Capítulo VI

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No ambiente havia algumas mesas sobrando e eles se dirigiram a uma mais afastada, perto de uma janela.
Yan puxou a cadeira de acrílico vermelha para que ela se acomodasse e sentou a sua frente cruzando as mãos sobre a toalha de listras azuis e vermelhas.
Alana mordeu o lábio inferior, fazendo uma careta, ao tempo que aliviava o calcanhar da malfadada sapatilha.
___ Se quiser podemos montar nossos lanches, ali naquele buffet. Podemos colocar tudo o que couber dentro do pão. - ela informou, arrumando, meticulosa, a pasta com os currículos e a bolsa na cadeira ao lado.__ Claro que deve saber, só que como disse que faz muito tempo que não entra num lugar assim...
Quando levantou a cabeça percebeu que ele não prestava atenção ao que dizia, mas aos seus movimentos. Seu olhar impactante fixou-se em sua face. Ela corou, ficando sem jeito.
__ Ah, desculpa. Acho que estou falando demais. Meu pai sempre me dizia que falo pelos cotovelos e...
___ Não. Apenas estou admirando seu comportamento. Você é infinitamente, diferente de Elen. Gosto de seu jeito de ser.
Alana deu de ombros.
___ Minha irmã é bem menos falante.
___ Não me refiro somente a isso, mas em muitos outros aspectos. Você é espontânea. - os olhos escuros a estudaram. __Difícil, acreditar que estou na frente de uma mulher assim. O normal é elas se esforçarem para serem o que não são.
__ Eu imagino que pra você sinceridade e espontaneidade não sejam características com as quais conviva diariamente. Seu mundo é um mundo de emoções contidas, de interesses e bajulações. Estou errada?

__ Chegou ao ponto! - ele se atirou no encosto da cadeira, cruzando os braços.__ É preciso ter faro de cão para descobrir certas coisas.
__ E você tem?
__ No mundo dos negócios é necessário e nas relações, achei que tinha até que  sua irmã me enganou feio!
__ Não acho que tenha se enganado, Yan. - Alana pousou a mão ao lado do pescoço, se escorando num dos cotovelos sobre a mesa. __Quando estamos apaixonados ficamos cegos. Muitas vezes, a pessoa dá as dicas, mas mal percebemos devido a misture de hormônios. Eles nos levam a ter emoções intensas, a sentirmos prazer...e por fim, ao vício. Nossa razão fica suprimida pela montanha russa de emoções.
__ A melhor definição que já ouvi até hoje, para a besteira que fiz, me casando com Elen. - ele riu com suavidade.
__  Eu diria que é a melhor desculpa para amenizar o sentimento de termos sido passados para trás!- gracejou.
__ Está falando na 3° pessoa do plural: nós. Já foi ludibriada pela paixão?
__ Nem imagina como! - sorriu largo. __ Mas isso deixou de ser um problema para mim há tempos.
__ Está falando de seu ex?
__ Sim. Todos os sinais estavam em evidência, mas não vi. Como canta Cássia Eller: o príncipe virou um sapo...
__ "Que vive dando no meu saco
Quem sabe a vida é não sonhar."- ele cantarolou o resto e riu.
__ Sim, acho que é mais ou menos por aí. Sonhos são castelos de areia, que se desmoronam com as ondas ou se desgastam com o vento. Melhor ser racional. Sofremos menos! Alex, digamos, não era adulto o suficiente para uma relação e muito menos para as responsabilidades que ela acarreta. Depois que Mike nasceu, me sentia como se estivesse criando dois filhos.
___ Falando em filhos...Como você está? Desculpa não ter perguntado antes.
___ Conformada. Estou convencida que o tempo vai curar a dor e vai ficar a saudade dos momentos em que o tive junto a mim. Ainda durmo somente sob efeitos de calmantes. O fato de não estar no mesmo ambiente em que convivia com meu filho, está ajudando bastante também. Fran está sendo a família que não tenho mais. - suspirou.___ Alguma notícia de Elen?
__ Meu advogado a contatou para enviar documentos para nossa separação. Sua irmã, assinou, mas não abre mão de algumas coisas.
