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Matheus

A van me deixa no centro da cidade, onde pego um ônibus para a casa.

Confiro minha aparência mais de uma vez no reflexo do celular.

Nenhum indício de sexo, drogas ou rock 'n roll.

Quando chego no portão, respiro fundo e tento ficar numa boa, imaginando os piores cenários do que minha mãe ou meu pai me diria numa bronca.

Adentro a sala de estar, onde minha mãe mexia no celular, provavelmente esperando o Faustão começar na TV.

Havia cheiro de churrasco e música alta vindo do andar de cima. Um típico domingo em casa.

- Ei, mãe. – Tiro a mochila e a jogo no sofá, me sentando em seguida.

- Onde você estava meu filho? Fiquei preocupada, você disse que ia chegar cedo!

- Eu tava no sítio que te falei, foi mal, a van atrasou.

- Devia ter me avisado. Não pode ficar saindo assim.

- Desculpa, mãe. Sério.

- Tudo bem, só não me deixa preocupar assim de novo.

OK. Isso foi melhor do que eu esperava.

- Onde tá o meu pai? – Pergunto, mesmo sabendo a resposta.

- Lá em cima, bebendo como sempre. O almoço tá lá, se quiser comer.

- Ok.

Me levanto para subir, mas ela começa.

- É, Matheus, eu não vou aguentar por mais tempo que isso não, viu. Com seu pai desse jeito, não sei se consigo continuar nessa casa. – E me arrependo de ter perguntando.

Assinto, sem saber o que dizer.

- Tenta conversar com ele depois. – Ela insiste, ainda que eu já tenha tido mil conversas assim antes.

Não falo mais nada. Subo para o meu quarto, tomo um banho, e desfaço minha mochila, preenchendo minha cabeça com memórias de Sky e ignorando o som alto, e os gritos que se seguem logo depois ao ouvir minha mãe subindo as escadas.

Decido que não quero ficar aqui.

"Preciso te contar umas coisas."  Digito para Camila, e ela responde dizendo para eu ir na casa dela.

Sei que ela escuta o som alto, os gritos e as passadas. Sei que ela sabe. Não preciso verbalizar mais nada.

Vou até o terraço apenas para avisar que estou saindo e assim, deixá-los mais a vontade com suas brigas idiotas.

- Vou na Cami. 

Minha mãe me encara.

- Não vai comer nada?

Estava faminto, mas não queria ficar ali, não.

- Não.

- Precisa de dinheiro? –Dessa vez meu pai pergunta, a voz embargada e a posição bamba pelos efeitos da pinga.

- Não. –Reflito por um momento. –Não, na verdade, sim. Sim, preciso.

Ele me entrega uma nota de 20 e eu sumo pelas escadas.

Chego na casa de Camila em menos de um minuto. A sorte da minha melhor amiga ser minha vizinha, ou minha vizinha ser minha melhor amiga.

- E aí.

Me deito em cima de sua cama bagunçada como de costume, enquanto ela joga no computador o jogo dos ratos.

O que havia de tão interessante em Transformice? Eu nunca saberia porque não era do mundo dos games como ela.

O céu é para todos [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora