Capítulo 30

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Foi minha mais estranha viagem ao trabalho social de todos os tempos. Durante todo o dia, Pietr manteve-se distante. Porém, toda vez que Derek se aproximava, o olhar de Pietr corria em minha direção. Ele não me disse nem mesmo uma palavra fria, nem sequer tocou em mim enquanto passávamos pelo corredor.
No caminho para Golden Oaks, Pietr sentou -se na frente. Hascal, Smith e Jaikin rapidamente deram início ao nosso jogo de flerte, mas meu coração não estava envolvido com aquilo.
- Jessie, você não está com a gente, está? - resmungou Hascal levantando uma mão muito pálida, quase transparente.
- Desculpe pessoal. Eu...
- É por causa do Derek? Só pode ser Derek. Ele anda dando muita, muita atenção para ela ultimamente - tagarelou Jaikin.
- Ou Maximilian Rusakova. Ele anda atrás dela.
Meus três nerds favoritos olharam uns para os outros, concordaram sabiamente com a cabeça e viraram-se de volta para mim.
- Nããão - estiquei as vogais para enfatizar - Só estou exausta. Estressada. Minha cabeça está estourando.
Smith acaricio meu braço, seu toque pegajoso me dava arrepio.
- Você tentou tomar algum chá para ajudar?
- Huuum. Camomila é um do meu preferido.
Olhei para Hascal. Mais uma vez, ele começava a não conseguir pronunciar a letra "s", um infeliz efeito colateral de sua severa alergia a qualquer coisa da família dos canídeos. Alérgico a cachorro, a lobo, a chacal e, evidentemente, a lobisomens.
- Eu recomendo - concluiu fungando.
Concordei e abri a janela. A janela de Pietr já estava aberta.
- Obrigada pessoal, mas não acho que chá vai ajudar. Ei, já que tenho as três mentes mais brilhantes de Junction High a minha disposição, o que vocês acham dessa onda recente de suicídios? - perguntei fazendo-os enrubescer por conta do elogio.
- Trágico - respondeu Smith.
Os outros três concordaram com a cabeça.
- Está bem, vou reformular: Por que vocês acham que estamos vendo um aumento repentino de suicídios de jovens?
Smith estalou os dedos. O barulho lembrava o ruído emitido pelas articulações de Pietr durante a transformação.
- Eu acredito que não estamos diante de um aumento no número de suicídios. Acho que agora a mídia está dando mais cobertura e, por causa disso, esses casos estão chegando ao público.
- Você acha que sempre houve essa quantidade de suicídio na região?
- É claro que os números se diferenciam de acordo com o crescimento da população. A forma mais simples de confirmar minha convicção seria fazer um quadro comparando a população ao longo das últimas décadas e o número de adolescentes que cometem suicídio e, então, calcular a proporção ou a porcentagem... Como preferir.
- Um quadro? Siiim! Alguém mais tem uma opinião?
- Não é exatamente uma opinião, mas uma informação que li na internet - Jaikin fez sinal para que eu me abaixasse - Não posso citar a fonte - Ele sorriu.
- Ah. Eles... - murmurou Smith, virando os olhos.
- O que? E quem são eles? - perguntei.
- Jaikin se entrega a fantasias de natureza conspiratórias - disse Smith mexendo em suas unhas e expressando uma clara desaprovação.
- Você é um teórico da conspiração? - provoquei Jaikin.
Ele enrubesceu.
- Abro espaço para todas as possibilidades.
- Ele nega com veemência a navalha de Occam - advertiu Smith. Eu me perguntava o que Smith pensaria se descobrisse que estava sentando duas filas atrás de um lobisomem.
- Você já pensou que as vezes a vida é tão complicada que cortar as coisas e deixar apenas o que é estritamente necessário, como sugere o princípio da navalha de Occam, pode não ser bom o suficiente?
Smith ficou em silêncio. Ele tinha uma queda por mim... Não estaria em discussões.
- Você é fascinante - afirmei para Jaikin - Conte-me sobre a aplicação dessa teoria aos suicídios.
- Parece que as vítimas dos suicídios mais recentes deixaram para trás interessante notas, diários...
- Também blogs - completou Hascal ofegante.
- Certo. Um deles atualizava o blog todas as noites, deixando notas detalhadas do que fazia e do que via.
- Eles tinham algo em comum?
Hascal apontou para mim e segurou o nariz.
- Zim.
Jaikin continuou:
- Todos eles escreviam algo, desenhavam algo ou afirmavam ver algo relacionado a lobisomens.
Meu corpo enrijeceu no assento.
- Lobisomens?
Sem olhar, eu sabia que a linguagem corporal de Pietr imitava a minha.
- Agora ela entende o que eu defendo - declarou Smith - Eles são mais ingênuos do que fascinantes não é mesmo?
- Você tem inveja. Você também quer ser fascinante para Jessie - disse presunçosamente Jaikin.
Smith olhou para trás.
- Lobisomens - sussurrei.
- É uma de muitas possibilidades - Jaikin deu de ombros.
Esfreguei meu braço, afastando o frio que surgiu só de pensar na possibilidade de os Rusakova estarem ligados aos suicídios.
- Diga o que mais você ouviu.
- Já que você perguntou... Esses lobisomens, alguns os chamam de loupgarous ou de hamrammr...
- Ou oborot - acrescentei.
- Que língua é essa?
- Russo.
Os três lançaram seus olhares para Pietr. Smith estremeceu, e os olhos de Hascal ficaram arregalados atrás daquelas lentes grossas, dando a ele um aspecto de coruja.
- O que foi? Não posso saber algo vez ou outra?
Hascal acaricio meu braço.
- Você também é fazinante Jezie.
Jaikin concluiu:
- Então, um grupo acredita que os Lobisomens fizeram as pessoas se matarem nos trilhos do trem.
A memória de permanecer de olhos vendados nos trilhos momentos antes de Pietr me empurrar para fora de la era tão fresca em minha mente que um tremor invadiu meu corpo.
- Por que?
- E eles precisam de um motivo? Um lobisomem, uma criatura que é no mínimo um demônio na pele de homem, um monstro, teria os mesmos princípios que nós? Talvez, para eles, isso seja apenas diversão.
Eu não podia sondar o que se passava pela cabeça de Pietr.
- Assassinato como passatempo? Para mim parece pura maldade humana - argumentei - Alguma outra opinião?
- Alguns sugerem que não são lobisomens que estão fazendo isso, mas pessoas que querem mante-los em segredo - acrescentou Jaikin.
- Como assim? Os lobos são vistos e alguma organização clandestina se encarrega de eliminar as testemunhas? - meu coração acelerou só de pensar na hipótese - Alguma outra opção?
Smith limpou a garganta e disse:
- A única outra opção é a opção. Os adolescentes tem fama de ficaram insatisfeitos. Nossos hormônios vivem em um desequilíbrio horrível, limitando as funções mais importantes do cérebro quando percebemos, por exemplo que alguém tem peitos grandes.
- Deve ser por isso que você não consegue fazer contas quando está na mesma sala que Jessie - Jaikin gargalhada.
Os ombros de Pietr sacudiram. Ele também ria.
Smith ficou com cara de quem tinha chupado um limão.
- Então - continuei - Smith, você estava dizendo...
- Na maior parte do tempo, simplesmente nos sentimos infelizes com o que a vida nos da. Lutamos para encontrar nosso lugar. No mundo e com a nossa família. A vida é tumultuada. A pressão se torna maior, e é natural que a vontade de sobreviver diminua em alguns membros de nossa espécie.
- Então para você, o suicídio é um exemplo de sobrevivência dos que estão mais bem adaptados? - Eu achava que o horror podia ser visto em meu rosto, mas, incerta, acrescentei: - Que ponto de vista frio Smith. Posso concordar com você em muitas outras coisas, mas...
A van estacionou em Golden Oaks, e eu fui a primeira a pular para fora. Lancei um olhar para Pietr, e ele suspirou, resignando-se a também me cumprimentar. Rapidamente dividimos os grupos e quais animais do abrigo levaríamos.
Smith ficou chateado por que Pietr e eu estávamos no mesmo grupo.
