Capítulo 5: Menino talentoso!

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Dois meses depois de minha primeira "aula", Hyuk me fez ficar de boca aberta. Ele ainda se recusava a ler o meu livro. Nossa tardes se resumiam a assistir desenhos (não só Scooby-Doo, Pica-Pau e outros que o meu amiguinho gostava), conversar, leituras (realizadas por mim!) e andar na parte externa da mansão. Só que em uma tarde de outono, ele disse que tinha uma surpresa para mim.

— Meu pai viajou ontem e ficará alguns dias longe. Está nos Estados Unidos! — Ele me informou animado. — Anne, preciso mostrar algo especial para você, venha comigo! — Ele segurou a minha mão e me puxou.

— Ei, calma! O que deseja mostrar?

— Venha, noona! — Eu o acompanhei. Andamos pelo corredor comprido e após passarmos por cinco ou seis portas, ele parou e sorriu para mim. — Chegamos! — Ele tirou uma chave do bolso de sua calça. Hoje ele vestia uma calça jeans e camisa polo, mas na maioria das vezes, usava roupa social. Hyuk abriu a porta. — Anne, feche os olhos, só os abra quando eu falar, está bem? 

— Eu concordei, mesmo detestando andar de olhos fechados. Ele me conduziu. — Não abra ainda, noona! Aqui tem uma cadeira bem confortável, sente-se! — Ele me ajudou. — Isso, agora só espere um minuto. — Ele se afastou. Ouvi o barulho da porta sendo fechada.

— Hyuk!

— Calma, só um minutinho! — Ouvi os seus passos e instantes depois, ouvi algo maravilhoso! Era som de piano. Eu abri os olhos e fiquei de boca aberta. O meu amigo estava diante de um piano. Pense em uma pessoa impressionada e multiplique por 2: Eu! Hyuk tocava lindamente. Meus olhos se encheram de lágrimas. Assim que ele parou, eu o aplaudi, ele levantou-se e agradeceu inclinando a cabeça. Em seguida pegou um violão e começou a tocá-lo. Uau, que menino talentoso! Eu não sei tocar nenhum instrumento, mas gosto muito de música e de cantar na igreja.

— Hyuk, você é muito talentoso! Por que demorou tanto para tocar para mim, hein? — Perguntei quando ele parou de tocar o violão. Eu o aplaudi novamente e ele agradeceu.

— Eu... é que... eu... é... meu pai — ai, ai, ai, ele não vai me dizer que o pai o proíbe! Espero que não! — , é que...

— Pode falar, Hyuk!

— Eu nem podia tocar hoje para você. Esta sala fica fechada o tempo todo. Meu pai me proibiu de entrar aqui. Disse que música é só para perder tempo, deixar as pessoas distraídas — ele explicou e eu fiquei com raiva, ai, esse pai do Hyuk!

— Que ideia mais absurda! Você toca tão lindo... Música faz um bem enorme para quem toca e para quem ouve! Quem o ensinou a tocar? Você entrou em alguma escola?

Foi meste momento que Hyuk  explicou que descobriu o seu talento quando tinha 4 anos. A família fora convidada para um jantar de aniversário de um empresário. Hyuk estava entediado e começou a andar pela mansão do aniversariante. Entrou em uma sala onde havia um piano. Ele sentou-se em uma banqueta e começou a tocar nas teclas. Simples assim! Sua mãe o encontrou minutos depois e chorou de emoção ao perceber que o filho herdara o dom de seu avô materno, o pai de Clarisse. Logo ela descobriu que o menino também tocava violão. O pai de Hyuk comprou os instrumentos. Ficou muito animado, mas quando soube que o talento fora herdado de seu avô materno, aí ele ficou furioso e o proibiu de tocar. Felizmente não tirou os instrumentos da mansão, mas a ordem é que a sala permaneça fechada. Só é aberta para a limpeza semanal. Às vezes a ordem é desobedecida. Felizmente, até hoje, nenhum funcionário comentou com o patrão. Deve ser porque também acham um absurdo aquela proibição!

— Quer que eu toque mais? — É claro que minha resposta foi sim! Hyuk voltou para o piano. Após mais uma música, eu perguntei se ele podia me acompanhar em um louvor que meu pai gostava muito e sempre cantamos juntos. Ele sorriu para mim.

