A tarde parece o início de uma manhã, com o clima ameno do outono. O vento gelado sopra os montes de folhas empilhados nos jardins das várias casas, todas de dois andares e com cercas brancas separando os limites das moradias. Crianças agasalhadas brincam e se jogam, espalhando as folhas pelas ruas. Outras passeiam com suas mascotes enquanto os pais vigiam de perto. O céu nublado sobre a cidade dá indícios do que está por vir dentro de algumas semanas. Pacato, o condado de Fosnny abriga cerca de sete mil moradores e é um dos destinos mais requisitados por praticantes de pesca, devido aos seus lagos que abrigam centenas de peixes. Todavia, nenhum pescador está visitando a localidade por causa do frio que fecha a temporada de pesca da região.
ㅤㅤㅤㅤQuebrando a calmaria do condado, uma caminhonete F-250, da Ford, faz ultrapassagens arriscadas pelas ruas estreitas, sendo respondido com buzinadas. O olhar do motorista está fixo na pista, mas não esconde a preocupação que o faz ser imprudente ao volante. Das calçadas, algumas pessoas podem ver o homem careca passando a mão direita no rosto para afastar o suor, mantendo a canhota segurando o volante.
ㅤㅤㅤㅤO que ele presenciou mais cedo está gravado em sua memória e o faz não prestar atenção adiante. De supetão, ele pisa bruscamente no pedal do freio e por pouco, não atinge uma mulher idosa que atravessava a rua. O som dos pneus arrastando no asfalto chamou a atenção de outros pedestres que estavam próximos e eles observam a cena, ofegante. Sob os xingamentos da idosa, o motorista com uma cicatriz no lado direito do rosto se acomoda melhor no banco e respira fundo, buzinando várias vezes. A mulher começa a andar na direção da sua porta, na intenção de repreendê-lo cara-a-cara, mas antes que ela tenha a chance de tocar na janela, a caminhonete arranca e segue pela rua, carregando as folhas caídas consigo.
ㅤㅤㅤㅤO veículo só para realmente após virar uma esquina e chegar na frente de uma modesta casa de dois andares, sem varanda. O homem estaciona com as duas rodas da direita sobre a calçada e desliga o motor, desembarcando com seu celular na mão, respondendo às mensagens que já estavam na tela: “Estou saindo de Fosnny”; “Chegarei aí no final do dia”; “Apenas eu e outra pessoa. Nomes: Allen e Millie Holmes”, são apenas algumas das respostas que ele dá antes de chegar na porta apressadamente. Allen guarda seu celular no mesmo bolso de onde tirou as chaves da residência e destranca a fechadura já tirando seu casaco verde e o jogando enrolado no chão, no intuito de esconder uma mancha de sangue — ele sabe que esse não é o melhor esconderijo, mas está com pressa demais para levar até a lavanderia nos fundos da casa. Ele caminha pela antessala que separa a cozinha da sala de estar e entra no primeiro cômodo.
ㅤㅤㅤㅤ— Millie? — ao chegar, ele encontra apenas uma tigela e uma caixa de cereal vazia sobre a mesa. Uma outra, de leite e também vazia, está caída ao lado, provavelmente por causa do vento que sopra pela janela aberta atrás da pia. Após fechar a ventana, ele sai da cozinha e volta ao corredor, agora seguindo mais para o fundo, chegando nas escadas que levam ao segundo andar.
ㅤㅤㅤㅤA segunda porta do corredor que se inicia depois dos degraus possui um aviso de “Mantenha Distância”. Dentro do quarto, as paredes brancas estão coloridas pela grande quantidade de pôsteres de bandas de rock. Um tapete oval está largado com metade embaixo de uma cama de solteiro, dando mais espaço para que várias roupas fiquem jogadas pelo piso de madeira. Um espelho preso na porta serve de cabide para alguns casacos e a cadeira da escrivaninha acomoda calças. Chutando as roupas, uma jovem pula pelo quarto ao som de “Smells Like Teen Spirit”, do Nirvana, nos fones de ouvido conectados ao seu celular. A música está no volume máximo.
ㅤㅤㅤㅤA garota magra, de cabelos loiros e cerca de 1,60 de altura passa pela escrivaninha repleta de CDs e fotografias de cantores presas em um quadro com tachinhas e pula na cama com o refrão de Kurt Cobain, não percebendo a porta atrás dela sendo aberta e Allen se aproximando, erguendo o braço direito depois de cruzar toda aquela bagunça. Ao chegar perto o bastante, ele pega o fio dos fones e o puxa, tirando-os dos ouvidos da menina.
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Sangrentos: Destinos Cruzados
رعبUma pandemia causa o colapso mundial, tirando de circulação governos, comércios, emissoras de TV e a vida como era conhecida; uma praga que faz os mortos se erguerem para o topo da cadeia alimentar e dominarem o globo, banqueteando-se dos vivos. Na...