Carta de sangue.

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"Essa carta vai para meus amigos que eu tanto amo.
Não a um dia em que eu não sinta falta de vocês, de nossas brincadeiras e dos passeios que fazíamos. Já faz um tempo que eu não consigo mais sorrir, a dor e a solidão corrompe nossa alma. Eu me lembro do dia em que o Tomaz se vestiu de fantasma e deu um susto em todos nós quando vocês dormiram aqui, foi um dia incrível. Lembro também das vezes em que todos ficavam me zuando por gostar da Ritta, mandando indiretas para ver se ela gostava de mim também, eu ficava apreensivo e pedia pra parar, mas o que eu queria mesmo era saber se ela sentia isso por mim também.
Tivemos grandes momentos, muitos deles foram lindos e felizes. Porém somente um não sai da minha cabeça...
O dia em que os soldados estavam nas ruas e nos não estávamos entendendo nada, só o que queríamos fazer era brincar e rir, mas aí todos começaram a correr. Os soldados para um lado, as pessoas para o outro e então ouvimos tiros, muitos, vindo da fronteira com a Alemanha. Nos sabíamos das invasões porém, não tínhamos ideia que eles iriam invadir nosso país, mas eles fizeram. Aquele domingo foi o pior dia da minha vida, não sabíamos o que fazer, estávamos no parque quando aqueles soldados ensanguentados apareceram, matando todos a sua frente e deixando poucos vivos. Eu vi aquele símbolo, era estranho mas ele me deu mais medo do que os próprios soldados. Então eu vi eles os matando, matando vocês na minha frente, um por um eles iam fuzilando-os e não havia nada que eu pudesse fazer a não ser chorar. Ver vocês, meus melhores amigos morrerem na minha frente foi o pior dia da minha vida.
Eu demorei para escrever essa carta porque onde eu estou não é um ambiente favorável, é uma espécie de alojamento, estou com vários homens aqui, morrendo de frio e fome, mal temos uma gota d'água para beber e até onde eu sei, vários já morreram aqui. Eles matam sem motivos.
Eu sinto que estou perto de ver vocês de novo, hoje os soldados virão nos buscar para ir até uma câmara, onde segundo eles vamos tomar uma chuveirada, todos juntos. Não sei que câmara é essa mas eu não tenho escolha.
Eu vejo vocês em breve meus amigos, tenho certeza que um dia estaremos juntos de novo!"

Vincent Hudgens, Polônia - 1942
Carta encontrada no campo de concentração de Auschwitz.

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