Capítulo 37

3 0 0
                                    


Anabele aguardava com a família e Davi, teimosamente prostrado a seu lado, sua vez de entrar no abrigo. Estavam em um imenso barracão com fachadas de aço. A escuridão que inundava o lugar tornava impossível uma real observação.

A sensação, contudo, era de estar em um local extremamente amplo e vazio. Os únicos sons que se ouviam eram os passos de milhares de ordinários, tentando controlar a respiração, apreensivos demais para fazerem mais do que andar.

De vez em quando, barulhos da batalha que era travada lá fora irrompiam o silêncio, sobressaltando as pessoas, como um lembrete — desnecessário — de que não estavam seguras.

Dentro do lugar, soldados usando lanternas formavam três corredores por onde pessoas encaminhavam-se. No final de cada um deles, via-se uma porta no chão, como a que fechava o túnel que ligava capital e província. Logo Vincent desceu, lançando antes um olhar de ódio para Davi. Em seguida, chegou a vez de Amanda. Anabele segurou sua mão enquanto começava a descer as escadas.

Com uma olhada rápida para baixo, por onde os degraus se estendiam, Anabele ficou surpresa com a claridade que viu. Vozes animadas vinham de lá.

Lembrou-se do abrigo improvisado que haviam montado há algumas horas nas pequenas casas da província e sentiu-se corar.

Mesmo sem conhecer o abrigo que estava prestes a entrar, podia apostar que ele, subterrâneo e nunca antes utilizado, seria o suficiente para abrigar e sustentar todos os ordinários com mais conforto do que haviam tido em suas velhas casas.

Anabele sentiu a mãe apertar sua mão.

— Querida, faça o que tiver que fazer. E lembre-se... ainda que amem, todos erram. Você tem dois exemplos claros disso. Só tente reconhecer aqueles que erram tentando acertar e ressentem-se por tê-lo feito. Esse é o tipo de erro com que você pode conviver.

Anabele balançou a cabeça confusa.

— Do que você está falando, mãe?

Antes que Amanda pudesse responder, um soldado vociferou:

— Desça logo. Vocês terão muito tempo para conversar lá embaixo.

Amanda soltou a mão de Anabele e começou a descer as longas escadas. Antes que desse dois passos, contudo, voltou-se uma vez mais.

— E, ah, Anabele. Sinto-me... boa. Acho... que é a nossa escuridão que os alimenta.

E continuou descendo, deixando as palavras dançando na cabeça de Anabele.

— Pode ir — disse, secamente, o mesmo soldado, indicando a vez de Anabele descer para o abrigo.

Ela assentiu, mas se sentiu sendo puxada para fora da fila, e por algum motivo, não reagiu. Esperou que parassem.

Após alguns minutos, haviam se afastado das enormes filas, embora ainda estivessem no interior do abrigo. Ali a escuridão era mais densa, já que as lanternas dos soldados quase não os alcançavam.

— Desculpe fazer você ficar na fi la o tempo todo à toa.

— Você já desperdiçou meu tempo de formas piores.

Davi abaixou a cabeça.

— Suponho que você tenha razão.

— O que você quer? — perguntou Anabele, repreendendo em pensamento o próprio coração por bater tão descompassadamente.

Sombras do MedoOnde histórias criam vida. Descubra agora