INTERLÚDIO - HANS- Porque eu te amo.
Eu disse com toda transparência porque era verdadeiro. Como resposta, recebi o silêncio. Seu rosto petrificado era a prova de que Heloísa não esperava ouvir isso.
Tive vontade de contar tudo, não deixar nada de fora, incluindo o meu ponto de vista. Mas não seria prudente. Não cabia a mim atropelar as etapas da sua evolução. Ela ainda precisava processar e aceitar as recentes lembranças. Isso poderia levar tempo. Eu não me importava, não fazia mal desde que ela e Helena estivessem bem. Eu só queria que Helô soubesse que, a todo custo, eu permaneceria ao seu lado, assim como no passado ela teimou em ficar comigo.
Nunca me esquecerei da sua insistência, das suas loucuras e provocações que me levavam ao limite. Quando eu pensava que poderia ter um pouco de paz, que poderia controlar a minha vida sem dar satisfação a ninguém, quando as coisas começavam a ficar confortáveis demais para mim, Heloísa chegava e confundia tudo. Os meus conceitos eram derrubados e, por mais que eu resistisse, uma hora eu baixava a guarda totalmente enfeitiçado por ela.
Demorei a admitir que suas intervenções eram o melhor que me acontecia. Não foi simples de aceitar. Jamais imaginei que minha maior fraqueza viria ser a menina que um dia carreguei nos braços.
Na sua infância, eu achava engraçadinho quando ela se fantasiada de Cinderela e dizia que um dia se casaria comigo. Quem levaria à sério aquela paixonite? No meu entendimento era algo passageiro e inocente. Sendo assim, eu dava batidinhas no topo da sua cabeça e dizia "Tá certo, um dia a gente casa.". Eu não queria ser cruel com uma criança, acreditava que com o passar dos anos ela saberia distinguir os tipos de amor que uma pessoa pode sentir.
Mas isso nunca aconteceu.
Suas certezas só aumentavam com o passar do tempo. Ela entrava na puberdade bastante convicta de que um dia ficaríamos juntos. Incomodado, precisei mudar o modo de me relacionar com ela. Não cortei nossos laços por completo. Continuávamos amigos. Ainda íamos ao estádio de futebol e compartilhávamos interesses em comum. Mas ignorei seus disparates, fingi não os ouvir. Também aboli os toques e qualquer outro tipo de carinho fraternal semelhante ao que eu dava às minhas irmãs, Karen e Anelise.
Essa minha nova maneira de agir não passou desapercebida por minha prima, que de início, não disse nada. Ela apenas me olhava desconfiada. Minha falha foi pensar que eu estava no controle da situação. Subestimei aquela que sempre foi astuta, uma exímia estrategista.
Foi só surgir uma nova mulher na minha vida para que a verdadeira Heloísa entrasse em ação. Nossos atritos passaram a ser frequentes. Ela gritava, eu ficava nervoso, ela dizia sandices, eu a feria com palavras duras, ela chorava e o meu coração amolecia. Por fim, a gente sempre se desculpava.
Isso virou um ciclo, uma nova etapa da nossa convivência que um dia foi saudável.
Helô conseguia a proeza de espantar as namoradas que eu apresentava à família. Cada uma delas da forma mais criativa que uma mente capciosa poderia planejar. Eu mal tinha a chance impedi-la porque seus passos estavam sempre à frente dos meus atos.
Mas não foram suas atitudes infantis que me alertaram do perigo eminente. Por incrível que pareça, foi Fernanda, uma namorada que tive nessa época. No dia que terminamos nosso relacionamento, ouvi algo que soou como um grande absurdo.
- O problema não é a Heloísa. O problema é falta de uma atitude mais firme da sua parte, Hans. Seu comportamento me dá a entender que você não faz questão de manter uma relação duradoura com nenhuma mulher porque no fundo, lá no seu subconsciente, espera por ela.
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