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Por alguns segundos, cheguei até a pensar que Lúcios não responderia. Sua testa se contorceu em uma expressão de dúvida, q boca se tornou uma linha fina. Então ele me soltou, passou uma das mãos pelo cabelo comprido (agora até os ombros) antes de voltar a me encarar. O sorriso em meus lábios já tinha sumido completamente, sufocado pelo medo é arrependimento. Foi cedo demais? Eu havia falado cedo demais... assustei ele certo? Mordisquei o dedão enquanto esperava alguma palavra, qualquer coisa saindo da boca dele. Me virei para voltar para a mansão quando o clima ficou estranho, mas sua frase me fez parar de andar.

— É difícil pra mim.

Só sinto o quão tensos meus ombros estão quando ele os toca, enviando arrepios por toda a linha da minha coluna.

— Eu nem sei o que é amor, não sei o que estou sentindo... não dá pra comparar com nada.

Me viro novamente pra ele, percebendo o quão perto novamente estamos. Nossas respirações se encontram, e meu coração se acelera novamente. Sinto arrepios por todo o corpo quando seus dedos encontram minha cintura, e consigo sentir o calor de seu corpo mesmo através da roupa.

— Mas sei que... estou sentindo algo, meu coração se acelera e minhas mãos suam frio todas as vezes em que você se aproxima. Sinto um nó na garganta as vezes, minha barriga congela... poderia jurar que por um instante meus joelhos falham. Eu não sei o que significa isso Kalishta, mas se for amor eu com toda certeza te amo.

Lúcios segura meu rosto com ambas as mãos , formando conchas com ela. Seus dedos acariciam meu rosto, os calos arranhando minha pele fina. Deixo que ele escorregue uma das mãos de volta para minha cintura e me pude pra perto, apoio minhas mãos em seus braços. Quero estar mais perto, quero senti-lo, mas sem pressionar. Sinto que estamos prestes a vivenciar os piores momentos de nossas vidas, e se não tomarmos cuidado sairemos destruídos. Me enrolo naquele abraço, mergulhando no conforto apesar do calor, e dos galhos quebrados que arranham meus pés descalços.

Quando eu era pequena, me escondia entre meus irmãos quando tinha pesadelos. Geralmente alternava em invadir o quarto de Kai ou Owen, sempre um dos dois. Meus irmãos cresceram e ficou cada vez mais fácil me sentir segura, já que quase todos era praticamente ursos em tamanho. Foi só quando despertei meu fogo e minha própria força que me dei conta de como me proteger era melhor, mais interessante. A medida que o fogo em minhas mãos crescia, meu poder aumentava, mas o controle ficava menor. Por isso comecei barreirar com Arlo, e batalha corporal com Zander. A fama sobre minhas chamas se espalhou por todo o continente, e meu pai sabia que uma hora ou outra o herdeiro negro viria atrás de mim. Ele podia me calar, silenciar meu poder dentro de mim. E foi o que ele fez. Agora eu sabia que era Kai, e o fato do meu poder ter diminuído pouco a pouco ao longo dos anos agora fazia sentido. Mas eu precisava recupera-lo, precisava das minhas chamas colossais de volta, não só pra me proteger, mas pra proteger todo o meu reino.

Abraçada ali com Lúcios, eu conseguia sentir na alma seu poder, a grandeza transbordando por cada poro de seu corpo. Eu sabia que Lúcios podia partir um continente ao meio, e o meu maior medo era que isso representava apenas uma parte do poder do herdeiro negro.

— Acho melhor voltarmos. Edwin vai cozinhar, se quiser como com você em seu quarto, ou onde quiser.

Nos afastamos, Lúcios se abaixa para alcançar minhas botas e as pega com apenas uma mão, entrelaçando os dedos da outra aos meus. Aperto ele contra mim e começo a andar em direção à casa. Foram Damian e Austin quem me ofenderam, de modo algum eu ficaria acuada em meu quarto enquanto eles comessem normalmente em minha cozinha. Sim, minha cozinha, aquela era nossa casa, minha, de Edwin, Finn e Lúcios e eles só fariam parte dali quando me aceitassem com ela. Usei Lúcios como apoio emocional e físico pra chegar até a casa sem sequer um traço de emoção no olhar, o rosto petrificado em uma expressão de impassibilidade.

Assim que entro pela porta, Finn me recebe com os braços abertos, me aperta contra si e pergunta se estou bem. Apenas balanço a cabeça e sigo até a cozinha, dando com Edwin e os irmãos já sentados. Percebo que ambos me encaram quando entram, seus pratos de comida intocados até o momento. Desfilo até a mesa sem me importar com estar descalça ou talvez descabelada, e me sento na ponta da mesa, como um rei.

Lúcios e Finn seguem atrás, se sentando um de cada lado meu, Edwin na outra ponta. Sirvo meu prato com a carne, batatas e grãos, grata pelos dotes surpreendentes de Edwin na cozinha. Dotes que deixam o cheiro maravilhoso.A refeição se extende por alguns minutos sem que ninguém diga nada, permaneço enchendo a boca em silêncio. Até que Edwin se incomoda com o clima esquisito.

— Vamos formar duplas após o almoço pra treinar poderes, só vou na vila buscar alguns suprimentos.

Percebo como os príncipes me encaram, talvez ávidos por algum desafio. Lúcios é sem dúvida o mais poderoso, por controlar seu poder como controla seus passos, Edwin já provou seu valor roubando a vitalidade do próprio pai. Será que os outros dois irmãos seriam tão interessantes quanto? Largo meu garfo no prato de louça provocando um tintinar, que se os príncipes já não me encarassem, com certeza os faria encarar naquele momento. Com as pálpebras semicerradas encaro os dois irmãos e pergunto:

— Aceitam um desafio?

Sorrio inocente passando uma mecha do cabelo ruivo para trás da orelha, como a princesa fraca que eles pensam que sou.

A linhagem do fogoOnde histórias criam vida. Descubra agora