HELOÍSA
– Mas é claro que ele viria atrás de mim! – falei depois lançar uma olhadela para trás. Descalça, eu pisava duro no chão úmido e cheio de folhas mortas. – Que inferno, Hans! Me deixa em paz!
– Dá pra parar de entrar dentro dessa mata? Você pode se perder, cortar o pé e ser picada por algum bicho!
– Vai cuidar do sangramento da doutora mocreia e me esquece! – acelerei os passos depois desviar de uma porção de galhos finos que se encontravam enroscados em troncos maiores.
– Heloísa, pare de agir assim! Se controla! – sua voz parecia cada vez mais próxima. – Volta aqui, menina!
– Não me chama de menina! Há muito tempo deixei de ser uma!
– Mas, fugindo assim, você se comporta como uma menina! Volta pra fazenda e resolva suas coisas como uma mulher!
Imediatamente parei de andar e virei de frente para ele.
– Vai se ferrar, Hans!
Meu grito assustou alguns pássaros, que bateram asas para longe. Hans aproveitou a minha parada e me alcançou. Segurando as laterais de braços, ele se encurvou na altura do meu rosto e, num misto de complacência e severidade, falou:
– Quero te ouvir. Diga o que aconteceu, mas diga com calma. Você sabe que eu acreditarei em tudo que me disser.
Era fácil me ludibriar com sua atenção e aparente compreensão. Mas isso precisava mudar! Eu tinha que ser forte! Do que adiantaria acatar o seu pedido se no final ele não voltaria para mim? Do que adiantaria bancar a equilibrada se ele tinha transado com outra?
Estava tudo errado! Ele não percebia isso?
– Eu te odeio! Te odeio! – comecei a vociferar e dar murros em seu peitoral enquanto ele me envolvia em seus braços. – Você contou pra ela! Contou sobre mim! Sobre essa maldita doença! Como se não bastasse a merda que é tomar esses remédios, deixar meu pai preocupado e levar a porra de uma vida saudável, agora estou exposta! Humilhada! O que deu na sua cabeça pra ficar se abrindo com os outros? Você não é assim!
– Nunca mencionei o seu nome. – Ao contrário de mim, ele falou baixo, bem próximo ao meu ouvido sem afrouxar o abraço.
Não somente seu aperto, como também sua atitude ponderada reteve meus movimentos. Contudo, a revolta que me sacudia por dentro se manifestou através da minha voz, que agora estava iradamente rosnada.
– Mas acontece que sua parceira de foda não é burra. Bastou ficar amiguinha da sua irmã e fuçar nas minhas coisas para ela entender tudo!
Então ele me encarou e disse com segurança:
– Ela não é minha parceira de foda.
– Não mente, Hans. Eu te conheço, seu cretino...
– Saímos algumas vezes sim, mas acabou. – Mantendo o olhar firme, ele me soltou de seus braços. – Nos tornamos amigos e hoje não existe mais nada entre Pamela e eu. Isso é tudo que você precisa saber.
Assim que ele terminou de falar, não me contive e meti a mão bem aberta em seu rosto. Me surpreendi comigo mesma por escolher um tapa na cara no lugar de um soco. A verdadeira Heloísa jamais se defenderia de um jeito tão feminino. Eu sabia como fechar o punho e atingir em cheio a ponto de quebrar o nariz de qualquer adversário. Talvez, no fundo, minha intenção nem fosse agredi-lo fisicamente. Aquela bofetada poderia simplesmente representar o meu ressentimento.
– Está pensando o quê? Que sou trouxa? Você trepa com outra e quer vir me cobrar sanidade? Você me coloca de molho porque deve pensar que ninguém me quer, que por eu ter problemas psiquiátricos ninguém se interessará por mim. Engano seu, Hans! Eu atraio olhares! As pessoas dão em cima de mim e me chamam para sair. O que não falta é homem que adora uma louca varrida cheia de tesão. – Aproximei nossos rostos e com um sorriso maldoso, concluí: – Afinal, você sabe mais do que ninguém que eu topo tudo na cama.
