Capítulo 31

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O restaurante não era muito longe da academia, mas não foi por isso que o caminho parecia menos longo.
Durante a viagem, o Max e eu não dissemos nada um ao outro. Desta vez, para aliviar o clima, meteu música no rádio, mas não teve grande efeito. Pelo menos para mim.
Depois de estacionarmos os carros num parque improvisado pelo restaurante, o Edu pediu para esperarmos ali pelo Miguel. Estávamos todos juntos. Tirando eu e o Max, os outros estavam todos numa animada conversa.
Entretanto, vimos o Miguel a chegar no seu carro desportivo. Nesse mesmo instante, olho para a Cams e vejo como ela olha para o carro. Quando o Miguel sai do carro vejo o desejo no seu olhar ao mesmo tempo que morde o lábio inferior. Porém, o desejo no seu olhar dá lugar à surpresa. Sigo o seu olhar e vejo uma morena a sair do lado do passageiro. Ela é bonita. Morena, alta e com uns olhos verdes de arrasar, mas nada que se compare com a minha melhor amiga. Os dois caminham até nós. Reparo que o Lucas e o Duarte não tiram os olhos da rapariga, mas ela nem faz grande caso disso.
-Desculpem o atraso - diz Miguel. - apanhamos um pouco de trânsito. Apresento-vos a Beatriz, uma amiga.
Ao pronunciar a palavra «amiga» a rapariga lança-lhe um olhar desagradável, mas ele nem se dá conta.
-Prazer - diz com um ar superior.
-Bem, se calhar vamos entrando, não? - pergunta o Edu. -Temos que festejar.
Entramos no restaurante e um empregado logo nos leva até à nossa mesa.
Antes de nos sentarmos, vejo que a Cams está com um ar meio tristonho. Por isso, deixo a minha mala numa cadeira a guardar lugar e pego no seu braço.
-Duarte, vamos à casa de banho - aviso ao mesmo tempo que viro costas arrastando a minha amiga.
Entramos na casa de banho e aí a Cams explode.
-PORRA! - grita. -Claro que ele tinha de ter namorada. Ainda por cima boa como o milho.
-Oh... Vá lá Cams - tento acalmá-la. -Primeiro, acho que se fosse namorada não a apresentaria como amiga. Segundo, ela não é assim tão impressionante... Parece uma barbie, para não falar no seu ar de superior.
A Cams debruça-se sobre o lavatório e molha a cara.
-É impossível ele reparar em mim. Ela é toda perfeitinha.
-Bem... Vamos lá ver. Tu és linda. E ao contrário dela, que parece saída de uma fábrica, tu tens uma beleza natural de fazer inveja. Não deixes aquela barbie afetar-te. Se ele gosta dela é da futilidade dela, então é porque não é o rapaz certo para ti. Agora, toca a erguer essa cabeça e a pôr esse sorriso lindo e diverte-te. Estamos aqui para festejar.
A Cams sorri e abraça-me.
-Tens razão. Não vou deixar afetar-me por aqueles dois... Sou melhor que isso.
Juntas, saímos de volta até à mesa onde estavam os nossos amigos. Antes de nos aproximarmos, olho para a Cams. Noto uma certa tristeza, mas ela logo põe um sorriso nos lábios e é como se nada fosse.
Estava tão distraída e preocupada com a minha amiga que nem me apercebi que o Max se tinha sentado na cadeira ao lado da minha. Olho em volta da mesa a ver se ainda havia algum lugar vago e vejo um no topo da mesa ao lado da miss.
-Se quiseres posso eu ir para ali. Não sabia que estavas aqui sentada - ouço o Max dizer super baixo.
O seu tom de voz toca no fundo do meu ser e entristece-me, mas quando levanto o meu olhar para o seu o meu coração desfaz-se. Os seus olhos transmitem mágoa, tristeza, desespero e angústia. Eu estou mal com esta situação, mas ele também não está melhor. Naquele momento, a vontade que tenho de lhe dar um abraço é maior que tudo, mas controlo-me.
-Deixa. Podes ficar onde estás - respondo, enquanto me viro para a frente na mesa.
Durante o jantar, o Eduardo, o Max e o Miguel vão contando algumas dos seus melhores momentos no futebol, nos jogos que disputaram e no fim, antes da sobremesa, fizemos um brinde ao Eduardo e desejámos-lhe a maior sorte na equipa principal.
