Capítulo 02

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"Às vezes a vida esconde presentes nos lugares mais sombrios."

Anne with an E

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Abri a porta da minha casa e entrei. A sala de estar estava com as luzes apagadas. A grande janela  que dava vista para o jardim estava fechada. Deixei minha chave sobre a mesinha de centro – onde ficavam alguns porta-retratos com foto da família e alguns objetos de decoração que deixava a sala ainda mais elegante, além dos quadros expostos na parede bege —, e abri a janela.

Nenhuma luz da parte de cima da casa estava acesa. Acendi a luz do corredor e caminhei até a cozinha, onde possivelmente minha mãe estaria, visto que era o único cômodo com as luzes acesa.

— Pensei que a senhora iria demorar para chegar. —  Entrei na cozinha e me sentei na cadeira próxima a mesa.

Minha mãe estava atrás da ilha preparando um suco.

— Quis voltar cedo, comprei pizza para jantarmos. Coloca a mesa por favor. —  Ela pegou a caixa de pizza que estava sobre o armário e levou até a mesa de vidro que estava posicionada no meio da cozinha.

Me levantei e fui até o armário de parede, onde estava os copos e pratos. Peguei os talheres por fim e coloquei sobre a mesa. Dona Lavínia pegou a jarra de suco que acabara de fazer e colocou sobre a mesa também. O único som que se ouvia era os ruídos dos talheres contra o prato, ao cortar as fatias de pizza.

— É… mãe? — a chamei fazendo com que ela prestasse atenção em mim. —  Eu preciso falar com a senhora.

Minha mãe continuou olhando para mim e parou de cortar seu pedaço de pizza no prato. As pulseiras do seu pulso fizeram barulho quando ela recuou os braços.

— O que houve? —  Ela me analisou por alguns instantes.

Eu parei por um momento, pensando no que falar e como falar.

— Eu vou me mudar.

Minha mãe se endireitou na cadeira. Sua postura ficou rígida e seus olhos negros me encararam.

— Como assim? — Ela pegou o copo de suco à sua direita.

— Eu vou para a Inglaterra.

Lavínia se engasgou com o suco e tossiu quatro vezes seguidas, iria me levantar para ajudá-la, mas não precisou. Minha mãe parou por um pouco e sua expressão ficou ainda mais rígida.

— Que besteiras são essas, Luara? Você só pode estar brincando comigo!

— É sério, mãe… — Respirei profundamente. — Eu preciso agarrar as oportunidades. E quem sabe que não vou conseguir algo melhor, um emprego melhor… entrar em uma faculdade.

— Não.

— Vai ser uma forma de tentar sair das dívidas.

— Você não vai sair daqui. — Sua voz era firma e decidida. Minha mãe voltou a comer sua pizza.

— Eu já decidi.

— Você não decide nada, e como você vai fazer isso? Como vai conseguir dinheiro para isso?

— Eu consegui juntar durante o tempo que estava trabalhando.

— Aaaah! E tudo isso pelas minhas costas.

— Não é bem assim… eu não tinha certeza se realmente iria fazer isso.

—Você não vai fazer isso.

O garoto do lenço azulOnde histórias criam vida. Descubra agora