O Covarde Que Sou

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- Eu te liguei algumas vezes, mas...você não atendeu nenhuma chamada então....eu fiquei preocupada e...já tem um tempo desde a última vez que nos vimos...

Helena está de frente para mim e ainda está tensa. Eu procuro uma camisa para vestir mas tenho dificuldade em me lembrar em qual gaveta costumo guardar camisas.

- Peter...olha...eu sei que...sentimentos são difíceis de entender e que não temos controle sobre de quem vamos gostar ou não mas...você tem que entender que as coisas não são assim e que você pre...- eu a interrompo.

- Helena, como você mesma acabou dizer, já que não controlamos isso... e se você quer saber de uma coisa, eu não quero mudar o que estou sentindo porque por mais ambíguo que isso seja, você ao mesmo tempo que é a minha morte...você é a minha vida.

- Peter, você está sendo muito radical...

- Helena, você sabe como eu sou... Aliás, não me admiro que você realmente não tenha interesse nenhum em mim... Quem teria? Um deprimido como eu...

- Não fale assim... -ela se aproxima de mim.

- Você sabe que é assim.  Helena, você não deveria estar aqui. Você sabe dos meus sentimentos e o quão disposto a não mudá-los estou.

- Mas...eu ainda me preocupo com você... Eu gosto de você, Peter. -ela se aproxima mais ainda de mim.

Eu me afasto.

"Eu gosto de você."  Aaaarrgh! Essa frase me irrita tanto que a minha vontade é de quebrar um dos pés da cama e fazê-lo de estaca...como fiz na última vez que ela esteve aqui. Contudo, logo percebo que isso seria uma atitude muito estúpida e que não quero conseguir o amor de Helena por meio de chantagens emocionais. Se é que vale a pena continuar tentando...

- Peter, eu sinto muito mas...você está sempre reclamando e se amargurando no fato de as pessoas nunca terem de amado e se preocupado com você, mas aí...quando alguém faz isso, você simplesmente vem cheio de pedras e se torna agressivo e rude e instável e infantil e ...

- Helena, eu não quero que as pessoas demonstrem interesse em mim por...pena! Eu não quero que elas tenham sentimentos por mim porque sou um suicida em potencial ou porque eu não passo de um pianista que só sabe compor tristes canções!

Helena se exalta e aumenta o seu tom de voz.

- Então...O QUE VOCÊ QUER, PETER?

Em ressonância, eu faço a mesma coisa.

- EU QUERO SER AMADO, HELENA! EU QUERO SER AMADO PELO O QUE EU SOU! COM OS MEUS DEFEITOS E QUALIDADES, MESMO QUE SEJAM QUASES INVISÍVEIS E CHEIO DE MARCAS E CICATRIZES QUE A VIDA TEVE O PRAZER DE CRAVAR EM MIM! EU NÃO ESCOLHI PASSAR POR TUDO O QUE EU PASSEI... Eu juro que eu tentei ser um mortal comum...mas falhei.

-Peter... -Helena está chorando.

- EU... -minha voz vacila. - Eu só quero...ter a chance...de amar e ser amado. Mesmo que eu dê o meu amor para uma mulher que não seja você.

Nos encaramos por alguns minutos, que parecem ser horas. Estou ofegante. Acho que nunca fui tão sincero com ninguém, muito menos comigo mesmo em todos esses séculos de existência.

Sinto a carga de adrenalina baixar nas minhas veias e uma fraqueza me toma. Eu tenho que me escorar na parede, pois estando tendo dificuldade de manter em pé aqui.

Helena está calada e vejo lágrimas rolando pelo seu lindo rosto. Sinto-me mal por ter soado tão cruel e de certa forma dramático.

Enfim, essa discussão não vai nos levar a lugar nenhum então, decido por um fim nisso de uma vez por todas.

-Helena, se você gosta mesmo de mim...-eu hesito e olho uma última vez para seu rosto.

Ela treme e me olha apreensiva. E eu finalmente, reúno a pouca coragem que tenho e digo:

- Não me procure mais. Isso não é um pedido. - a minha voz vacila outra vez. - É uma ordem! -eu tento me manter firme.

Não consigo encará-la, mas posso ouvir um suspiro decepcionado e um soluço. Meu coração está em pedaços!

"Eu sou um covarde mesmo!"

Enfim, eu abro a porta e espero ela se movimentar. Helena vem em minha direção e faz menção de tocar o meu rosto, mas eu seguro sua mão antes que isso aconteça. Ela me olha com indignação em seus olhos.

Helena passa por mim, para na frente da porta de costas para mim, direcionando o seu olhar uma última vez. 

- Quando você aprender a se amar, as pessoas ao seu redor vão te amar do jeito que você é, Peter.

Ela termina a sua frase ( que vai com certeza ecoar na minha mente até o dia que eu enlouquecer e desistir de tudo) e desaparece deixando o seu perfume adocicado para trás, como uma última lembrança, mas que logo se esvai.

Começo a sentir o pesar das minhas palavras e um desejo enorme de correr atrás dela e agarrá-la e pedir perdão me invade, mas é tarde demais.

Dessa vez, fui eu quem a afastou e...foi para sempre.


Lua de Sangue - Is It Love? Viktor BartholyOnde histórias criam vida. Descubra agora