___ No mínimo quer dinheiro...- levantou o canto do lábio num sorriso sarcástico.
___ Não só isso. Quer ter o direito de visitar a filha. Estou tentando achar uma solução para que isso não aconteça.
___ Não vou defendê-la só porque é minha gêmea, mas acha legal privar Duda de ver a mãe?
___ Acho cruel ela ter abandonado a filha para aproveitar a vida, isso sim! - olhou pela vidraça.
Era óbvio que aquele assunto mexia em feridas que ainda sangravam.
___ Largar a menina foi demais, concordo. Só temo que seus sentimentos e atitudes em relação a Elen, mais tarde, não resultem numa cobrança da parte da pequena. Sabe, os filhos crescem... começam a pensar com a própria cabeça... Por outro lado, conhecendo a peça, desconfio que esse súbito arroubo de maternidade não seja porque se arrependeu do que fez ou porque está com saudades da Duda. Elen sempre tem um interesse por trás de suas ações.
__ É desagradável ter que falar desta forma da mãe da minha filha, mas penso assim também.
A garçonete se aproximou, os fazendo cortar o assunto.
__ Querem pedir alguma bebida?
Yan mexeu a cabeça, como se a indagasse. Alana respondeu de imediato.
___ Sim, eu quero um guaraná!
A moça se virou para Yan, enquanto anotava.
___ O mesmo para mim, por favor!
__ Ok.- disse destacando a comanda e enfiando o bloco no bolso do jaleco vermelho.
Os dois ficaram por segundos vendo a moça desaparecer. Alana respirou fundo.
___ Desculpa, estou me intrometendo num assunto que não me diz respeito... - rolou a bisnaga de mostarda entre os dedos.___ Não tenho direito de julgar suas atitudes como pai. Sei que quer o melhor para a pequena.
___ Já disse que gosto do seu jeito. Quase nunca converso sobre isso com outras pessoas, a não ser com Igor. Mas vindo de você, estranhamente, me sinto confortável em falar. E vamos parar com essa concorrência de quem pede mais desculpas! - ele riu, tentando disfarçar, mas Alana percebia que falar da irmã não era muito agradável para ele.
Ela se mexeu na cadeira, mudando de assunto, sentindo a broca da fome corroer seu estômago.
__Vamos nos servir?
Enquanto montavam o Hot Dog, lado a lado, no buffet, conversavam.
__ Então, Fran me contou que tem sangue romeno e que seu pai é cigano
__ Meu pai era. Morreu há muitos anos.
__ Oh, sinto muito.
__ Fui criado com minha mãe aqui, no Brasil, até meus quinze anos. Depois, voltei à Romênia, para ficar com meu pai e minha avó materna. Eles me ensinaram tudo sobre seus costumes e assumi os negócios ainda muito jovem quando ficou doente. 
__ Por isso fala tão bem o Português.
__ Com minha avó, a regra da casa era usarmos a língua materna dela. Mas ela domina muito bem o Português também. Conviveu com minha mãe por algum tempo.
__E sua mãe? - indagou quando sentaram.
Yan abocanhou um pedaço do hot dog e ela esperou para ouvir a resposta, que veio com um leve dissabor.
__ Meus pais ficaram casados pouco tempo...Ela pediu o divórcio depois de seis anos de casada, mesmo estando grávida. Alguns anos depois, casou com um brasileiro, que é o pai de Igor, mas não moram mais no Brasil. Estão nos EUA. - ele sorriu, passando o guardanapo de papel no canto da boca.__ Não que eu seja supersticioso ao extremo, mas minha vó sempre diz que carregamos, no caso eu e meu pai, uma maldição.
__ Ah, sério? - fez cara de surpresa. __Mas isso é muito comum, acredito eu, entre o povo cigano. A  magia, os encantamentos, as superstições fazem parte. Não acredita nisso? - juntou as sobrancelhas. __E por qual motivo seria a tal praga?
__ Uma hora, se tiver uma chance, te conto. É algo que envolve nossa família, na qual ela acredita, que eu nem em sonho penso em contrariar. Todavia, tenho dúvidas. Pra mim, as coisas acontecem por que têm que acontecerem. Nós fazemos nosso destino.
__ Nossas escolhas...- murmurou.__ É, acho que tem razão. A vida é feita de escolhas. Mas me mata uma curiosidade: sua avó mora em tendas nos acampamentos?
Ele riu com um charme que abalou o psicológico dela. Yan era perigosamente sedutor. 
