Capitulo III - Vizinhos

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Londres, 24 de Outubro de 2010.

O portão enferrujado em formato de lanças paralelas entre duas arvores secas dava entrada à uma grande casa, praticamente uma mansão. Apesar da grandiosidade, era possível sentir que algo ruim acontecera ali. A pequena vizinhança, que hoje chega a apenas cinco famílias, era formada por pessoas ligadas a caça as bruxas entre o século XV e XVIII - Albrechts, Barthe, Fynne, Grandier e Waterhouse - O terreno que pertencia a família Kowalski foi vendido aos Albrechts há poucos anos. Estes por sua vez, construíram uma loja de artigos ciganos que beirava a falência.

Segundo Zafira Albrechts, uma senhora na casa dos sessenta anos, de olhos caídos assim como o grande par de brincos de ouro em suas orelhas, alguns meses depois da morte de Samantha, Elizabeth Smith foi internada em um hospital psiquiátrico pelo marido após ele decidir que seria melhor mantê-la longe do lugar em que as lembranças da filha ainda estavam tão presentes. O que parecia uma solução, tornou-se um pesadelo ainda maior.

- Os médicos diziam que todas as noites ela acordava gritando o nome de Samantha e repetia a frase "Ela não está viva! Ela não está morta! Tragam-me a minha menina" até cair no sono. - Parou para arrumar as pulseiras douradas que chacoalhavam sem parar. - Até que um dia, ela não caiu no sono. - Os olhos caídos se arregalaram levantando as sobrancelhas grossas, porém, bem desenhadas. - Os enfermeiros entraram no quarto para dar-lhe os medicamentos, ela olhou para eles com um sorriso no rosto e disse "Ela é como ele. Eu sabia. Minha menina não está viva! Minha menina não está morta!" e antes que os enfermeiros a segurassem. - Fez como quem tenta apanhar o ar com as mãos. - Ela correu para a janela, de onde saltou como um gato, sem medo de aterrissar. - Inclinou o corpo corcunda para a frente e disse em voz baixa. - Do quinto andar, podia-se ver a senhora Smith esparramada em meio a poça de sangue no chão.

- Isso é um baralho de Tarot? - perguntou um dos rapazes apontando para a mesa coberta por uma toalha verde com formas geométricas multicoloridas desenhadas sobre ela. Talvez mudando de assunto, ele poderia se sentir menos desconfortável. Aquela história o deixou "incomodado" como ele gostaria de pensar. De maneira alguma, admitiria que ele sentia uma pontada de medo percorrer seu corpo só de imaginar a cena da Sr.ª Smith estirada sobre o concreto como um fantoche velho em volta do sangue expelido pelo seu próprio corpo. - Sempre tive curiosida... - antes que ele pudesse terminar a frase, a cigana o interrompeu abaixando-lhe a mão de maneira sutil e lançando lhe um olhar ameaçador.

- Eu gostaria de tirar as cartas para o seu amigo. - disse Madame Albretchs olhando para Eros que a encarava com incredulidade. Não mostrava-se impressionado pela historia da casa Smith, ao contrario do rapaz ao seu lado. - Por favor, meu belo rapaz, tire três cartas. - a cigana esparramou as cartas do baralho sobre a mesa. - Não se preocupe, não irei cobrar a consulta.

- Não acredito que essas cartas dirão algo sobre minha vida que eu não saiba.

- É o que veremos. - Madame Albretchs mantinha os olhos fixos em Eros enquanto analisava as três cartas tiradas por ele. - Como eu previa. - coçou a testa. - La Mort, La Lune e La Movrevx. - Seus olhos amendoados sobrevoavam as cartas como um abutre. - A Morte, a Lua e os Namorados.

- Romântico. - disse Eros inclinando a cabeça sobre a mesa para ver as cartas. A carta da Morte tinha um esqueleto revestido por uma espécie de pele e segurava em suas mãos algo como uma foice. A carta da Lua tinha dois cães ou lobos - Eros não conseguia os diferenciar - uivando para a lua e a ultima carta, os Namorados, tinham dois homens e uma mulher no meio.

- A carta da Morte pode parecer intimidadora, mas ela me diz que há mudanças vindo em sua vida, mas também pode significar problemas de saúde, não sendo necessariamente a própria morte em si.

Post Mortem Vol. 1 - O Livro dos MortosOnde histórias criam vida. Descubra agora