CAPÍTULO 4

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L E V I

Levo meus dedos agora menos trêmulos a acariciar o rosto de Sara que após me doar sem receio todo o seu corpo, caiu em um sono profundo, como acontece todas as vezes em que venho até ela. Me sinto aliviado por ela ter um sono pesado, isso a priva da decepção de me ver indo embora, deixando sua cama como se eu fosse um homem casado que depois de usar a amante sai como se nada tivesse acontecido, voltando para os braços da esposa como se ela fosse a única mulher em sua vida.

Não sou casado e Sara muito menos é minha amante. Sendo franco, eu nem sei oque somos um para o outro. A única coisa que tenho certeza em meio a tantas dúvidas é que o anjo adormecido em meus braços é a pessoa que mais desejo nesse mundo. Desejo que Sara seja minha, só Deus sabe o quanto realmente desejo, mas o destino sempre dá um jeito de não atender às minhas súplicas.

O grande vilão da minha história é o destino.Ele sempre está à espreita, esperando a hora certa para puxar o tapete sobre meus pés e me fazer cair de uma forma dolorosa. Por inúmeras vezes já me machuquei, mas nada me machucaria mais do que ficar longe de Sara.

Apesar de ser um ser humano, assim como todos nós, ela tem um grande poder sobre mim, por isso escolhi vir em sua casa ao invés de parar em um bar e beber até não lembrar meu próprio nome. Quando acordei suado com meu corpo pedindo por bebida eu comecei a respirar fundo, foi aí que levei minha mão ao peito que estava ofegante e senti o anel de Sara preso em meu cordão, fazendo seu rosto angelical invadir meu campo de visão.

Me agarrando à sua imagem que tanto admiro, peguei a chave da minha moto para poder vir até aqui. Sim, eu quebrei meu protocolo e não sei qual será a consequência que esse meu primeiro deslize poderá trazer. Eu não pensei nisso na hora, não pensei que bater na porta de Sara dois dias depois que estive aqui pudesse trazer falsas esperanças para ela e agora esse pensamento martela em minha cabeça, mas para o bem dela, eu torço para que ela não tenha pensamentos precipitados diante da minha aparição fora do tempo.

- Me desculpe Sara - sussurro antes de deixar um pequeno beijo em sua bochecha e por o pequeno pedaço de papel com uma frase para ela em cima do criado mudo...

Estou indo embora e não estou levando comigo apenas o cheiro da mulher angelical que me permitiu desfrutar de seu corpo, no bolso da minha calça está seu par de brincos delicados, mais uma peça que irá se juntar a várias outras que tenho dela.

Após trancar a porta e passar a chave por baixo, fico ali, ainda abaixado, perguntando repetidas vezes para mim se ir embora é mesmo oque eu quero. A resposta não vem logo, mas quando meus olhos param em minhas mãos trêmulas eu constato que sim,eu realmente tenho que ir.

Mesmo que eu já esteja no meu limite me sentindo sedento por álcool, eu não vou pegar minha moto para ir até um bar. Vou para casa sem olhar para os lados. Eu sei que vou sofrer, que o meu vício vai a todo custo querer me fazer ceder, mas mesmo assim estou disposto a tentar.

Vou me fazer de surdo diante dos gritos que meu vício dará, implorando para ser alimentado. Não vou ouvi-lo.

Eu não vou!!

(...)

Me sento na cama esfregando as mãos rudemente em meu rosto. Não estou aguentando mais!! Agora já é outro dia, oque significa que não jogo álcool para dentro do meu corpo a mais ou menos um dia e assumo como um fracassado que isso está me matando.

Eu queria tentar ser forte pelo menos uma vez na vida, queria continuar dizendo não para a tentação que me assombra, esse é o meu desejo, mas julgar o protesto que meu corpo faz pedindo por bebida é só uma questão de tempo para que eu sucumba.

- Está tudo bem Levi? - Não me surpreendo quando ao botar meus pés na cozinha encontro Lola, preparando alguma coisa para eu comer. Ela sempre faz isso por saber muito bem que a única fonte de carboidrato que meu corpo vê é a maldita bebida.

