— Como você poderia saber dessa entrada? E AQUILO É UMA GRANADA?
Anabele tentava organizar seus pensamentos. Haviam caminhado durante muito tempo seguindo a muralha. Estavam agora dentro de uma velha casa comum como todas as outras. Ninguém parecia morar lá.
Henry entrou na sua frente e deu de ombros.
— Eu caminho por aqui. Acabei descobrindo, por acaso. E não deve ser uma granada.
— Você vinha dessa direção na noite em que vimos o fogo — lembrou Anabele, desconfiada.
— Sim, voltava desse lugar. Foi quando descobri.
— Como? — Ela estava séria.
Henry suspirou, cansado.
— Ando muito à noite, como você já deve ter percebido — contava ele, rapidamente, com indiferença, da mesma forma que havia contado o relato de Clara. — Um dia percebi essa casa vazia e entrei, curioso. Fui entrando e mexendo. Percebi que havia um tapete, o que não é comum, e o levantei. Encontrei essa porta, passei por ela, caminhei por um longo túnel e quando percebi, estava do outro lado da muralha.
— Por que haveria essa passagem aqui? Os singulares não arriscariam que isso fosse encontrado.
Henry riu.
— E que risco isso traria a eles?
Anabele percebeu que ele tinha razão. Os ordinários viviam como se estivessem em um constante transe. Jamais saíam de sua rígida rotina de sobrevivência: trabalhar, comer e dormir.
E além disso, caso alguém encontrasse, o que um ordinário desnutrido poderia fazer? Passaria pela muralha e seria abatido no território deles. A passagem não era útil para que ordinários entrassem na capital, mas poderia ser se algum singular quisesse sair. Não que isso fizesse algum sentido.
A província não era atraente o suficiente para eles. Mas o que sabia ela? Não entendia e jamais poderia entender como os singulares pensavam e agiam.
Foi chamada de volta à realidade com o toque de Henry. Uma de suas mãos afastava o cabelo negro que caía sobre seus olhos verdes.
— Ane, se um banquete tivesse realmente que ser feito, deveria ser feito para você — Anabele mostrou sinais de confusão.
— Do que você está falando?
— Eu sei sobre a comida que você deixa por aí — Anabele enrubesceu, surpresa. — Sei também sobre seu cachorrinho.
Ela deu um passo para trás, mas Henry estava sorrindo.
— Como você descobriu?
— Descobri até uma passagem direta até a capital. Você acha que eu não descobriria que você esconde um cachorro? — Ele riu. Anabele, tensa por tantos minutos, acabou rindo também.
— Por favor, não conte para ninguém. As pessoas o entregariam à capital em um piscar de olhos por mais água. Ou o comeriam — Anabele fez uma careta com a sugestão.
— Quando formos casados, ele vai morar com a gente. Gostei dele — Henry deu uma piscadela.
— Casados?
— Sim. Não se esqueça de que conheço seus segredos. Se você não quiser por bem, posso chantageá-la — Henry agora sorria da forma mais charmosa que Anabele já tinha visto. Aproximou-se perigosamente e a tocou no rosto. — Achou que eu estava brincando quando falei sobre estar apaixonado? — Diante do silêncio tímido de Anabele, continuou. — Você deve ter aprendido alguma coisa comigo. Não acrescentei nada a sua vida? — perguntou, ainda sorrindo.
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Sombras do Medo
General FictionEm um futuro pós destruição em massa, provocada pelas guerras humanas e desastres naturais - para os quais os humanos também contribuíram grandemente - o mundo é dividido em 5 grandes regiões. Em cada uma delas vivem ordinários e singulares, pessoas...