De vez em quando ia olhando para a Cams. Estava a divertir-se, mas por vezes deitava olho ao Miguel. A Miss Barbie reparava e, para picar a minha amiga, agarrava-se ao rapaz e esfregava-lhe o braço. Para azar da minha amiga, ele não a afastava. Para azar da Barbie, ele não lhe ligava nenhuma. Afinal, porque é que ela veio?
Já cansada daquela cena, a Cams pediu perdão e foi até ao bar do restaurante. Depois de acabar a minha sobremesa, levanto-me e vou ter com ela. Estava sentada ao balcão com um copo à frente.
-É o mesmo que ela, por favor - peço ao empregado do bar e sento-me no banco alto ao lado do da Cams.
Ela bebe um gole do seu gin e depois diz:
-Eu tentei Cammy, mas não consegui. Isto até para mim é estranho, mas é impossível fingir que o Miguel não me afeta. E a amiguinha dele já percebeu... - vira-se para mim. - Viste como ela o toca? Só falta atirar-se para cima dele.
O empregado chega com a minha bebida e eu agradeço.
-E viste como ele não lhe dá atenção nenhuma? Está mais interessado em meter a conversa em dia com os amigos... Também reparei que ele te olhou de vez em quando.
Bebo um pouco do meu gin.
-Não me lixes... - diz enquanto roda a bebida no copo.
-É verdade. Enquanto jantávamos, quando não o olhavas, ele levantava o olhar para ti.
Dito isto a Cams olhou para mim.
-Estás a falar a sério?
Eu aceno e olho na direção da nossa mesa.
-Tão a sério, como ele estar agora a olhar para aqui.
Sorrateiramente, a Cams olha para a nossa mesa e confirma aquilo que disse. O Miguel está a mirá-la, e quando vê que a Cams o apanhou deita-lhe um sorriso. Sem saber o que fazer, a Cams volta a virar-se para mim.
-Definitivamente não percebo os homens... Afinal, porque é que ele a trouxe se é só uma amiga?
Olhando para a mesa ainda, sendo que desta vez para o homem que me cativou, encolho os ombros.
-Somos duas amiga... Os homens deviam trazer manual de instruções. Respondendo à tua pergunta, os homens, por vezes, não sabem o que fazem e tudo lhes parece inofensivo. Até sofrerem as consequências.
A Cams olha para mim e segue o meu olhar. Põe o seu copo de lado e pega no meu fazendo o mesmo.
-A sério que vocês ainda não falaram? Vais desistir logo ao primeiro obstáculo? Cammy, o Max é um amor e gosta de ti. Nunca faria nada que te magoasse.
-Como sabes? Nem o conheces assim tão bem.
-Basta ver a forma como ele está! Ele tenta disfarçar, mas eu já percebi que ele está um farrapo. Estão ambos infelizes sem qualquer necessidade.
Observo o Max ao longe, todos os seus movimentos. De vez em quando dá um sorriso, mas dois segundos depois esmorece. Depois distrai-se no seu mundo, enquanto brinca ora com o guardanapo, ora com o copo, ora com a colher de sobremesa. O seu semblante triste, ainda que o tente disfarçar, a Cams tem razão, dá para se notar.
-Cams... Sei lá... Eu quer desculpá-lo, mas ao mesmo tempo tenho medo.
-Não confias nele? - pergunta logo de seguida.
Eu assinto.
-Então pronto Cammy. Ouve o que ele tem para te contar e confia nele. Aquele rapaz adora-te mais que tudo.
Volto a olhar para ele, e desta vez os nossos olhares cruzam-se. Todo o meu ser estremece sob o seu olhar. O seu olhar tem um poder em mim que é impossível de descrever. A nossa ligação é quebrada, quando o Eduardo chama o Max e este o puxa para a conversa. Por um par de minutos, ainda o fico a observar, mas a minha atenção é atraída para o outro lado da mesa.
Vejo o Miguel levantar-se e a dirigir-se na nossa direção. Olho para o lugar da Miss Barbie, mas está vazio.
-Cams? - chamo.
Ela vira-se para mim e faço-lhe sinal para ela seguir o meu olhar. Ela vê o Miguel a aproximar-se e começa hiperventilar.
-Diz-me que ele não está a vir para aqui!
-Está sim.
-Não me deixes sozinha - implora.
O Miguel chega junto de nós e sorri-nos.
-Olá!
-Olá e adeus - digo. -Estava precisamente a dizer à Cams que estava a precisar de apanhar ar. Está muito quente aqui.
Levanto-me do banco e o rapaz desvia-se para me dar passagem. A Cams salta do banco também e diz:
-Sim, realmente tens razão. Está aqui muito calor. Provavelmente, o ar-condicionado deve ter avariado ou algo do género.
