POV Liana Romano
Dia vinte e três longe de "casa". A saudade me corroía pouco a pouco, as noites regadas à whisky e as manhãs ardentes de ressaca são frequentes. Não sou mais a mesma mulher que saiu de Nova York há quase cinco meses atrás. Minha aparência estava horrível, meu cabelo ressecado e embolado, olheiras enormes se apossavam do meu rosto, uma palidez extrema e alguns quilos à menos.
Eu estava acordada há umas duas horas mas me recusava à me levantar da cama. Encarando o teto e escutando minha mente barulhar. Pensei em várias coisas para ocupar minha cabeça, faculdade, trabalho normal, com pessoas normais e problemas normais, um curso, talvez? Mas não. Meu rosto sempre estará estampado pelas ruas da ilha de Manhattan.
O silêncio dessa enorme mansão me permite ouvir tudo, até demais. Ontem mesmo presenciei uma cena imperdível da sacada da adega no segundo andar. Um casal discutindo arduamente, o cenário era divino, rolou até umas coisas quebrando, épico.
Me levanto e caminho lentamente até a sacada do meu quarto, tento bloquear a luz do sol com o braço e vejo um entregador de correspondências depositando um envelope na caixa do lado de fora da casa. Ligeiramente estranho, afinal, os "donos" desta casa foram dados como mortos e a propriedade diante da lei estava tombada, o que descobri esses dias, ser mais um dos planos de Hard. Ele saberia que eu precisaria deste imóvel.
Espero o homem sair de lá e depois caminho rápido demais até a bendita caixa. Eu sinceramente não estava nem aí se me vissem, ultimamente estou com um humor que, quem se aproximar, morre. E uns vizinhos presenciaram isso num dia que estava lavando a Harley e "sem querer" rosnei para eles. Estavam encarando demais.
Abro a caixa e retiro o envelope de lá. Caminhei de volta para dentro da casa analisando o papel, na parte de trás não havia nada escrito, porém, quando virei a frontal do mesmo, quase engasguei com o meu próprio ar. No feixe, o brasão da Cosa Nostra estava estampado sob uma cera preta.
Corri até a mesa da sala de jantar e me esparramei em uma das cadeiras. Não é possível. Depois de quase um mês?!
Abro devagar o papel amarelado e retiro o total de cinco folhas de lá, todas em manuscritos. Me encostei na cadeira e encarei as folhas temendo o que aquilo poderia ser. Poderia ser absolutamente qualquer coisa. Alguns membros do Conselho Maior sabiam de minha "profissão" e poderiam estar tentando me contratar, ou seria mais um daqueles eventos idiotas? Poderia ser Pietro? Luca? Não. Impossível. Todos eles tem meu número de celular. Resolvo espantar as dúvidas para matá-las logo.
Pego o primeiro papel. Não estava totalente preenchido, apenas algumas frases que não formavam mais que dois parágrafos. Passo os olhos pelas demais e concluo que todas estão assim. A presente em minhas mãos dizia.
"Sempre seja você. A Lia que eu conheço não suportaria a ideia de ficar mais de uma semana sem correr com sua Harley por aí"
Era isso e mais algumas merdas totalmente irrelevantes. Agarro a segunda folha.
"Lembre de seus princípios e de sua determinação. Lia não desiste de nada, não será agora que desistirá"
Engulo em seco e uma vaga memória de uma conversa com Rosa me remeteu essas palavras, não com essa exata entonação, mas foi algo assim. Sorri com a lembrança. Apanho a terceira folha.
"De todas as coisas que já passou, de tudo o que já te aconteceu, é assim que irá acabar? Com você se entregando e desistindo?"
Ramon costumava me dizer isso. Todas as vezes que eu queria parar de treinar e queria desistir das sequencias de golpes que ele tentava me ensinar. Seria mesmo possível isso?!
VOCÊ ESTÁ LENDO
Gatilho
RomansaCriada e treinada especialmente para matar, Liana Romano é contratada para auxiliar Pietro Ricci, chefe da Cosa Nostra que precisa de alguém para fazer o serviço sujo por ele. Apesar da máfia Italiana ser conhecida por sua crueldade, Pietro queria m...