__ Não é a primeira pessoa que me indaga sobre isso! Somos apenas descendência, embora ela faça questão de manter certos costumes e tradições. Meu bisavô fez fortuna, numa época cheia de preconceitos contra seu povo. Foi um guerreiro. Venceu tudo e todos.
__ Confesso que fiquei curiosa...Afinal, tenho uma sobrinha com sangue romeno. Fui pesquisar. A Romênia parece ser é um país bonito.
__Minha vó mora numa região, onde as paisagens são de tirarem o fôlego. A casa tem vista para as montanhas com seus cumes cobertos de neve. É um lugar importante demais para mim. Aliás, minha avó também é.
As feições másculas e bem feitas assumiram uma expressão deprimida e ele admitiu numa voz inexpressiva:
__ Sua irmã odiou! Hoje, entendo que talvez não fosse só o lugar, as tradições ou as pessoas...Ela não me suportava!
Percebendo o quanto aquele desabafo tinha saído do fundo da alma, Alana o consolou:
__ Talvez, tenha sido complexo para Elen mudar de país e morar num lugar afastado de todas as badalações, as quais estava acostumada. Não foi isso que ela me disse no velório de papai. Nunca tinha visto Elen daquela forma... tão apaixonada!
__ Ela fingia bem, até que numa festa conheceu o atual amante. Um playboy que assim como ela, adora a liberdade. Sua irmã sentia-se presa comigo. Tendo que cuidar de uma criança que não desejou. Como disse, os sinais dela eram claros e só enxerguei o quanto ela estava infeliz, depois que se foi.
__ Yan... 
O chamado feito com voz meiga, o fez procurar seus olhos. 
__  Você ainda a ama? 
Para seu alívio, Yan não se sentiu constrangido com a pergunta, apesar de hesitar um pouco antes de responder.
__ Não sei. Às vezes, penso que o que sinto seja puro orgulho ferido, mas têm dias que sinto sim, a sua falta. Quando casamos eu a amava tanto, que deixei meu coração comandar minha cabeça. 
Alana abriu a boca para falar algo, mas foi cortada.
__Por favor, não tente me dizer nada para me deixar melhor. Aceitar o fim desse relacionamento é um processo penoso e demorado. Não tenho a mínima intenção de esquecer o que ela fez a mim e a Eduarda. 
__ Só queria dizer que entendo o que sente.
Ele bebeu um gole do liquido que restava no copo e Alana achou mais prudente trocarem o rumo do assunto. Falar de Elen, era visível que o desgastava. Lembrou de Fran, dizendo que ele vivia num mundo de amargura e nem de longe, queria demonstrar que sentia pena. Yan não parecia ser homem que admitisse que sentissem compaixão dele.
Ainda ficaram um tempo, por ali, bebericando e falando de coisas triviais até que Yan estacionou em frente ao edifício da amiga.
__Em casa, como prometi há três horas! - gracejou, desligando a ignição.
Alana se desvencilhou do cinto.
__ Obrigada pela carona! - disse com a mão na maçaneta para abrir a porta.
Ouviu a voz macia chamando seu nome.
__ Alana!
Ela virou o rosto.
__ Vou pedir para meu motorista te pegar aqui, quando quiser visitar Eduarda. Me avise, por favor! Não se acanhe de visitá-la todos os dias, se assim desejar. Eduarda, tenho certeza, irá adorar sua companhia. Já te disse, que ela é muito esperta e carinhosa? - inquiriu, com um sorriso no rosto, cheio de orgulho.
__ No mínimo umas cinco vezes hoje!  - ela exagerou na conta, numa brincadeira.__ Sei que ela é tudo isso e muito mais, Yan! Também vou amar conhecê-la melhor! Irei ao hospital todo dia, enquanto não arranjar emprego. E aceito sim, sua gentileza. Não tenho grana suficiente para bancar ônibus todos os dias. Até outro dia! - disse com sinceridade e saiu. 
Alana respirou fundo, parada na calçada, o vendo se afastar. Yan era criminosamente lindo e despertava nela, um instinto desconhecido. Ao mesmo tempo, que deveria querer mantê-lo longe, por ser o marido da irmã, queria aplacar a dor que Elen tinha causado nele. Por trás daquele homem sedutor, parecia ter um menino carente de carinho e compreensão. Ela balançou a cabeça, torcendo a fechadura da porta do prédio, tentando afastá-lo de seus pensamentos.