— Você canta Anne? Que legal! Acho melhor pegar o violão... — Ele levantou-se e assim que se posicionou, eu comecei a cantar... "Conheci um grande amigo, ele é filho de Deus Pai, o seu nome é Jesus Cristo, nele a gente pode confiar..."


Foi um momento lindo! Me emocionei muito com Hyuk me acompanhando. Quase não consegui cantar. Depois que terminei, me aproximei de meu amigo e eu o abracei. Foi um momento muito especial para nós dois.

— Hyuk, sei que você tem muito problemas com o seu pai, mas não perca as esperanças! Sou sua amiga e farei tudo o que puder para ajudá-lo, mas sou muito nova, não posso fazer muita coisa, mas tem um amigo que é poderoso, ele sim pode tudo! — Hyuk olhava fixamente para mim. — Estou falando de Jesus! Confie nele, meu amiguinho! Fale com ele.

— Como posso falar com ele, Anne?

— Através da oração. É como uma conversa com um amigo. Hyuk, sempre que desejar, Jesus o ouvirá!

— Isso é complicado, Anne!

— Eu falo com ele sempre. Hyuk, ele já o conhece. Falo com ele sobre você.

— É mesmo?

— Sim, meu amigo! Sabe, Hyuk, há muitas coisas que não entendo, o seu pai, por exemplo, por que impedi-lo de falar coreano e de tocar esses instrumentos maravilhosos?

— E por que ele nunca sai comigo? O seu pai sai para chupar sorvete com você. O meu nem fala comigo, Anne! — Os olhos estavam cheios de lágrimas. Eu deveria ter ficado calada. Era um assunto muito delicado e eu ainda não tinha idade para cuidar de uma situação dessas. Como poderia ter as palavras certas? Neste momento, eu só tive uma ideia. Depois me arrependi por ter falado. E se não fosse possível?

— Hyuk, você quer sair comigo e meu pai? Podemos chupar sorvete e brincar em um parquinho! — Ele arregalou os olhos.

— Anne, se eu pudesse seria o dia mais feliz da minha vida! — Ele disse enxugando as lágrimas com os dedos. Meu coração disparava. Por que eu não pensei direito? E se não desse certo? Era algo simples, pelo menos para mim. Eu fazia isso todos os sábados, mas para o meu amigo seria uma novidade! Se contasse, as pessoas não acreditariam! Um menino, que mora em uma mansão, nunca saiu com o seu pai para chupar sorvete?

Durante o jantar, eu aproveitei para conversar com os meus pais. Hyuk ficou com a missão de falar com a mãe. Meu pai logo se pronunciou, minha mãe ficou em silêncio, só nos observando.

— Minha doce Anne, sei que a sua intenção é boa, mas sinceramente não sei se Carlos Eduardo será autorizado a sair conosco.

— Pai, o senhor tinha que olhar para aqueles olhinhos lindos, tinha que ver a alegria! Ah, pai, é tão simples! Poxa!

— Eu sei, Anne, também acho, mas as coisas naquela mansão não são simples. Infelizmente, o pai de Hyuk é...

— Sem coração! Só pode ser isso! Aquele homem nasceu sem coração! — Minha mãe riu. — Verdade, mãe! Não ria, o assunto é sério. Se vocês ouvissem Hyuk tocar! Pai, eu cantei e ele me acompanhou com o violão, foi algo tão lindo! E aquele homem tem a coragem de proibir? Coragem? Ah, isso é covardia, isso sim! — Meus pais riram. — Não sei como os dois podem rir!

— Ah, Anne, linda! Você tem um coração enorme! — Minha mãe acariciou o meu rosto. — O seu pai resolverá isso, fique tranquila.

— Hã? Rute, é assim? Não depende de mim! — Meu pai protestou. — Se autorizassem, eu levaria aquele menino para chupar muitos sorvetes, mas quem sou eu?

— O melhor pai do mundo inteiro! — Eu afirmei e o abracei.

— Isso é covardia! Assim eu nem consigo dizer não.



Trilha sonora:

Sessão nostalgia com Rebanhão "Nele você pode confiar" (eu tive este LP!) e 

uma versão mais atual com Baruk. Não importa a versão, o que  realmente importa  é que sempre podemos confiar em Jesus!

Anne e HyukOnde histórias criam vida. Descubra agora