Cinco: Barreiras

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Eu era musicista. Isso era um fato. Um fato completamente inegável. Mas o que menos imaginavam sobre mim,  era que meu instrumento favorito não era o violão, mas sim o piano.

O piano emanava algo bom. Quando me aproximava daquelas teclas algo mágico acontecia. Me sentia envolvida pela melodia e só percebia que estava tocando algo quando estava no final das notas.

A música que eu compus para Bia era tocada principalmente no piano. Ele era meu melhor amigo, por isso fiz a questão de  compor naquele instrumento.

Os últimos dias se passaram como num tornado. O semestre estava quase acabando e meus pais planejavam fazer uma viagem com a família. Bia estava super empolgada com a ideia de passar as férias no Brasil, principalmente porque passaríamos uns dias em Belo Horizonte, em Minas Gerais, onde ela nasceu. Mas também se decepcionou um pouco ao saber que não iríamos passar nem perto do litoral, afinal, Brasil, para ela, é sinônimo de praia, e ondas, e mar!

Bia e eu estávamos super empolgadas para as férias, e era sempre assim. Não tinha como ela não me contagiar.

Helena: São raras as vezes que não íamos para o Brasil nas férias. Eu gostava muito de estar lá e passar uns dias do verão naquele sol escaldante que fazia em pleno meio-dia. Também foi o lugar onde eu nasci. Eu cresci aqui na Argentina mas eu nasci em Cuiabá. Então é como se lá fosse minha segunda casa. - Eu achava que estava falando sozinha, mas percebi a companhia dele quando parei de rir ao completar minha última frase.

Thiago: Mais um ponto em comum. - Eu o olhei intrigada. Tá, haviam trinta minutos que eu falava de mim pra ele. - Eu sou de São Paulo, mas a Argentina sempre foi minha segunda casa. Eu vinha aqui com meus pais quando era pequeno e sempre queria ficar mais. - Eu ri. Era para rir? Eu não sabia. Não me lembrava como se fazia uma amizade, mas esse garoto estava conseguindo quebrar as barreiras que  construí ao meu redor durante anos.

Essas barreiras eram quase impenetráveis. Quase. Poucas pessoas sabiam como eu era de verdade. Poucos sabiam dos meus verdadeiros sentimentos e tudo o que eu gosto. Poucos sabiam como penetrar essas barreiras que, conforme fui dando continuidade à minha vida, fui as erguendo e deixando-as mais altas.

Eu gostava de ter companhias nas horas vagas. Mesmo que em silêncio. "O silêncio de alguém pode dizer muito", adotei tal frase. Acho que li num livro ou vi em algum filme, não sei. Mas ao estar com Thiago não havia silêncio. Sempre haviam conversas e discussões que eu queria que nunca acabassem.

Após aquele dia no restaurante eu fiquei mais leve. Obviamente eu ainda desconfiava do que meus pais falavam toda vez que pensavam que eu não estava por perto. Sempre cochichos e murmúrios por ali e aqui. Pareciam tramando um plano de guerra. Trocavam olhares silenciosos indicando que precisariam conversar depois. Tinha certeza de que se eu perguntasse o que era o que eles estavam escondendo, não me falariam.

"Às vezes o silêncio de alguém é a melhor resposta" - A frase batia na minha cabeça e insistia toda vez que eu fechava os olhos e pensava no que meus pais estavam falando. Muitas vezes, no silêncio da noite, depois que todos já foram dormir, quando já havia terminado minhas tarefas, penso em ligar para Víctor e escutar ele dizendo que são paranoias minhas para eu sentir que é mesmo coisa da minha cabeça. Mas não o faço.

Falando no Víctor, depois de nós nos resolvermos não nos falamos muito. Ele ainda me levava para a faculdade todos os dias e me deixava em casa após as aulas, mas sempre que estávamos no mesmo ambiente ele ficava quieto. Ele estava muito mais estranho nos últimos dois dias, depois que me viu falando com Thiago por bastante tempo. Sempre que estávamos juntos ele evitava me olhar, evitava conversar e às vezes eu percebia que ele não queria nem trocar um ato de carinho comigo. Eu não era trouxa, sabia que ele ainda estava com ciúmes, mas se ele falasse comigo iria descontar uma raiva em mim que ele talvez não queira.

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