Algumas vezes, o buraco entre a expectativa e a realidade é tão pequeno que se torna quase imperceptível a olho nu, como as fundações em um formigueiro muito bem construído. Outras, se você não estiver prestando a devida atenção, pode ser engolida por inteiro por essas duas dimensões, que parecem estar a galáxias de distância.
Nesse momento, não só a expectativa parecia estar orbitando um outro planeta muito longe da realidade, como Felipe. Devido a busca incessante pelo amor de sua vida, a garota nem sequer havia se dado conta de como o tempo correu. Passou tão rápido, mais tão rápido, que seu irmão deveria chegar à São Paulo no próximo final de semana, e ela não havia conseguido cultivar a ansiedade devido ao seu retorno.
É de se pensar que a situação seria benéfica, não?
Não.
Porque Felipe mudou os planos, e seu regresso marcado para novembro agora havia sido adiada em quinze dias, praticamente para a véspera de Natal - considerando o exagero de sempre de Elisa. Talvez, o universo todo estivesse conspirando contra a garota?
Talvez.
Elisa até considerou encaminhar um áudio bastante desagradável a ele, mas de nada adiantaria. Estava exausta de brigar, nunca havia imaginado a quantidade de energia necessária para debater com alguém. Então, ela simplesmente o ignorou.
Uma vez havia lido que não se importar machuca mais do que discutir, mas ela nunca teve autocontrole o suficiente para não responder a alguém. Às vezes, chegava a ponto de ficar refletindo no banho qual seria a melhor maneira de sair como superior em uma discussão, até finalmente devolver o insulto. Mas ignorar, não. Deixar para lá é muito complicado. Vai que a pessoa fica imaginando que, na verdade, você não tem argumentos suficientes para vencer?
Dessa vez, isso nem sequer passou pelos pensamentos de Elisa, que abandonou o celular em cima da escrivaninha em seu quarto, sem nem ao menos pensar duas vezes. Será que a vida pressente quando estamos indo bem, e resolve acrescentar um pouco mais de emoção? Como se as pessoas carregassem culpa por estarem felizes, e o destino ficasse sempre a espreita para desestabilizar o dia-a-dia.
Talvez, a teoria de que um namorado faria com que todas as demais áreas da vida de Elisa se ajeitassem fosse furada. Talvez, ela realmente precisasse parar e refletir um pouco, ao invés de viver no modo automático como um The Sims. Verdade seja dita, isso é um exagero dos anos 90. Até para Elisa.
Já havia passado da hora da garota enfrentar a vida de uma vez por todas, encarando de frente todas as questões que jogou para debaixo do tapete. Não há nada de errado em se trabalhar em uma livraria, mas era isso mesmo o que ela queria? Qual o real motivo para evitar tanto cursar uma faculdade? Por que, todas as vezes que as situações não saem como planejado, Elisa se rebela contra o mundo? Se a saudade de Felipe é assim tão grande, o quão difícil seria pegar um ônibus e visitá-lo? Quais os requisitos que sua mãe cumpriu para tornar-se bode expiatório para todas as questões não resolvidas de Lisa?
São tantas as perguntas que provavelmente seria possível criar um jogo Perfil somente com a vida de Elisa. Definitivamente, as melhores partes seriam as alternativas:
Por que Elisa evitou beijar alguém até agora?
A) Porque ela tem mau hálito;
B) Porque ela nunca conseguiu treinar com a laranja;
C) Porque ela idealiza um garoto perfeito com base em todas as histórias fictícias que já consumiu até o momento, e ainda não se deu conta de que ele nunca vai chegar e se depender de todos os pré-requisitos que ela possui, vai morrer sem sentir a pressão da boca de outra pessoa na dela.
OK, ok. A alternativa C já foi a mais correta, mas não representa totalmente a realidade no momento. Mesmo que pequena, uma vitória precisa ser reconhecida e, por mais que ainda não tenha rolado uma interação entre lábios, Elisa já evoluiu muito em sua Síndrome do Garoto Perfeito com Hugo. Quero dizer, até onde sabemos, ele realmente é feito de carne e osso, e não foi retirado de um romance inspirado em Peter Kavinsky. Mesmo que o garoto se trate de um clichê ambulante, já é muito mais palpável do que qualquer outra paixonite aguda que Elisa veio alimentando por anos.
Sempre foi tão mais simples se envolver com personagens fictícios, muito porque eles eram...Bom, irreais. E gente irreal não desconta sem querer em você quando teve um dia difícil no trabalho. Gente irreal não tem um histórico familiar, muitas vezes complicado, que refletirá no relacionamento. Gente irreal não questiona suas atitudes. Gente irreal não tenta te beijar e, de repente, te tirar de sua grande zona de conforto.
Obviamente Elisa sonhava com os beijos. Sonhava tanto que as vezes podia jurar que havia encostado seus lábios nos de Edward Cullen durante uma noite mal dormida após um jantar pesado. Mas, você vê, nos sonhos não há medo e insegurança e é por isso que tantas vezes fugimos para lá, para um mundo onde não somos questionados.
Se ao menos houvesse uma maneira de solucionar todos as questões em aberto de uma só vez, como nos filmes e livros... A vida seria tão mais fácil, não? Se houvesse uma receita básica de como enxergar a realidade e assumir quando se erra. De se entregar a alguém sem tanto medo do amanhã. De dizer o que sente, mesmo que seja somente saudade do irmão.
Mas e se houvesse, de verdade? E se todos os conteúdos que consumíssemos possuíssem uma regra em comum, que deixaria a balança da vida em equilíbrio e nos permitisse seguir em frente? E se a cura para a Síndrome do Garoto Perfeito morasse exatamente no mesmo lugar em que ela nasceu?
Seria essa ideia uma grande teoria da conspiração? Uma tremenda loucura? Uma verdadeira alucinação pós muitas horas de trabalho? Elisa não saberia dizer. Pelo menos não até tentar! E, para isso, a garota precisaria de algumas noites livres e um atendo olhar analítico.
E sorvete, obviamente. Muito sorvete.
Chegou o momento em que a ajuda de vocês é mais do que necessária! E aí, quais filmes Elisa precisa assistir para aprender uma grande lição de vida?
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Você Vai Conhecer o Amor da Sua Vida
Romance🎖 Eleita uma das Melhores Histórias de 2020 pelos Embaixadores do Wattpad. Elisa sofre de uma condição não muito grave e bastante comum na sociedade, chamada de Síndrome do Garoto Perfeito. Se você apresenta sintomas como: paixonite aguda por perso...