- Isso é porque você está com raiva da minha resposta?
Dei um beijo em sua bochecha.
- Achei que houvesse espaço para mais compaixão em um cérebro grande como o seu.
Subindo as escadas com Pietr (por conta de sua fobia de elevador), uma Gama de emoções agitava meu estômago.
- Precisamos conversar.
- Não tivemos nada a ver com os suicídios - assegurou-me Pietr.
Na dobra de seu braço, Victoria a gatinha malhada, miou - Você precisava mesmo pergunta? - Pietr esfregou o nariz e piscou para mim. Seus olhos tornaram-se vermelhos por um instante, enquanto fazíamos uma pausa na escada.
- As vezes, ouvir as coisas ajuda. Você está nervoso?
Ele piscou até o vermelho desaparecer de seus olhos.
- Nyet - murmurou levantando o queixo para apontar para as escadas.
Mudei a forma como eu segurava Tag o cachorro e em um movimento lancei a pergunta seguinte:
- Então por que todos eles parecem estar relacionados a lobisomens? Como se as vítimas tivessem visto algo? - fiz uma pausa, apertando meus dentes - Max está sendo cuidadoso?
- Max? Cuidadoso? Essas palavras nunca deveriam ser colocadas na mesma frase. Você devia saber disso - Pietr disse com um tom de aviso em sua voz.
- Certo. Vamos supor que alguém o veja. Quem iria querer essa pessoa morta por conta do que ela viu?
Olhamos um para o outro e dissemos juntos:
- A CIA?
- Quer dizer... Wanda e Kent tem gerado problemas - admiti - E na igreja, parecia que aquele cara poderia realmente...
- Matar você? - ele olhou nos meus olhos - Da.
- Bem sim. Parece que ele ia mesmo atirar em mim.
- Exatamente - ele esfregou a mão no nariz mais uma vez.
- Alergia?
Pietr negou com a cabeça e piscou seus olhos vermelhos para mim.
- Mas estou começando a me pergunta se é normal uma agência do governo agir de forma tão... - encolhi os ombros.
Olhei para trás e pude vê-lo enterrar o nariz nos pelos de Victoria. Arqueei uma sobrancelha.
- Ela tem cheiro de comida?
Ele riu. Descofortavelmente. Todos os traços de vermelho desapareceram de seus olhos. Enquanto eles me observavam, eram claros e azuis como gelo do ártico. Sua boca transformou-se em uma linha tensa.
- E se houver mais alguém agindo?
- Quem mais? Caramba Pietr... Já estamos lidando com a Máfia Russa e com a CIA. Quem mais pode querer um pedaço de vocês?
- E quem não quer? É uma vida de cão, certo? - ele abriu a porta para mim - Ou talvez as pessoas não sejam quem elas afirmam ser. As coisas raramente são o que parecem.
Olha quem diz... um lobisomem.
Hazel Feldman observou Pietr com um interesse muito maior do que na primeira vez em que o viu... Quando ela concordou que Romeu e Julieta não era uma peça romântica decente.
- Fico feliz por vê-lo fazer sua obrigação novamente - disse ela. Ele arqueou uma sobrancelha para ela:
- Eu não parei. Estou fazendo meu serviço social de forma constante.
- Há uma diferença entre fazer um serviço e fazer sua obrigação, garotinho.
Pietr encolheu um ombro e passou Victoria para ela.
- Ela é linda não é? - admirou Feldman. - Mas tem dentinhos tão afiados. O mundo é assim, não é mesmo? As coisas mais bonitas costumam ter as piores mordidas.
- Sempre com enigmas, senhora Feldman - comentei sorrindo - Sempre saio daqui com muitas coisas em que pensar.
- Bom, muito bom - disse ela acariciando Victoria com uma mão tão pesada que a cabeça da gatinha sacudia para trás e seus olhos arregalavam com cada longo toque que se estendia da cabeça ao rabo - Está pronta para ceder Jessie?
De canto de olho, percebi Pietr inclinar a cabeça observando nossa conversa.
- Não sei. Não sei se quero saber do meu futuro - confessei.
