Capítulo 45: Abismo

40 3 0
                                    

Mais duas semanas se passaram sem notícias de Hyuk. Ele ficou incomunicável! Confesso que suportar a sua ausência foi muito difícil para mim. O pior era imaginar o que estaria acontecendo. Será que retornaria casado? Tinha que pensar na possibilidade. Nos últimos dias, as ligações de minha prima Raquel foram diárias. Ela percebeu o quanto eu precisava desabafar. Necessitava ser ouvida da mesma forma que ouço os pacientes da clínica. Eu sabia a importância disso e valorizava esses momentos. Confio muito em minha mãe, mas não consegui me abrir com ela sobre Hyuk. Sentia-me uma boba por isso, mas a verdade era que simplesmente não conseguia. Raquel me fazia rir em meio às minhas lágrimas, ao fazer comparações com os dramas coreanos. Falei muito com o Pai também e o agradeci por ter me presenteado com a amizade de uma adolescente. Era como se ela fosse minha irmã. Antes de descobrir o meu novo sentimento por Hyuk, eu o considerava como meu irmão mais novo, mas agora não! Como as coisas mudam! Agora era impossível vê-lo assim.

As lembranças eram muitas! Na primeira vez que o vi, os olhos mais lindos do mundo inteiro estavam cheios de lágrimas por culpa de seu pai... Nossas aulas, sorvete de creme com cobertura de chocolate, Scooby-Doo, as palavras na língua coreana, sua ausência quando ainda era uma criança, o retorno, as decepções com o pai, com os avós, seus desabafos, culinária coreana, seu talento musical, a escola Vida e Esperança, o beijo, Sandara, sua ausência... Será que não teríamos mais lembranças?

Era quinta-feira e eu já estava acomodada em minha cama. Lia um livro sobre psicologia infantil que ganhei do doutor Nicolas. Era um lançamento de sua amiga de muitos anos. No dia anterior, ele me convidou para acompanhá-lo ao evento literário, mas não me sentia bem. Cólica menstrual. Hoje, ao chegar à clínica, recebi o presente. A autora foi muito feliz ao desenvolver o tema "Inteligência Emocional". Lembrei-me do relacionamento de Hyuk e seu pai ao ler o capítulo sobre carência afetiva. Como gostaria de vê-los bem! Será que isso ainda seria possível? Pai e filho tão distantes um do outro! Os dois perderam muito durante os anos que se passaram. Já fui mais otimista em relação aos dois. Ainda acreditava, mas não me iludia. Creio que Deus pode mudar situações, mas também sei que devemos fazer a nossa parte. O senhor Carlos Eduardo permitiu que o ressentimento o afastasse de seu filho. Um abismo se formou entre eles. Tentei ser a ponte, mas não obtive sucesso. Agora a carência afetiva de seu filho era suprida pelos avós e não de uma maneira sadia. Ou será que isso era algo da minha cabeça de mulher apaixonada? Queria acreditar que Hyuk só permitiu a aproximação de Sandara para ficar bem com os avós. Será que era isso mesmo? Os avós se aproveitaram da situação para demonstrar autoridade. Não foi possível controlar os sentimentos da filha, mas agora controlavam o neto. Fechei o livro. Tinha que pensar em Hyuk? Passei a semana me policiando. Até minhas conversas com Raquel mudaram! Falávamos sobre tudo, menos sobre meus sentimentos. Meu celular tocou. Com certeza era Raquel. Transmissão de pensamento? Olhei para o visor. Não era Raquel. O meu coração acelerou. Respirei fundo e atendi a ligação.

— Já estava dormindo? Se a acordei... peço desculpas! — Ah, meu Deus, que saudade daquela voz! — Eu... é... Você está bem, Anne?

— Você não me acordou... Eu estou bem! — Foi bem difícil controlar a voz. Trinta e cinco dias sem notícias. Parecia que fazia uma eternidade que não ouvia a voz de Hyuk! — E você? Está bem? — Na verdade, eu queria perguntar: "Por que não deu notícias? O que aconteceu? Você e a Sandara... Estão casados?" Não, eu não queria fazer a última pergunta porque estava com muito medo da resposta.

— Estou bem. — respondeu simplesmente. Silêncio. Não sabíamos o que dizer. Era estranho. Eu precisava fazer alguma coisa, ou melhor, falar alguma coisa, mas o quê? "E aí, como foi a cerimônia de seu casamento?". Foi Hyuk quem quebrou o silêncio constrangedor. — Acho que é melhor eu desligar... Não liguei em uma boa hora.

— Não desligue. — Vamos, Anne, você consegue! — E a sua mãe? Está bem? Vocês chegaram quando? — Pelo menos agora ele tinha algo para falar.

— Ela está bem. Chegamos ontem. — Silêncio novamente. É, estava mesmo complicado. Os meus olhos se encheram de lágrimas. Só faltava essa! Agora seria quase impossível falar com naturalidade. Respirei fundo. Meu Deus, como atravessar o abismo que nos separa? — Peço desculpas por ter ligado. Boa noite! — Ele desligou e eu deixei as lágrimas caírem livremente.  


Anne e HyukOnde histórias criam vida. Descubra agora