Final

3.2K 252 59
                                    

      Nem soube dizer ao certo como conseguiu descer as escadas sem cair, estava com as pernas tremulas e mal via os degraus, tudo que queria era chegar logo na parte térrea.

      A cena que se seguia era assustadora, os dois haviam caído em cima da mesinha de centro com tampo de vidro que havia na sala. Francisco estava de costas caído diretamente sobre a mesa e Alisson toda torta por cima dele. No mesmo momento que correu até eles, Berenice também veio correndo sabe deus de onde.

      Cintia vira Alisson de barriga para cima com todo cuidado. Havia sangue por todo corpo, não sabia dizer se era tudo dela o de Francisco também. Olhou do lado e viu Berenice se agarrando forte a Francisco não precisou prestar muita atenção para ver que ele estava morto. Sentiu uma tristeza, afinal era seu pai, mas não se preocupou com isso no momento, só queria saber como Alisson estava.

      Tirou uma mecha de cabelo toda suja de sangue do seu rosto. Sentiu um alivio tão grande quando notou que ela ainda respirava. Pegou rapidamente o celular e ligou para a emergência. Então tentou falar com Alisson.

___Sua doida por que fez isso?

      Ela deu um gemido leve, mas conseguiu abrir um pouco os olhos, tenta dar um sorriso para Cintia que acabou saindo mais parecido com uma careta, talvez por conta da dor que devia estar sentindo.

___Não tive escolha, era ele ou você, eu quis te proteger.

___Tudo bem , não vamos pensar nisso agora. Eu já chamei uma ambulância, você vai ficar bem.

     A voz de Alisson era tão fraca que Cintia sentiu medo e também viu o corte profundo na perna dela, um pedaço de vidro da mesa havia feito o rasgo feio ai e o sangue saia aos montes.

___Eu já volto.

      Correu até o quarto e pegou o lençol da cama mesmo, para tentar estancar o sangue da perna. Envolveu a perna de Alisson nele e ficou pressionando, mas parecia não surtir nenhum efeito, o lençol agora começava a ficar avermelhado com o sangue.

___Me desculpa....pelo seu pai....a intenção era só tirar aquela garrafa dele...eu não queria matar.

___Fica quieta, não faz nenhum esforço, nem para falar e não fecha os olhos por favor, isso me assusta muito.

      Mais uma vez Alisson tenta sorrir sem muito sucesso.

___Isso parece um flasback do meu tombo na piscina. Será que vamos ganhar carteira de sócio do serviço de emergência?

___Meu deus Alisson, você é boba até quando não deve ser. Só fica quieta.

      Cintia ouvia Berenice chorando, sentia vontade de chorar também , mas por Alisson e não por ele, pode até parecer cruel, mas não sentiria falta dele. Estava distraída olhando para os dois quando sentiu Alisson pegar sua mão. Estava gelada demais, e isso deixou Cintia mais apreensiva ainda.

___Eu queria que tivesse sido diferente. Que eu tivesse te conhecido de outro jeito, que pudesse ter estado com você como sempre desejei desde que te conheci, mas não posso mudar minhas escolhas, fiz o que tinha que fazer me casando com seu pai. Eu só lamento não poder ter ficado mais com você, lamento tanto...

___Ei o que é isso, você vai ter muito tempo comigo ainda. Acha que vai ser livrar de mim assim tão fácil. Vai ter que me aturar muito ainda, vai ter que me aturar pela sua vida toda. Por favor Alisson, aguenta mais um pouco, os médicos devem estar chegando já.

___Sei que não disse isso tanta vezes quanto queria ou deveria ou nunca provei, mas eu amo você Cintia, e faria qualquer coisa para te proteger.

___Para!! Isso não é uma despedida. Vai me dizer muitas vezes ainda, vai me dizer também como sou chata e irritante, como você que me estrangular as vezes e....

      Sentiu a mão de Alisson afrouxar aos poucos da sua, até tombar de lado, entrou em pânico, não conseguia mais sentir a respiração e nem o pulso. Começou uma massagem cardíaca e respiração artificial, mas Alisson não respondeu aos seus esforços.