-Não digas parvoíces. Ainda à dois segundos estavas a dizer que se estava super bem aqui dentro. Fica aí. - Olho para o Miguel. -Até já! - pisco-lhe o olho.
Deixo aqueles dois sozinhos e vou até lá fora. Mas logo me arrependo. Levantou-se um frio de rachar. Agora tenho de me aguentar, até porque não tenho o casaco comigo.
Sento-me na esplanada do restaurante com vista para o rio, e começo a esfregar os braços de maneira a que aqueça um pouquinho. Enquanto observava o rio, ia pensando no assunto que ultimamente não me tem deixado dormir.
Estou realmente dividida. Não sei se devo ou não dar-lhe uma nova oportunidade. Às vezes penso que o Max não seria capaz de fazer algo que me magoasse. Outras penso que não o conheço assim à tanto tempo. Não sei o que fazer...
-Posso me sentar aqui?
Assusto-me ao ouvir a voz do Max ao meu lado. Estava tão distraída com os meus pensamentos que nem dei pela sua presença.
-Desculpa, não te queria assustar.
-Não faz mal. Estava só distraída. Senta-te.
Ele senta-se e ficamos ambos em silêncio a olhar para o rio.
Quando uma brisa super fresca volta a passar, encolho-me toda com frio. O Max apercebe-se e tira o seu casaco para mo pôr por cima dos ombros.
-Obrigada. Não era preciso.
-Estavas com frio. Não quero que fiques doente.
-Não precisas de te preocupar comigo.
Ouço-o respirar fundo e depois olha-me.
-Podias estar a milhares de quilómetros de mim, podíamos nem sequer nos poder ver um ao outro que eu ia sempre preocupar-me contigo.
Depois de o ouvir dizer aquilo, o meu coração deu três pulos de emoção. Mesmo num estado de espírito péssimo, o Max consegue ser a pessoa mais doce do mundo.
Sem saber muito bem o que lhe responder, fico em silêncio.
-Não imaginas como fiquei quando te vi à porta do balneário. Não imaginas a dor que senti ao ver-te ir embora daquela maneira. Talvez não se possa comparar à dor que sentiste quando visto o que aconteceu. Mas eu juro-te, Camila...
-Max, por favor - interrompo-o.
Não posso ter esta conversa com ele agora. Preciso de pensar, estou cheia de dúvidas na minha cabeça, e enquanto não as esclarecer não vou saber o que fazer.
-Não, Camila. Eu preciso de te dizer isto. Depois de me ouvires deixo-te para pensares. Dou-te todo o tempo e espaço que precisares.
Não querendo lutar mais, não o contrario e deixo que fale.
-Juro-te que era incapaz de te magoar. Eu adoro-te! Estes dias têm sido horríveis. Não consigo lidar com o facto de estares mal. Não sei lidar com o facto de estarmos assim por causa da Mafalda. Neste preciso momento, o que mais quero é abraçar-te e dizer-te que vai tudo correr bem, desde que confiemos um no outro. Tu não me queres ouvir, não queres que te conte o que realmente aconteceu, e eu entendo! Estás magoada, estás com dúvidas e não sabes se deves ou não dar-me uma segunda oportunidade, até porque não nos conhecemos assim há tanto tempo. Mas achei que me conhecias o suficiente para saberes que era incapaz de te fazer passar por aquilo que eu já passei.
O Max leva as mãos à cara e respira fundo, tentando acalmar-se. Eu tento processar tudo aquilo que ele disse. Pareceu-me sincero. Pareço uma parva a olhar para ele sem qualquer reação. A verdade é que quero gritar-lhe que confio nele, quero abraçá-lo e beijá-lo, mas por alguma razão não consigo e deixo me ficar ali sentada ao seu lado.
Ao perceber que não vou dizer nada, ele limpa a cara e depois olha para mim.
-Agora que já te disse metade do que te queria dizer, vou-te dar o tempo que precisas. Não te vou chatear. Quando achares que é a altura certa para ouvires o resto, tens o meu número.
E sem se virar para trás, entra no seu carro e avança, enquanto eu fico a vê-lo partir. Assim que o perco de vista, quebro e começo a chorar desalmadamente.
Que bela figura que estou a fazer...
Ainda tenho o casaco dele nos ombros. Pego nele e aperto-o contra mim ao mesmo que sinto o seu perfume, o que me faz chorar ainda mais.

O Sorriso Que Me ParouOnde histórias criam vida. Descubra agora