Capítulo Dezessete

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No caminho para o refeitório, eu havia prendido as mangas longas do meu macacão sobre a cintura e amarrado a camisa branca com um nó, deixando um pouco da minha barriga a mostra. Estava começando a esquentar.

A minha cabeça dava uma rápida conferida nas recém-descobertas. Primeiro, minha mãe havia me entregado. Segundo, Miles estava mais perto do que eu imaginava. Terceiro, Roucker matou Gale.

Não sabia qual fato era o mais difícil de se engolir. Respirei fundo, tentando assimilar a minha condição atual com os repentinos contratempos que eu teria para averiguar a última história por si só.

No momento em que abri as portas do refeitório, vi que todos estavam conversando e rindo, de volta ao normal, deixando a atmosfera um pouco mais habitável do que na parte da manhã.

Peguei uma das centenas de bandejas disponíveis e entrei na fila, para a cozinheira pôr a "mistura" do meu prato.

- Gostando daqui, filha? - perguntou ela e eu a encarei, duvidando se realmente falava comigo ou estava se dirigindo à outra pessoa.

Olhei para os lados. Ninguém.

Cocei a garganta, tratando logo de responder:

- Para ser bem sincera... eu nunca quis estar aqui - lhe lancei um sorriso sem graça.

- Entendo... mas espero que você se sinta bem. Afinal, essa é a sua nova casa - seu tom era como uma canção de uma sereia para mim, tanto que eu soltei um longo suspiro, como aqueles de garotinhas que estavam cegamente apaixonadas por alguém, mas também deixei escapar um risinho debochado quando a sua última a palavra irrompeu em meus ouvidos. Casa.

Ao inferno que esse lugar seria a minha casa.

Estiquei o meu corpo sobre aquelas bancadas de vidro e a abracei forte, tudo por um impulso latejando dentro do meu peito. Talvez por ela falar de um jeito que eu nunca ouvi minha própria mãe falar comigo. Talvez porque eu precisava de uma figura feminina mais velha para acariciar as minhas costas, diante de tudo que eu havia passado nas últimas horas.

- Eu também... - sussurro em seu ouvido, mas sabia que aquilo era somente da boca para fora. Eu não queria me acostumar com aquele lugar. Não conseguiria. Tinha em mente que o meu lugar não seria aqui nem em outra vida.

Me afastei e lhe lancei um último sorriso, a vendo um pouco surpresa pela minha reação, mas logo o seu rosto ficou sereno novamente e eu peguei a minha bandeja que estava recheada de uma comida cheirosa, onde o vapor saía sutilmente sobre o prato e se desmanchava sobre o ar.

Avistei Bryn e os garotos ao longe, a mesma acenava para mim, como a primeira vez em que entrei nesse refeitório totalmente perdida. Sem ninguém. E, bom, confesso que não havia mudado muita coisa desde então.

No caminho até eles, os meus pés pararam automaticamente, a poucos metros da grande mesa dos azuis, ao ouvir um grito estridente que atravessou todas as vozes do lugar onde estavam sentados. O resto das mesas pareceram não notar. Talvez até eu não notaria, caso não estivesse passando por ali naquele exato momento.

Olhei na direção daquele som e encontrei a garota que havia recebido as cinco chibatadas do Coronel. Zetta. Porém, ela não estava sozinha. Quem dera se estivesse, eu diria.

Apertei a bandeja que carregava.

Quincy estava com as mãos nas costas machucadas da garota e eu tenho certeza de que não fazia carinho ali. Podia ver nitidamente pontos de sangue distribuídos pela roupa de Zetta. A ferida se abriu.

Quincy, definitivamente, era uma pessoa detestável.

Mordi o lábio inferior, percebendo que nenhum dos azuis se mexeriam para ajudar Zetta. Olhei para Bryn, que logo tratou de me encarar e negou com a cabeça para mim, entendendo onde eu pretendia ir.

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