amor, ainda está chateada por não ter acreditado em você? É isso?
— Por favor, Adrian. Faça o que estou pedindo. Não quero mais você – minha voz está
embargada pelo choro. Adrian é esperto. Ele não está convencido.
— Eu amo você, Verônica. E eu sei que me ama também. É loucura nos separamos por
causa disso. Eu errei, fui um idiota, mas eu amo você. Sempre vou amar você. Não peça para
desistir – ele me puxa para seus braços e me beija. Fiz um enorme esforço para não
corresponder ao seu beijo. As lágrimas caiam em meu rosto e pude sentir o gosto salgado
delas.
Adrian se afasta e olha para mim.
— O que está acontecendo? Querida, por favor. Eu preciso saber. É sobre o Charles? Ele
está perturbando você? – ele segura meu rosto com suas mãos.
Preciso afastá-lo. Ele precisava desistir de mim. Não suportaria vê-lo se machucar por
minha causa. Charles é perigoso e conseguiu o que queria: me deixar apavorada. Adrian é
teimoso. Ele não desistiria assim tão fácil se eu não lhe desse um bom motivo. Então, arrumei
um bem convincente.
— Eu e Charles estamos juntos agora – falo, automaticamente, Adrian se afasta. Ele me
olha com os olhos semicerrados e perde a fala. Meu coração se despedaça ao ver a dor em
seus olhos.
— É assim? Vai ser assim agora?
— Quero que me esqueça. Por favor, não me procure mais.
Ele voltou a se aproximar.
— Eu conheço você melhor do que qualquer outra pessoa. Sei quando está mentindo. Sei
que está mentindo agora – passa a mão pelos cabelos, exasperado. — Eu não sei o que está
acontecendo, mas uma coisa eu te garanto, eu não vou desistir de você – ele diz pausadamente.
As suas palavras me deram esperança. No fundo, não queria que ele fosse e nem desistisse
de mim. Mas estava zelando por sua segurança.
Adrian abre a porta da sala, recolhe suas roupas e começa a se vestir ali mesmo. A forma
como me olhava, como seu olhar entrava em minha alma, me despedaçou.
— Obrigado por confiar em mim. Achei que fossemos antes de tudo, amigos. Mas se não
confia o bastante para me contar, terei que descobrir por outros meios – diz chateado e se vai.

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