Ela olhou para mim com olhos murchos, que se estreitavam cada vez mais, de modo que suas rugas tornavam-se mais profundas.
- Que será, será. O que tiver de ser, será - murmurou.
- Da - concordou Pietr. - Mas a continuação dessa música não diz que é impossível conhecer nosso futuro?
- Detesto essa música - Ela disparou - Talvez eu pudesse começar com as suas cartas Pietr. - Ela devolveu Victoria para ele e coloco  a mão nas dobras de sua saia volumosa, sacando um belo conjunto de cartas. - Embaralhe.
Relutante, Pietr foi até a porta e a fechou. Em seguida, colocou Victoria no chão... Depois, é claro, de verificar se a janela estava fechada. Ele tinha aprendido isso em sua primeira visita ao asilo. Pietr pegou as cartas e fez uma pausa.
- Não tenha medo. Embaralhe. O futuro é um presente maravilhoso.
- E alguns de nós não temos tempo de abrir esse presente - ele murmurou.
- O que? - ela colocou uma das mãos em forma de concha atrás do ouvido.
- Ele disse que sente muito por estar sendo tão soturno.
Pietr olhou para mim, mas apenas brevemente. Então, embaralhou as cartas como um profissional, com mãos rápidas e seguras.
- Eu tiro uma - disse ele.
Sorrindo a senhora Feldman comentou:
- Você já fez isso antes.
- Da. Tenho uma irmã que tem fascínio por atividades estranhas.
- Se você acha que o que ela faz é estranho, então ela ainda não é muito boa com isso - a senhora Feldman pegou as cartas e as colocou em sua mão, segurando-as com as faces para baixo - Talvez eu faça você acreditar. Puxe uma para saber sobre seu passado recente.
Ele puxou.
- A torre. Você encarou uma grande mudança recentemente.
- Eu sou adolescente. As coisas estão sempre mudando.
- Devo ser mais específica?
- Pode tentar - respondeu Pietr, sem se intimidar.
Segurando a carta, ela fechou os olhos por um momento.
- Seu último aniversário foi cheio de surpresas.
Meu dentes apertaram-se contra meu lábio inferior.
Pietr não demonstrou nenhum sinal de que ela o tinha deixado nervoso.
- Continue.
Feldman passou o polegar pela carta, contemplando.
- Você esperava ser ferido, e não traído, naquela dia. Mas alguém próximo de você o surpreendeu. Não... Duas pessoas o surpreendeu. Uma com quase uma traição, outra com aceitação - Ela corrigiu.
As sobrancelhas de Pietr abaixaram-se.
- Outra carta? Para o futuro próximo.
- Da. - ele puxou outra carta do monte.
Feldman virou-a. Seus lábios passavam de um lado para o outro do rosto enquanto ela pensava sobre o significado, ou talvez sobre as palavras para explica-lo.
- Ah... Há uma morte por vir.
Ele fechou os olhos por um segundo e, então engoliu em seco.
- É um ciclo que se repete, uma abertura que deve fechar-se. Você pode lutar contra, mas essa morte está vindo. Rapidamente.
Estendi minha mão na direção de Pietr, mas ele harmoniosamente se distanciou.
- Pietr...
- Isso não é nada que eu já não soubesse. Se quiser fazer com que eu acredite em magia, tera que fazer algo muito melhor.
- Está bem - disse ela, contorcendo os lábios em um sorriso malicioso - Mais uma carta. Para um segredo que você está mantendo.
Ele estendeu a mão e puxou a carta.
- Não. Pense nisso. Mantenha o pensamento em sua mente. O que você mais quer manter escondido? Qual segredo você não se atreveria a compartilhar?
Pietr passou a língua pelos lábios. Seu maxilar estava duro como pedra. Lentamente, ele puxou uma carta e mostrou para ela.
Os olhos de Feldman correram da carta para ele e, em seguida para mim.
- Saia do quarto Jessie - Ela ordenou.


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Eita eita! O que será esse segredo de Peitr? 

*********Eita eita! O que será esse segredo de Peitr? 

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O segredo das sombras (CONCLUÍDO)Onde histórias criam vida. Descubra agora