Por mais que eu não quisesse, meu pai insistiu para que eu fosse a competição que Wanda tinha organizado. Durante o dia, ela veio me buscar e perguntou:
- Você praticou o suficiente para fazer isso valer nosso tempo?
- Dei alguns tiros aqui e ali.
- Talvez devêssemos deixar isso de lado - disse ela, fechando minha porta e, em seguida, sentando-se no banco do motorista. Seu rosto estava tenso.
- Você está falando sério? - senti um bocejo correr por toda a minha espinha até sair finalmente pela minha boca.
- Se você está se sentindo cansada...
- Estou tranquila. Focada. Você não quer ir? Achei até que você me exibiria por aí... Se eu me saísse bem, é claro.
- Você vai se sair bem - disse ela, colocando o carro no que se entendia por trânsito nos subúrbios de Junction. Ela não parecia acreditar no que dizia.
- Meu Deus, Wanda, você é tão deprê. Conte alguma notícia boa, só para variar um pouco.
- Notícia boa? E se eu contasse sobre como foi idiota aquela proeza que seu namorado tentou aprontar naquela noite? Ele quase virou queijo suíço, pelo que ouvi.
- É, ele quase morreu tentando libertar a mãe dele. Você tem ideia do que é perder ou saber que vai perder a mãe em breve? - virei-me para olhar para ela, forçando meu corpo contra o cinto de segurança - Meu Deus, você estava lá? Você apontou uma arma para ele?
Wanda encostou o carro.
- Não, não apontei. Eu nem fui avisada quando o tiroteio começou. Você sabe o que isso significa, Jessie? Sabe?
Olhei para ela.
- Posso perder tudo por conta de me envolver nas coisas tantas vezes em nome deles. A CIA quer atacar a casa deles... Sequestra-los. E eu digo, relembro meus superiores: Ah, não... Não podemos ser razoáveis? Eles são jovens. Só estão confusos... Vocês sabem como são adolescentes. Vamos fazê-los cooperar... - Ela segurou o volante e o sacudiu como se quisesse arranca-lo. - Eu precisei cancelar tantos planos só para levá-los lá... Eu fiz esforços, Jessie. E agora eles fazem isso!
- O que você queria que eles fizessem ? Ela está morrendo!
Wanda suspirou profundamente e então expirou sua raiva.
- Espero que eles não me coloquem em outra situação como essa. Nunca mais! Temos algumas pessoas que foram hospitalizadas.
- Ninguém morreu?
- Não. Parece que seu namorado forçou uma política de "nada de mortes" junto com aquele bando do qual ele faz parte. Eu não sei se isso vai ajudá-los ou feri-los. A propósito, onde está Cat? Ela não participou do tiroteio, de acordo com os relatos.
- Vamos a competição, ou não?
Wanda colocou o carro na estrada novamente e eu me afundei no banco, concentrando-me em meu mp3 player e nos ritmos, que eram como as batidas de levantar o revólver, atirar e abaixa-lo novamente. Não desperdicei minha preocupação com mais nada. Os Rusakova estavam descansando em casa com Cat enquanto Alexi observava os arredores. A CIA provavelmente continuava reunindo informações. Eu só precisava visualizar minha preparação, o alvo, meus movimentos.
Em vinte minutos, estávamos em um velho clube de tiro ao alvo. Wanda parou o carro em um estacionamento de pedras. Ela batia os dedos sobre o painel. Percebi a ausência de outros carros.
- Pois é... Fomos os primeiros a chegar - declarei.
- Estamos adiantadas.
- Que bom. - Eu gostava de dar uma olhada na área antes de as outras pessoas chegarem e começarem a agir nervosamente. Fazer isso me permitia ajustar a imagem em minha cabeça e aperfeiçoar minha visualização antes mesmo de eu pegar a arma.
- Jessie.
Eu temia as palavras de Wanda.
- Você acha mesmo que eu sairia exibindo você por aí se você se saísse bem? Acha que eu faria disso um evento? Que eu a constrangeria?
Hoje Wanda estava mais estranha do que costumava ser normalmente.
- Bem, você me treinou um pouco. A melhor coisa para alguns técnicos é receber os créditos.
- Ah. - Wanda desligou o carro. Percebi que ela me encarava.
- O que foi?
- Sinto muito por ter tentado empurrar você para aquele jogador de futebol e para longe de Pietr - ela suspirou - Você é incrivelmente leal, e essa é uma qualidade rara. - Wanda pegou uma capa para o volante com suas unhas afiadas. - Estou... Estou orgulhosa de você, Jessie. Você se dedica as pessoas mais importantes da sua vida. E é realmente madura as vezes.
- Sou produto do meu ambiente. Você cresce rápido quando você convive com lobisomens e agentes da CIA.
Wanda concordou com a cabeça e estendeu o braço na direção do banco traseiro para pegar o case com minha arma. Pensei tê-la ouvido dizer algo como "as vezes você simplesmente não cresce".
- O que?
- Vá da uma olhada na linha de tiro. Entre e siga até o final do corredor.
Assenti.
- É no andar de baixo - Ela acrescentou.
- Eles deixam aberto?
- Joe costuma entrar, abrir as portas e ir para a cidade para buscar café "de verdade". Ele faz o outro café, mas não bebe aquilo. Ele costumava competir.
