Uma semana se passa, uma longa e desesperadora semana. Se tudo estivesse normal, Vlad estaria agora organizando um festival em menagem ao verão. Quando o sol raia mais forte, as árvores cheias se exibem em toda a sua graça, o castelo parece mais radiante. Na época em que mantenho meus cabelos em trancas, que Owen faz pra mim. Pelo menos ainda o tenho aqui, para se sentar atrás de mim e mexer em meu cabelo armado. Papai tem se recuperado, mas ouvi boatos de que não pretende voltar ao trono. Alex e os outros ainda parecem destruídos, de alguma forma mudados. Me pergunto se algum dia poderei me esquecer de tudo aquilo. A barriga de Emory cresce cada vez mais, carregando meu sobrinho. Ou sobrinha. O bebê de Kai.
O bebê que vai crescer longe de mim, em Elliwe junto com a mãe, a herdeira do reino. Acabamos formando uma aliança com aquele reino de qualquer forma. Os príncipes irmãos de Edwin já se foram, junto com sua mãe, que também havia sido sequestrada. Uma mulher muito doce e meia aliás, que por algum motivo me permitiu ficar com Lúcios aqui. Finn e Jasper se preparavam para partir, prontos para assumir seus respectivos tronos, governar seus respectivos povos. E apesar de ter cinco irmãos agora, a ideia de vê-los partir sem ver Lúcios acordado, me fazia sentir solitária.
— Vai me mandar cartas, isso é uma ordem.
Finn solta um suspiro misturado com uma risada, os olhos azuis brilhando em diversão. Ele com certeza não é nada do que pensei que fosse.
— Você sabe que vou ser rei agora certo?
O nome me causa arrepios. Mas apenas dou de ombros e encaro Jasper, o mascarado, que me olha de volta com seus intensos olhos azuis.
— Você vai... se sair melhor que nossos pais.
— Sem guerras.
Ele afirma. Sei que os conflitos e confusões entre nossos reinos destruíram a todos nós. Criou crianças traumatizadas, corações frágeis e blindados. Mas ainda assim... aqui estávamos nós. Quase adultos, superando seus medos e travando batalhas. Salvando o continente.
— Não chore, voltamos para seu aniversário!
Concordo com a cabeça, incapaz de segurar as lágrimas que escorrem por minhas bochechas. Mas abraço meus amigos, pela milésima vez ao dia, esperando que isso impeça a onde de saudade que já começo a sentir. Eles me apertam contra si, minha cabeça enterrada na altura do peitoral de ambos, me fazendo capaz de escutar e sentir os corações acelerados. Não pude conter o vazio, quando aqueles longos braços me soltaram, e se afastaram em direção à carruagem que os esperava. Eu devia muito à eles, não fazia ideia de como agradecer.
Caminhei de volta ao castelo, com a cabeça baixa para a grama em meus pés. E o coração pesado no peito.
Mais duas semanas se passaram, e Lúcios não acordou. Meu aniversário se aproximava, e como se nada tivesse acontecido, Vlad desfilava pelos vastos corredores do castelo, com pessoas ao redor anotando suas ideias. O mundo poderia acabar, mas Vlad ainda daria uma festa em cada estação depois disso. Sai do quarto com um vestido leve, o cabelo desembaraçado, e os pés descalços causando ruídos contra o chão. Observei a quantidade de pessoas em minha corte. Quando adentrei a cozinha, e me impressionei em como nossa linhagem era forte. A corte era basicamente nossos parentes distantes, os únicos no reino que possuíam um mínimo de fogo em suas veias. E pelo o que pude perceber, pelas cadeiras ocupadas e as mesas cheias, todos haviam sobrevivido. A forte linhagem do fogo.
Mas então meus olhos se desviaram para a mesa dos príncipes, para a poltrona vermelha vazia ao lado da minha, onde uma pessoa deveria estar. Me sentei, mesmo querendo desaparecer, me sentei. Senti a mão de Zander buscar a minha debaixo da mesa, e a apertei em conforto. Owen sorriu pra mim, Arlo piscou. Eles ainda estavam ali. Quase totalmente recuperados. As bochechas não estão mais fundas, o brilho nos olhos começa a voltar. Até meu pai arranjou forças o suficiente para se sentar conosco, a coroa pesada equilibrando-se no cabelo de fogo encaracolado.
— Minha corte.
Meu pai começa. O salão inteiro se cala, e o observa com atenção. Ele se levanta, apesar das restrições dos curandeiros, e cabaleia. Alex se levanta e o apoia, porque sabemos que tentar fazer com que ele se sente pode ser muito mais trabalhoso.
— Meu tempo de governo chegou ao fim. Mas não minha vida. Por isso, neste ano será diferente.
Todos olham com curiosidade para meu pai, menos meus irmãos. Percebo, ao olhar para o rosto de cada um, que eles já sabem do que aquilo se tratava.
— Não haverá uma eleição, eu já me decidi quem ocupará meu lugar.
Meu coração quase para quando Alex exibe um sorriso largo. A ideia de não ter nenhuma chance pra provar meu valor, depois de lutar tanto por meu reino, quase me parte ao meio. Quase espero meu corpo travar, mas me lembro de que o culpado por isso já se foi a muito tempo.
— Eu conheço meus filhos como ninguém, e sei desde quando nasceram, quem assumiria o trono. So existe um capaz de governar com corpo, alma e coração, todos os meus filhos concordaram com isso.
Meus irmãos balançam a cabeça em concordância, e posso sentir meu estômago se revirar, mesmo sem nem sequer ter comido. Mas meu pai continua.
— E é você Kali. — Meu coração quase salta pela boca— Você fez de tudo por esse reino, até mesmo quando teve que decidir entre ele e seu coração. Você se doou para cada um aqui, e lá fora, e nada nem ninguém seria capaz de superar isso. Nem uma eleiçãozinha besta.
Sinto meus olhos arderem em lágrimas. Quero abraçar meu pai, meus irmãos, mas acima de tudo, quero abraçar Lúcios. Meu pai me diz mais algumas palavras bonitas antes de se sentar novamente, meus irmão me parabenizam. Eu sorrio para todos e deixo que pensem que as lágrimas em minhas bochechas significam emoção, e não que estou completamente perdida sem Lúcios ao meu lado.
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A linhagem do fogo
FantasiaO herdeiro negro foi descoberto, mas isso não pode impedir ou diminuir seu poder sobre o país dourado. Agora Kalishta vai ter que conciliar os assuntos do coração com a luta por poder contra o próprio irmão, enquanto tenta protejer os que ama. Mas s...