Os tesouros que a terra o céu provêm são de bênçãos de Siach para os humanos. Criados por ele, devem ser administrados pela Nossa Sagrada Igreja. Era o que, entre os fiéis, sempre fora conhecimento comum. E, se havia algum lugar onde a Igreja tinha mais acolhimento entre as pessoas, seria entre os camponeses livres da Confederação.
Renton guardou, com dificuldade, a gema no interior do seu gibão surrado. Suas mãos tremiam. Como esconder uma coisa daquele tamanho? Era óbvio que precisava se livrar disso, mas não bastaria apenas jogá-la no rio e esperar que tudo desse certo. Já que isso caíra em terras suas, fazia-se necessário que ele tomasse a responsabilidade por ela.
E tomar a responsabilidade significava seguir os procedimentos para livrar-se da maldita pedra.
Renton deu meia-volta por onde viera, ocultando aquilo em seu peito. As mãos ao redor faziam parecer que estava abraçando a si mesmo. Talvez despertasse suspeita em alguém, mas ainda era melhor do que simplesmente andar com algo que mais parecia um inchaço no seu corpo. Em situações normais, nenhum inchaço devia chegar àquele tamanho. Só podia rogar aos deuses que não fosse visto.
O camponês ignorou a incômoda sensação de estar sendo observado, em todo o caminho de volta. O pequeno bosque de árvores violetas deu lugar aos campos arados onde estivera trabalhando pouco antes, que deu lugar ao quintal de terra batida da sua casa. Passou ao lado do poço, resistindo à tentação de apenas jogar a gema ali. À sua frente surgia a casa comunal da sua família, uma rústica habitação de barro e fibras entrelaçadas coroada por um teto de palha.
Não houve nenhum latido quando Renton entrou. O cachorro devia estar tirando seu cochilo. Um menino passou correndo ao seu lado, quase tropeçando nele. Levava um balde nas mãos.
– O tio Renton chegou, vovô! – gritou o moleque.
– Ah, chegou, é? – A voz do velhote soou bem próxima. – Já não era sem tempo.
Renton ignorou o seu sobrinho, que já sumira da sua vista, e seguiu em frente pela casa barulhenta. Pelo corredor onde avançava, ouviam-se as conversas dos seus irmãos com as esposas, das crianças e o choro dos bebês que ansiavam pelo peito da mãe. Era incrível como podiam estar tão relaxados!
Felizmente, apenas ouvia os ecos no corredor. Chegara aquele momento da tarde em que todos retornam para casa e para o quarto depois de um longo dia de trabalho (se ao menos trabalhassem), então era natural supor que haviam poucas chances de ser pego de surpresa naquela posição suspeita. Mas o incomodava o fato de que nenhum deles parecesse se importar com o que acabara de cair do céu. Teriam sentido o tremor, não teriam?
Renton arrependeu-se de ter pensado nisso ao encontrar a sua mulher na porta do quarto.
– Ei, Ren – disse Eyna, observando-o com aparente preocupação –, o que foi isso de antes? Você viu?
Normalmente orgulhava-se de ter casado com uma mulher inteligente como Eyna, mas, desta vez, tudo o que desejou era que ela fosse um pouquinho menos esperta.
– Não foi... nada, amor – disse o camponês, parando à entrada do quarto de ambos. Virou-se para ir embora, enquanto dizia: – Deve ter sido um ímpeto de Siach.
– Aonde está indo? Você não acabou de chegar?
– Preciso buscar algo no depósito. Havia esquecido.
Esperava guardar isso no meu saco de viagens e partir, mas ela não pode vê-la, pensou, um tanto frustrado. Ninguém pode. Se o meu pai visse essa coisa, ficaria louco. Eu o conheço. Isso seria um problema.
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KALKIALA - A gema da vida
FantasyQuando os meteoros caem, ninguém nunca sabe o que haverá neles. Ao descobrir que um meteoro caiu nas proximidades da sua lavoura, um camponês decide que deve agir rápido para livrar-se dele. Noutra parte do arquipélago, um jovem tem o seu mais recen...