Na segunda, quando acordou ligou para Fran para ter notícias da sobrinha e assim que se despediu, Alana abriu sua caixa de e-mails e sorriu. Havia três chamadas para entrevistas de trabalho. Duas delas, naquela tarde, numa agência de empregos, não muito longe dali.
Atirou as cobertas longe, indo para o banheiro. Tomou banho, lavou os cabelos e ainda no corredor, ouviu o toque do seu telefone. Atendeu, apesar do número ser desconhecido. Do outro lado da linha, uma voz feminina, pronunciou seu nome com formalidade.
__ Senhorita Alana Mendonça?
__ Sim, sou eu.
__ Bom dia, senhorita! Vou passar a ligação para o senhor Yan Romanov. Por favor, aguarde na linha!
Alana esperou ansiosa e sua respiração pesou ao ouvir a voz profunda lhe cumprimentando do outro lado, com o inconfundível sotaque.
__ Bom dia, Alana! Espero que não tenha te acordado!
Ela mordeu o lábio para segurar o sorriso.
__ Como vai, Yan? Estou acordada faz tempo. Inclusive, já sei da boa notícia. Eduarda já está no quarto! 
__ Sim e está muito bem! Saí há alguns minutos do hospital. Precisei resolver alguns assuntos pendentes com minha assistente. Mas não liguei somente para te dizer isso. Quero conversar com você! Se não tiver nenhum compromisso, vou pedir que meu motorista a traga até ao meu escritório. Já autorizei sua entrada para que ninguém lhe cause constrangimento lhe confundindo com Elen. Ela é persona "non grata" para muitos aqui!
__ Claro. Disponho de quanto tempo para me arrumar até que ele chegue?
__Em quarenta minutos, ele passará aí.
__ Está bem, aguardarei.
Alana desligou o celular e o apertou entre as mãos, olhando fixamente para a janela a sua frente. Seu coração batia numa expectativa faceira e ela, de imediato, foi ao quarto para se vestir.

De repente se deu conta de que não tinha nada apresentável no guarda roupas. Ao menos, nada a altura para fazer uma visita em um escritório, onde certamente, as pessoas desfilavam bem arrumadas. Entre os seus poucos vestidos simples, escolheu o que tinha menos uso. Era de malha de algodão, azul royal, que deixava seus ombros à mostra, num estilo ciganinha. O vestiu, rezando para que ficasse bem em seu corpo magro. Se olhou no espelho e gostou. Tinha ficado perfeito e justamente, porque antes, era apertado nela, que tinha o usado poucas vezes. Calçou as sandálias de salto Anabela, de plataforma em corda, de uma cor neutra, secou os cabelos os deixando brilhantes e os  repartiu de lado, passando uma parte para trás da orelha. Fez uma maquiagem leve e acabava de fechar o perfume, quando seu celular tocou novamente.
__ Senhorita Alana? 
__ Sim.
__ Sou Anselmo, motorista do senhor Yan. Estou a sua espera aqui em frente.
__ Ah, sim. Já estou descendo.
Desligou e jogou seu telefone dentro da pequena bolsa e saiu. Minutos depois, o elevador a levou até o décimo andar de uma das torres da empresa de Yan. Alana adentrou o ambiente finamente decorado e foi recebida pela assistente, vestida impecável, com uma saia reta, que moldava suas curvas e sapatos de salto alto. A moça parecia uma modelo. Esguia, tinha a cor esverdeada de seus olhos ainda mais realçada pela camisa de um tom de verde mais escuro. A maquiagem perfeita e os cabelos avermelhados, lisos e longos, deixavam seus traços harmoniosos. 
__ Senhorita Alana, presumo. - sorriu, usando de uma falsa simpatia para esconder a surpresa dela ser idêntica a Elen.
__ Sim. Vim a pedido de Yan.
__ Por favor, me acompanhe.
Alana a seguiu por um corredor de porcelanato escuro. Parando em frente a uma porta de madeira envernizada, finamente entalhada
A moça bateu, torcendo a fechadura, dando o lado para que Alana passasse.
Yan levantou os olhos da tela do computador, parando em sua imagem, a analisando de alto a baixo.
__ Yan?- ela franziu a testa e chamou, constrangida pelo olhar esmiuçador.
__ Olá! - saiu do transe e sorriu.__ Que bom que aceitou vir até aqui! Tenho uma proposta para lhe fazer!

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