- Legal. - abri a porta do clube. O cheiro de café me cumprimentou, alguns copos vazios de isopor estavam empilhados ao lado de uma garrafa de bebida sem lactose, alguns pacotes de açúcar e uma única colher suja de café.
- Simplesmente diga não - virei o corredor. Meus pés ecoavam pelo linoleo descascado e agitavam a poeira. Aquele lugar precisava de uma boa faxina.
Tirei minha jaqueta e a coloquei sob o braço. Abri a porta e olhei as escadas.
- Eca.
O cheiro de lugar úmido que não via a luz há muito tempo fez meu nariz coçar. Fechei a porta novamente e voltei para onde estava o café. Eu não beberia aquilo (hoje), mas tentaria usá-lo para repelir a nojeira ali embaixo.
No copo, a água soltava vapor e, por força do hábito, quase peguei a colher. A colher de plástico suja. Wanda não tinha dito que Joe buscava café na cidade? Hum.
Misturei o café solúvel e voltei ao corredor, abri a porta e comecei a descer as escadas. Os pelos em meu braço ficaram enriçados. Alguma coisa não estava certa. Congelei, fazendo meus ouvidos buscarem pistas. Meus olhos caçavam.
Aquela não era uma boa hora para verificar meu pulso.
Ouvi algo farfalhar no andar de baixo, a minha direita. Tremi, derrubando café.
Um rato surgiu de trás de um armário de arquivo e correu pelo piso do porão.
Respirei fundo e continuei descendo as escadas.
O primeiro tiro me fez cair sentada. Pude ver o café formar um longo arco no ar. Confusa, vi Kent sair de trás dos armários, tripés e alvos dispostos de forma casual. Daquela variedade estranha de materiais que todos os clubes pareciam acumular. A luz de uma porta de correr de vidro caia sobre a arma que balançava em sua mão. O café respingou em Kent.
De repente, aquela colher suja fez sentido.
- Não é aconselhável beber café antes de atirar - murmurei.
- Desculpa, garotinha. Eu queria uma presa rápida. - ele soava como se realmente estivesse se desculpando.
Agora era hora de a heroína dizer algo brilhante, algo tocante... Alguma frase capaz de mudar a mente de um assassino. Minha boca se abriu.
- Não está acostumado a matar adolescentes?
Nada brilhante. Nada tocante. Inferno. Meu ombro queimou e pude perceber uma enorme linha vermelha.
- Jessie! - gritou Wanda. Sem a mínima noção de etiqueta. As linhas de tiro eram lugares quietos quando ninguém estava atirando. Ela não percebia isso? Wanda correu pelas escadas de madeira.
- Que diabos...
A boca da arma de Kent se distanciou de mim, encontrando Wanda. Quem representava uma ameaça maior: A agente com o estojo de uma arma ou a jovem que a acompanhava, com café correndo pelo braço?
- Wanda. Sinto muito, mas a matriz resolveu me promover.
- E por isso você atirou na Jessie? - Ela continuou descendo lentamente as escadas, mãos para cima, estojo do revolver sobre o ombro. - Em que tipo de organização nós estamos Kent? Sei que a gente está longe de qualquer grande centro e que a maioria dos nossos superiores nunca conversa cara a cara com a gente, mas...
- Você está próxima demais dessa situação. Não está vendo as coisas claramente. Você teve a chance de ter a cura...
- Jessica - gritei - A cura tem um nome. - toquei em meu ombro. Que coisa louca. Havia um buraco em minha camisa. E eu gostava dessa camisa. Pelo menos estava tudo bem com minha jaqueta. Kent continuou divagando:
- Se aquele garoto tivesse conseguido fazer a parte dele e deixá-la sob controle, ou se você pudesse tê-la mantido longe dos lobisomens... Contido o risco de outros dessa espécie serem curados...
- Eles são sensíveis a esse tipo de frase - interrompi. Não, Kent não gostaria de mim depois disso. Mas ele já tinha me dado um tiro. Minha participação no concurso de popularidade da vida provavelmente já estivesse chegando ao fim.
O rosto de Kent ficou rosado.
- Você destruiu tudo, Wanda.
- E por isso você atirou em Jessie? - Ela repetiu, agora parada ao meu lado. Assim ficava mais fácil para Kent apontar a boca de sua arma para uma e para a outra.
- Não quero desperdiçar o resto da minha vida brincando de bobinho com lobos. Eu prefiro erradicar a ameaça... A cura... Jessica.
Ele moveu a arma, firmando-a para que ficasse claramente em mim a mira.
O dedo de Kent descansava no gatilho. Eu me perguntava se aquele era um gatilho de estágio simples ou de estágio duplo. A diferença não seria maior do que meio piscar se olhos...
Wanda fez uma diferença maior.
Um dente voou da boca de Kent quando o estojo da arma bateu em sua cabeça. Ele atirou, mas o tiro passou longe. Bem longe. Wanda tinha um revólver em mãos.
- Suba a escada Jessie.
Agarrei o estojo e corri escada acima. Atrás de mim, ouvi Wanda avisar:
- Não me faça...
Em seguida: pá-pá-pá.
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O segredo das sombras (CONCLUÍDO)
De TodoJéssica não é mais a mesma garotinha rural. Desde que se apaixonou por Pietr, um lobisomem russo, sua vida se misturou com uma complexa trama de poderes envolvendo a família do rapaz. Pietr e seus familiares são os últimos indivíduos de uma linhagem...