Capítulo 3 | Correnteza de Hud - Parte 1

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Despedida, o ato de dar adeus a alguém... Tobbi nunca sentira como se entendesse o real significado dessa palavra. Dera adeus aos seus pais e irmãos, quando partira de casa, e agora dava aos seus amigos de Okinto. Havia algum sentido nisso? Por mais que se esforçasse, não conseguia compreender a comoção que tudo aquilo gerava. Partiria, é verdade. Mas não é como se estivesse dando adeus permanentemente àquela ilha. Planejava voltar, assim como planejava vê-los de novo. Poderia demorar, mas, afinal, voltaria. Que mais havia de importante, do que tal certeza?

Apesar disso, sentiu que seria contraproducente enunciar aquilo em voz alta. Baixou a cabeça, em respeito ao sentimento daqueles quatro.

– Está mesmo indo embora, Tobbi?! Seu maldito – Telmo parecia incrédulo. – Por que não disse nada antes? Planejava fugir, longe da vista de ninguém?

Tobbi encolheu os ombros. Levava o saco de esporos às costas. Junto a um pequeno montante de dinheiro, era o único que levaria consigo da ilha.

– Ele está fugindo! – Telmo olhou para os outros, inconformado. Como se não entendesse a aparente serenidade dos outros.

– Eu sei – disse Kiliman, franzindo os lábios. – Estávamos falando disso enquanto você estava no reino dos sonhos. Foi a decisão dele. Não há nada que possamos fazer.

– Não há... nada...

A sogra de Kiliman negociava com o marinheiro que descera do galeão a respeito das taxas de atracagem e assuntos afins. Era um típico pandoreano, aquele marinheiro. Tinha a pele morena, no tom mais vivo que os diferenciava dos naedi do leste, e sobrancelhas finas e irrelevantes. Apesar do porte mais musculoso, comum aos homens do mar, havia algo de estranho naquele em particular. De todos os nativos do arquipélago que Tobbi já conhecera, aquele parecia bem mais sombrio e taciturno do que o usual. Bem, pode ser que apenas estivesse num mal dia.

Tobbi recebeu dele um medalhão arredondado, pouco menor que a palma da sua mão. Aquele pedaço de metal seria a prova de que não entrara no navio por meios escusos.

– Tem certeza de que vai fazer isso mesmo, rapaz? – disse Kiliman. – A Alina sabe?

– Eu deixei uma carta para ela.

– Isso não resolve nada. Devia ter dito diretamente. Não se sai assim, às escondidas.

Bem, pensou o jovem, ele não deixa de ter razão. Mas, no fundo, temia ser aquele a contar para Alina da sua partida. Temia que ela deixasse a vida de que tanto gostava por sua culpa, se ela escolhesse acompanhá-lo. Ela não era do tipo que lidava bem com o perigo, e sabia que sempre há vários nos caminhos por terra ou pelo mar. E talvez houvesse outro motivo...

– Precisamos saber, pelo menos, para onde vai – constatou Androvil, cruzando os braços. – Ou não quer que saibamos mais nada sobre você?

– Ele tem razão, Tobey – concordou Nairu.

Tobbi suspirou. – Certo, tudo bem. Vou para Estrela. Talvez haja algum negócio a se fazer por lá. Talvez eu tenha ouvido sobre isso esses dias, por aí.

– De quem?

– Do alfaiate mudo que aparece de vez em quando.

Risos perpassaram os rostos de Kiliman, de Nairu, e de Androvil. E também de Tobbi. Se isso bastava para deixá-los menos abatidos, então o faria. Telmo foi o único que não riu.

– Não é momento para piadas, raki idiota – resmungou ele. – Quem é que iria para Estrela, com tudo aquilo? E é mês de Névoa ainda. O caminho para lá deve estar...

KALKIALA - A gema da vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora