Vinte e oito

99 4 0
                                    

Eu salto do carro com o coração acelerado. As ruas desertas ao nosso redor ocupam todo meu campo de visão; algumas casinhas espalhadas em pontos aleatórios preenchem o cenário dessa área quase morta do Caribe. Não tem ninguém circulando pelas calçadas, e o único veículo que avisto é o de Felícia, que parece um elefante branco no meio do nada.

— Vocês têm certeza de que querem fazer isso? — Felícia nos pergunta assim que nós colocamos os pés no chão. Ela não para de mexer na pelezinha em volta da unha do polegar.

— Temos — Alice responde, sem esperar por nós. — Obrigada por nos trazer até aqui.

— Eu tenho um amigo policial — a mulher fala, como uma última tentativa de nos fazer desistir. — Ele é de confiança. Posso chamá-lo para acompanhar vocês.

— Se a gente precisar a gente avisa – Alice dispensa, com educação. — É bom saber que tem alguém pra nos ajudar caso algo dê errado.

Felícia coça a testa com as costas da mão.

— Eu sou oficialmente a mulher mais irresponsável do mundo — ela resmunga. — Você sabe que jamais vou me perdoar caso aconteça algo com qualquer uma de vocês, né?

Alice vai até ela e lhe abraça.

— Você não é a mulher mais irresponsável do mundo — ela diz, dando-lhe um beijo na bochecha. — Você vai ser uma heroína. Porque vai ajudar a salvar uma menina.

Felícia exala o ar e murmura uma prece quase silenciosa. Alice se desvencilha dela e começa a seguir um caminho que parece levar a lugar nenhum.

Nós permanecemos no mesmo lugar.

— Eu vou ficar aqui até vocês voltarem — Felícia promete. — Se acontecer alguma coisa, qualquer coisa, vocês precisam me avisar...

— Pode deixar — eu garanto, apesar de não ter certeza de nada.

— Obrigada, Mylenna — Felícia diz. Ela me dá um abraço rápido, ao qual eu correspondo.

Luciana é a primeira a sair de perto do carro e seguir Alice, que caminha com propriedade pela rua. Nós vamos logo atrás; em pouco tempo a alcançamos.

— A casa onde os acessos ao Twitter foram feitos fica bem perto daqui, mas o lugar onde Raíssa tá é um pouco mais afastado — ela comenta.

Eu dou graças a Deus por não haver ninguém nas ruas. Oito pessoas zanzando no meio do nada com certeza chamariam muita atenção.

Nós caminhamos até o carro gigante de Felícia se transformar em um pequeno ponto branco. Um cachorro magro late para nós através da janela de uma casinha simples de tijolos, mas não há sinal de outros habitantes na moradia. Faço uma nota mental de tentar tirá-lo dali quando voltarmos. Quando Raíssa estiver a salvo.

Eu sinto o olhar de Stefani sobre mim enquanto caminhamos. Ela é a mais quieta de nós.

— Tá tudo bem? — pergunto. Começo a andar mais devagar de propósito; ela faz o mesmo.

— E ainda pergunta? — ela retruca com um suspiro. Eu desvio os olhos dos dela, o que a faz suavizar a expressão. Depois, completa: — Eu queria pedir desculpa por antes, no carro. Foi meio desnecessário.

— Que bom que percebeu — eu falo. —Mas tá tudo bem. Deixa pra lá.

— My, eu... — ela recomeça e para de novo. Eu ergo os olhos para ela, mas ela apressa o passo e alcança as outras.

CosmosOnde histórias criam vida. Descubra agora