- Sim, está tudo bem - omito indo me sentar em um dos bancos perto do balcão - Você não precisa ficar vindo aqui todos os dias, você tem sua vida Lola, não pode deixá-la viver para cuidar de mim.

- Você estava com Sara ? - solto um longo suspiro quando Lola ignora totalmente o que acabei de falar, fazendo uma jogada mais esperta onde o assunto principal é a mulher para quem fui correndo ontem.

Lola sabe que não resisto quando estamos falando de Sara. É assim que ela consegue arrancar tudo de mim sem precisar de muito.

- Sim....Eu acordei no meio da noite querendo secar todas as garrafas de bebidas desta casa, mas quando levei a mão ao peito e senti o anel dela pendurado em meu cordão, eu só tinha uma coisa em mente, ir atrás da mulher que magicamente faz minha vontade por álcool ser menor.

- Isso é ótimo!! Sara pode ser sua grande ajuda, Levi, você precisa...

- Nem pense nisso!! Já disse que não quero arrastar Sara para o olho do furacão. Será que é tão difícil assim você entender isso, Lola ? Você mais do que ninguém sabe o peso que é se preocupar com um alcoólatra, ainda mais um fraco como eu.

- Você não é um peso para mim... - sinto como se alguém tivesse me golpeado no estômago, quando Lola para oque está fazendo e levanta seu olhar magoado para mim, me partindo ao meio - Você é meu irmão e eu te amo Levi, então não, se preocupar com a pessoa amada não é um peso, mas sim um ato de amor.

Droga!!

Mais uma vez eu estou agindo como um idiota, fazendo a única pessoa que tenho no mundo chorar por causa das palavras que falo sem pensar. Eu amo minha irmã, sou capaz de dar a vida por ela, assim como sei que ela também faria isso por mim. Mesmo que ela não entenda, esse é só o meu jeito torto de protegê-la da dor. Não quero que ela sofra quando um dia qualquer ela entrar em meu quarto e me achar morto.

Não, não estou exagerando, apenas estou sendo realista. Não perco tempo nutrindo esperanças onde em um futuro próximo eu venha a me curar. Isso não!! Prefiro encarar a verdade do que me iludir com a mentira, muitas vezes usada para amenizar a dor de alguém, mas no final esse sentimento dilacerante acaba vindo do mesmo jeito e eu diria que de uma forma bem pior.

- Lola... - chamo baixinho por ela que agora está chorando, mantendo suas mãos no rosto, como se isso fosse o suficiente para abafar o barulho do seu choro - Me perdoa, por favor. Você sabe que eu te amo mais do que a mim mesmo, eu só estou tentando te empurrar para longe para te proteger - puxo ela até mim, envolvendo minha irmã em um abraço apertado, mas Lola se esquiva, para ficar me encarando, suas mãos pegam as minhas que estão trêmulas exatamente como estavam ontem a noite.

- Você está sofrendo - afirma fechando os olhos para depois voltar a abri-los e me encarar como nossa mãe fazia toda vez que a preocupação batia cruelmente em seu corpo - Sinto tanto quando olho para você e te vejo assim, Levi. Seus olhos estão vermelhos e você sabe o que isso significa...

- Sim, eu sei - assumo me afastando de Lola, ficando de costas para ela - Isso significa que estou chegando ao meu limite. É questão de minutos até que eu perca o controle e comece a beber.

Lola escolhe o silêncio, me deixando mais aliviado por ver que não vou precisar ficar aqui ouvindo sempre as mesmas coisas que ela me diz, que também me levam a ser repetitivo no que sempre lanço em sua direção.

Como era de se esperar Lola vai embora, me deixando como companhia apenas o meu vício maldito que me faz correr até o armário e pegar logo duas garrafas de bebidas. Como um cachorro sedento eu abro uma delas, despejando quantidades exageradas do líquido que desce pela minha garganta sem me incomodar com seu gosto agressivo. Já estou tão acostumado que parece que estou bebendo água e não vodka.

Fecho os olhos sentindo o alívio invadir meu corpo, mas também sinto a tormenta afogando minha alma por ver que não importa o quanto eu me esforce no final das contas eu vou sempre terminar do mesmo jeito.

Bêbado!

Tudo Começou Com Um Olhar #2 Onde histórias criam vida. Descubra agora