Seis

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Eu coloco os pés no aeroporto do Rio de Janeiro sentindo um frio na barriga. Milhares de luzes se misturam nos meus olhos; eu tento identificar um rosto conhecido no meio de tanta gente. As pessoas passam apressadas por mim, cheias de malas, cada uma em busca de um destino diferente. Os painéis de LED piscam a todo momento e as vozes dos chamados para os voos invadem meus ouvidos.

— Raíssa? — Ouço alguém me chamar, e me viro na direção do dono da voz.

Um homem alto com uma camisa de agência de turismo está olhando para mim. Ele carrega uma plaquinha com o meu nome.

— Oi, sou eu — digo. Me aproximo dele.

— Prazer, eu sou o Manoel — ele diz, estendendo uma mão para mim. Eu retribuo o cumprimento. — As meninas já estão esperando na praça de alimentação, vamos lá?

Meu coração dispara assim que ele termina de falar. É como se só agora a ficha estivesse caindo. Só agora eu percebo que tudo é real.
Caribe é real, Pauriany é real, Cosmos é real.

Tudo. Tudo é real.

Confesso que estou com um pouco de medo. E se nós não gostarmos umas das outras? E se as coisas não forem como no celular, e se a gente simplesmente não tiver assunto?

— Vamos — eu digo, engolindo as perguntas para mim mesma. Pego minha mala e sigo Manoel pelo aeroporto.

Nós caminhamos em direção à escada rolante que leva ao andar de cima. Manoel me faz perguntas banais sobre como foi minha viagem até o Rio e me questiona se eu trouxe todos os documentos, e eu me concentro nesses assuntos aleatórios.
De repente, os degraus se acabam e a praça de alimentação está bem na nossa frente.

— Elas estão ali — Manoel diz. Ele aponta com o indicador para uma mesa redonda cheia de meninas.

Meu coração para por um segundo. São elas. Todas elas. Juntas.
Reconheço os gritos de Luciana, a voz doce de Mylenna, as risadas de Gabriela, o sorriso de Letícia e os olhinhos de Stefani.

Não sei o que sentir ou pensar. Sabe quando você deseja que algo se torne real por tanto tempo, que quando chega o momento você simplesmente não consegue acreditar?
Elas estão rindo e conversando como se já se conhecessem há anos. É tão... perfeito. Parece um sonho.
De repente, todo o meu medo  vai embora.

Eu vou até elas.

— Olhem quem chegou! — Manoel diz. As cinco erguem os olhos para ele, e depois para mim.

Mylenna é a primeira que se levanta. Suas covinhas emolduram um sorriso enorme quando ela vem até mim.

— Aleluia, você chegou! — ela diz, com um abraço.

As outras vêm em seguida; por um momento eu não sei se rio, se choro ou se desmaio ali mesmo.

— Graças a Deus você chegou, graças a Deus — Luciana diz. Ela toca no meu rosto como se quisesse ter certeza de que estou mesmo aqui. — Como foi a viagem?

— Foi boa — eu digo. — Meu Deus, são vocês, são vocês mesmo! — Eu soo como uma criança de cinco anos vendo o Papai Noel.

— Finalmente, hein, Raíssa? — Stefani diz.

Eu rio, e ela se junta no abraço. As outras fazem o mesmo; nós nos misturamos numa confusão de abraços, beijos e cumprimentos. O tempo parece parar, é como se não houvesse nada nem ninguém além de nós seis.

— Eu não tô acreditando que isso está acontecendo — Luciana diz. — Meu Deus, eu não tô acreditando.

— Aiai, nunca pensei que fosse escutar pessoalmente os áudios da Luciana — Gabriela fala, a voz misturada entre riso e choro.

— Eu vivi pra ouvir  Luciana chamando meu nome ao vivo — Stefani comenta com uma risada.

— Finalmente, todo mundo junto — Mylenna fala. — Nem sei quantas vezes eu sonhei com isso.

— Meninas, desculpa interromper, mas temos que embarcar — Manoel, que estava olhando a cena de longe, diz.

Nós nos desvencilhamos do abraço, as meninas voltam à mesa para pegar suas malas, e juntas seguimos Manoel, que vai na frente.

— Por que esse cara vai junto? — Letícia pergunta baixinho para nós. — Pensei que fosse Caribe com Cosmos e Pauriany.

— Você queria que a gente chegasse no Caribe sozinhas? Eu, hein — Luciana retruca.

— Deixa ele, pelo menos é bonitinho — Stefani fala.

— Que bom que você achou — Mylenna diz, e fica vermelha no mesmo instante. Eu escondo uma risada.

Luciana caminha até Stefani e a encara com um sorrisinho.

— Ai Luciana, não fica perto de mim com essa mala não —  Stefani diz, revirando os olhos.

É só nesse momento que eu reparo na mala rosa gigante com o rosto da Barbie em alto relevo que Luciana está empurrando.

— Ué, o que que tem? — ela pergunta.

— Nada, só o aeroporto inteiro olhando pra você.

— Nem ligo, pelo  menos vou achar minha mala rapidinho na esteira, e vocês vão ficar meia hora procurando as de vocês  — ela diz.

— Pra isso existe fitinha — Gabriela retruca. Luciana mostra a língua para ela

— A Luciana vai ser parada o tempo todo — Letícia diz.

— Eu vou fingir que nem te conheço — eu digo, e escondo o rosto nas mãos.

— Deixa, quem vai rir sou eu quando vocês não acharem a mala de vocês — Luciana replica.

— Meu Deus, eu já disse que amo vocês hoje? — Mylenna pergunta.

Nós chegamos ao portão de embarque em pouco tempo, depois de despachar as malas. Manoel nos organiza em fila; eu pego meus documentos, separo as coisas de que vou precisar e me preparo para passar pelo raio X.

Mylenna é a primeira a passar; em seguida Letícia, Luciana, eu, Stefani e Gabriela. Quando chega a vez de Manoel passar, porém, uma movimentação estranha acontece. A funcionária que está organizando a fila o chama discretamente.

Eu tento espichar o ouvido para escutar a conversa, mas não consigo, então espero Manoel passar pelo raio X e falar o que está acontecendo.
Ele vem até nós e se vira para Gabriela.

— Gabriela, você foi escolhida para a verificação do departamento antidrogas — ele anuncia. — Essa moça vai levá-la para uma salinha. A gente espera aqui.

— Ah, meu pai — Stefani diz. — Era só o que me faltava.

— Não se preocupem, é procedimento padrão — Manoel fala. — Eles sempre escolhem alguns para verificar a possibilidade do porte de drogas.

Nós observamos enquanto Gabriela entra em uma salinha e tira os sapatos. Uma voz ecoa, ao longe, fazendo o primeiro chamado para nosso voo.

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