     Nesse momentos os enfermeiros chegam, mas Cintia fica sentada no chão totalmente alheia a movimentação a sua volta. Ela fez tudo que podia para salvar Alisson? E aquela dor que ela havia sentido anos atrás mais uma vez voltou com toda força.

                                                                                                               ***

      Seis meses haviam se passado desde aquele dia  trágico em que  Francisco e Alisson haviam lutado, mas para Cintia parecia uma eternidade. Nos primeiros dias havia sido difícil até levantar da cama e fazer as coisas mais básicas como comer ou se vestir, aos poucos foi criando uma rotina que mantivesse sua mente ocupada para que não lembrasse o tempo do que tinha acontecido. Era um começo, certas coisas são complicadas para superar e tentar esquecer.

      Sempre achou que não tinha ninguém no mundo que a amasse, mas teve duas pessoas, sua mãe e Alisson e duas fizeram tudo para defende-la do monstro psicopata que seu pai era.

      Continuou morando na mesma casa onde tudo aconteceu, apesar de todas lembranças ruins, era casa da sua mãe, era a sua casa. Demitiu Berenice, ficou sabendo depois que ela sempre fora mesmo apaixonada por Francisco e fazia tudo que ele pedia, se não fosse aquele telefone dela para avisar que elas estavam ali talvez nada tivesse acontecido e Francisco estaria na cadeia e não morto.

      Depois de uma investigação em todas as finanças do pai enfim descobriram suas falcatruas. Ele desviava rios de dinheiro do hospital Madre Amparo, as cirurgias que ele fazia para pessoas carentes na verdade era uma forma de desviar esse dinheiro sem  chamar tanta atenção, ele usava sempre material de segunda mão, mas na nota para pagamento sempre o produto era descrito com um preço muito superior. Fazia tudo isso com ajuda de dois empregados do setor de contabilidade. Por isso tinha uma necessidade tão grande de ser diretor geral, dessa forma não seria descoberto.

      Quanto a ela ia tentando levar a vida como podia, estudava mesmo que muitas vezes não conseguisse se concentrar, ainda não sentia vontade de sair casa, mas um dia voltaria a sair a normal, o trauma que tudo havia lhe causado era imenso, tinha pesadelos quase todas as noites mesmo com o tratamento psicológico, mas um dia estaria 100% bem.

      Caminhou até a piscina, sentou ali na beirada como havia visto Alisson fazer tantas vezes, colocou os pés na agua e ficou de olhos fechados, a brisa batia de leve no seu rosto e despenteava seus cabelos, por um breve momento sentiu como se estivesse se desligando do mundo, então alguém chega perto e senta ao seu lado e sussurra em seu ouvido :" _ amo você sua chata".

     Cintia abre os olhos e vê Alisson sentada ao seu lado, tinha o cabelo cortado bem mais curto, e estava cada dia mais linda. Deu um beijo na ponta do nariz dela e ficou ali olhando enquanto ela entrava na piscina, vinha aprendendo nadar fazia alguns dias, era parte do tratamento para tentar reabilitar a perna que havia sido ferida naquela dia fatídico. Olhou a cicatriz enorme que tinha ficado em sua coxa e agradeceu silenciosamente aos céus por ela estar viva, por um momento achou que tivesse perdido, mas Alisson era uma lutadora, havia escapado por pouco da morte. 

___Ei Cintia, entra aqui e me ajuda com essa hidroginástica.

___Já vou meu bem.

     Ficou olhando mais um pouco para ela, e sentiu aquela sensação de felicidade que se tem quando a vida parece começar dar certo, e nesse momento parecia que tudo ia se encaixar e formar um quebra cabeça perfeito.

     Entrou na piscina e foi até onde Alisson estava, deu um abraço apertado e disse olhando em seus olhos.

___Também te amo bichinho teimoso, pra sempre.

                                                                               Fim

Depois Daquele BeijoOnde histórias criam vida. Descubra agora